OS CRISTÃOS E O PÊNDULO DAS ANGUSTIAS




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From: OS CRISTÃOS E O PÊNDULO DAS ANGUSTIAS

To: contato

Subject: SOMOS DO TIPO BI-POLAR

 

 

Mensagem:

 

Hoje eu li o testemunho “chega de nóia”. É interessante esta nossa constante busca de nos assemelharmos a Deus, de vencermos…por nós mesmos… nossos pecados, que nos afastam de Deus.

 

É também muito interessante perceber o movimento de pêndulo ao qual parece estarmos atrelados.

 

Parece que temos uma atração para os extremos do movimento pendular, e o momento no qual o pêndulo se encontra no centro do movimento, é justamente onde ele tem maior velocidade, passa mais rápido…

 

O que temos hoje na esmagadora maioria das igrejas são extremos; extremos de religiosidade; e nenhuma saúde.

 

Extremos de preocupação com imagem. Extremo de preocupação com o pecado. Extremo de tentativa de contextualização da Palavra, sendo que não há Palavra.

 

Extremos…todos eles.

 

Que Deus nos dê a sabedoria para podermos entender a sua vontade para nossa vidas.

 

Um grande abraço

 

Que Deus continue a te abençoar.

 

Resposta:

 

Meu amado amigo: No Caminho pode haver momentos extremos, mas o Caminho é Puro Equilíbrio!

 

É interessante observar que o chamado do Evangelho tem alguns pólos radicais, mas o Caminho não é Bi-polar.

 

Pode haver momentos existenciais e circunstanciais de posições que se assemelham a algo que acontece num pólo, num extremo, numa situação extrema.

 

Mas nunca deve ser a pessoa a buscar tais extremos.

 

Quando somos colocados num pólo da vida, a única maneira de vivê-lo é com equilíbrio.

 

Ou seja: não se deve tentar fugir do inevitável, mas devemos evitar todas aquelas coisas que nos ponham em situação de excesso, seja circunstancial, seja psicológico ou mesmo existencial.

 

Infelizmente os cristão crêem que o amor a Deus remete para alguma forma de polaridade.

 

Essa é a razão pela qual, predominantemente, os cristãos ou “estão” santos e consagrados—na maioria das vezes essas posições não são nada além de exacerbações psíquicas, e não aquilo que de fato corresponde a santidade ou consagração—, ou “estão” perdidos e desviados.

 

O próprio Evangelho, que nos apresenta os extremos da existência, não nos apresenta Jesus vivendo com nenhuma fixação nos extremos, exceto na hora da Cruz. Todavia, até para isso, Ele espera até que possa dizer: “É chegada a hora”.

 

No mais, vê-se Jesus mostrando o equilíbrio não apenas nas ponderações de Suas palavras—cheias de sabedoria—, mas, sobretudo, mediante a agenda do Senhor, na qual havia de tudo.

 

Demônios são expulsos na sinagoga, e banquetes são celebrados à noite.

 

Multidões são deixadas de lado, e um encontro solitário toma o lugar delas.

 

Se o povo “espreme a Jesus”…Ele mesmo pede que lhe providenciem um barquinho, do qual passa a falar, sempre deixando um certo “fosso de proteção” entre Ele e os arroubos táteis das multidões que desejam pegar Nele.

 

Suspiros de cansaço e dor se alternam com expressões de exultação no espírito.

 

Noites insones acontecem, mas sonecas no meio do dia também, mesmo que seja num barquinho, e ainda que ventasse e as ondas estivessem encapeladas.

 

A relação com os amigos homens pode ser tão íntima e tátil que houvesse quem lhe deitasse a cabeça no peito, como João; e, as amizades femininas também tinham o privilégio do toque, da expressão de devoção carinhosa, do beijo e do derramar de perfume sobre Ele.

 

Todavia, em Jesus, as tentações significam aceitar os apelos dos pólos, dos extremos.

 

Transformar pedras em pães. Pular do Pináculo do Templo. Adorar o Diabo, e por tal via extrema conquistar os poderes de todo o mundo.

 

A sua percepção de que o pêndulo passa mais rápido no que deveria ser o “meio”, o ponto de equilíbrio, é completamente verdadeira. Na realidade, é nos pólos onde o pêndulo “fica” mais tempo, chegando a dar uma “parada”; pois é lá que o movimento de ida sofre o limite do extremo, experimenta a força inercial…para então começar a acelerar no movimento de volta ao outro pólo, passando pelo meio com sua maior velocidade.

