CAIO, VEJA A MINHA CRISE EXISTENCIAL
—–Original Message—–
From: CAIO, ESSA CRISE EXISTÊNCAIL NÃO PASSA…
Sent: domingo, 23 de maio de 2004 08:55
To: [email protected]
Subject: NÃO SEI O QUE FAZER DA VIDA…
Olá Caio…
Que bom que a internet nos propiciou esse contato contigo e que você está disponível para ser “acessado” a qualquer hora do dia ou da noite através do site….
Estou um pouco confusa, e por isso resolvi te escrever.
Sou jornalista, formada há 14 anos, trabalhei em rádio, revista, jornal, e até o mês passado na TV, apresentando um programa super legal, voltado para o terceiro setor.
Quando pequena, meu pai queria que eu fosse diplomata. Me ensinou a falar mais de 10 idiomas; estudei nos melhores colégios, e a cultura que meu pai tinha, acabou sendo passada para mim.
Quando eu tinha 14 anos, no Natal de 1980, ele morreu. Fiquei perdida…
Dez anos depois me formei em jornalismo, mas no fundo,no fundo, parece que eu ainda não sei direito o que eu quero profissionalmente.
Tudo o que me ponho a fazer, é legal (para os outros); pois para mim não passa de mais uma coisa que estou fazendo.
Já realizei muitas coisas até aqui. Mas eu não consigo passar de um ano na mesma atividade. Meu pai era assim também.
Sou filha adotiva e amava muito ele.
Me dá a sensação de que estou até hoje tentando agradá-lo, fazendo o que ele queria, e não o que eu quero. Por isso, nem consigo me acessar para saber o que realmente me faz vibrar.
Na semana passada, comecei a escrever meu terceiro livro. E cinco dias depois… já estou me questionando se é realmente isso que devo fazer neste momento.
Afinal, pedi as contas em uma TV. Livro já vai para outra área. Olha que confusão…
Eu oro todos os dias para que Deus me ajude, mas essa confusão ainda não se dissipou da minha cabeça.
Será que você, com toda a sua sabedoria, não poderia me ajudar a me encontrar?
Desde já agradeço e até breve.
Ione Rocha
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Resposta:
Amada amiga: Crise existencial só acaba quando a gente passa desta para a Melhor!
O tema de sua carta está profundamente vinculado a honrar pai e mãe. Ora, honrar pai e mãe é melhorá-los em nós, não é repeti-los em nós!
Tenho um filho que literalmente poderia fazer qualquer coisa na vida. Fala muitas línguas, e vai com naturalidade da física, passando por economia, sociologia, psicologia, história, astronomia, mitologia, música, medicina, biologia, e qualquer outra coisa.
Desde que ele era menino, que eu sabia que o problema dele seria escolher entre tantas facilidades que a mente dele oferecia a ele; afinal, para ele, tudo era fácil.
Quando ele fez vestibular, passou em tudo, e nos primeiros lugares; e podia escolher o que desejasse. Então, escolheu Economia.
Cursou três anos; sempre em primeiro lugar; e até foi pago pelo curso para não parar de estudar, de tão bom que era.
Um dia, do nada, ele chegou em casa e me comunicou que havia trancado Economia, e que se matriculara em música.
No início não gostei…
Ele, então, me disse: “Aprendi isto com você. Você poderia ter feito o que quisesse. Mas optou pelo seu coração, e é pastor.”
Vi que ele tinha razão. Hoje, nove anos depois, ele está muito bem; e eu estou convencido de que ele fez a coisa certa.
Eu segui meu coração em tudo o que fiz. Como posso não pedir que as pessoas sigam o seu próprio?
O que tenho a dizer a você é que uma das piores tiranias que existem é a de seguir scripts de pais bons.
Quando o pai é bom, às vezes, até inconscientemente, os filhos querem seguir seus passos. Quando é natural, ótimo. Quando não é, torna-se escravidão.
Desse modo, minha opinião é que você aproveite essa parada nas coisas, e siga, bem de leve, o seu coração. No entanto, tem-se que ser prático também; afinal, alguém tem que pagar as suas contas no final do mês. Daí, muitas vezes, a gente ter que ter um bico enquanto pensa e descobre o que quer.
Por outro lado, não fique também paranóica com a “continuidade”—digo: de fazer as mesmas coisas que ele—, isso se você de fato gosta do que ele gostava…
É importante você saber se gosta ou não do que ele lhe “passou”, e se não deseja “desistir” apenas porque é a mesma coisa que ele um dia fez.
Pode ser que você de fato goste do que faz, e esteja em dúvida apenas porque era o que ele também fazia.
Quanto a ser adotiva, saiba, eu também tenho uma filha adotiva; e, independentemente da genética, a criação “passa” genes culturais e espirituais num nível que a gente nem imagina.
Minha filha, por exemplo, tem todos os meus gostos amazonenses; mais até do que os irmãos dela, que nasceram lá, e são filhos naturais.
Ou seja: no estado de confusão e de necessidade de fazer mudanças em sua vida pessoal no qual você está agora, pode ser que a “profissão” tenha entrado como álibi que cobre uma outra insatisfação; e é isso que você tem que discernir.
Gostaria que você se perguntasse se de fato sua questão tem a ver com a profissão ou se tem a ver com solidão e afetividade.
Por hora, é isto que lhe digo; porém fico no aguardo de outras informações, e que podem me ser úteis na tentativa de ajudar você.
Nele, que nos deu dons,
Caio