 

A experiência de paz dos cristãos, portanto, acontece com extrema fugacidade, pois que não há tempo para a paz e a para a quietude quando as dinâmicas da existência são sempre feitas em movimentos bi-polares.

 

Viver sob tais pressões se torna, com o tempo, algo insuportável.

 

Assim, depois de um tempo de bi-polaridade, a alma, cansada de tantos extremos, acaba por se prender num dos pólos, já que para a maioria dos cristãos o equilíbrio do meio “não é de Deus”—é de Buda ou Confúcio—mas não do Pai; pois é calmo e pacificado, e isso não condiz com os estímulos à aflição que permeiam a “espiritualidade” da maioria dos cristãos.

 

Os cristãos se acostumaram a sentir culpa, e quando não sentem acham que algo está errado, e que provavelmente estejam ficando cauterizados de consciência. Assim, a culpa passa a ser um dever de consciência.

 

Até mesmo as liturgias cristãs atuais expressam essa “fixação” no pólo do excitamento.

 

Culto bom é culto nervoso, gritado, excitado, agitado, pulado, suado, aflito de contrição, intenso, desesperado, ou histericamente “feliz”.

 

O próprio entendimento comum do que seja “uma vida com Deus”—sempre querendo que aquilo que na vida dos personagens bíblicos foi um momento se transforme para os crentes em algo que seja a totalidade e a constância do existir—, já carrega em si a semente da angustia, seja a neurótica, seja a paranóica.

 

Nesse sentido, os cristãos sempre foram, em todo ocidente, o grupo mais aflito e tenso de que se tem notícia.

 

Já o extremos da preocupação com a imagem, que você mencionou, expressa o maior sintoma do mecanismo de dissociação entre o Consciente e o Inconsciente.

 

O modo como os cristãos vêem Deus é extremante angustiado. Daí a sua espiritualidade tender a ser assim…sempre entre extremos…visto que aquilo que deveria ser visto como saúde humana, na maioria das vezes é declarado como frieza, desinteresse e falta de espiritualidade…digo: no meio cristão, especialmente os mais prevalentes entre nós.

 

Esse culto a imagem é o que mais faz separação entre nós e nós mesmos.

 

O gap criado é sempre enfermiço, e trás consigo conseqüências devastaras para a alma.

 

Assim, também cria-se o melhor ambiente psíquico para que todas as demais formas de distúrbios se instalem na interioridade humana, visto que uma espiritualidade da imagem, só tem olhos para os olhos dos outros; isto apenas para vermos como somos vistos; ou seja: para ver como os demais nos vêem.

 

Desse modo, o interior é relegado ao plano da não-existência, e nessa “casa varrida e ornamentada” pelo culto à imagem, crescem todas as sombras e fantasmas—os mesmos que atormentam a alma de muitos na igreja.

 

Somente quando compreendermos que nosso chamado psíquico é para a correspondência entre o interior e o exterior, é que começaremos a ter paz.

 

Assim como no espelho a imagem corresponde ao rosto, assim também o exterior humano sempre deve corresponder ao interior.

 

Ora, é aqui que o medo se instala, pois as pessoas sabem como são por dentro, tão cheias de rapinas e sentimentos invejosos e malignos.

 

O que elas não sabem é que tais sentimentos cresceram justamente no abismo que o culto à imagem criou entre o Consciente e o Inconsciente.

 

Desse modo, quanto mais culto ao exterior, mais rapina haverá no interior, e mais se temerá expor as verdades do coração, ou viver uma vida onde a cara espelhe a alma.

 

Esta é a razão pela qual ficamos como um cão que nervosamente corre em círculos, tentando morder o próprio rabo.

 

Paulo diz que tudo aquilo que se manifesta é luz.

 

O equilíbrio do ser só acontece na luz, e mediante as coisas que se manifestam.

 

Do contrário, quanto mais se pinta o sepulcro por fora, mas apodrecem os defuntos por dentro.

 

A salvação da alma, como psique, está no encontro cada vez mais tranqüilo e límpido entre os ambientes externos e internos; assim como também na aproximação do mundo psíquico consciente daquele outro que nós muitas vezes nem conhecemos, mas que existe de fato, que é o inconsciente.

 

Mas para que se experimente a paz do “meio” é preciso que o nervosismo dos movimentos bi-polares dê lugar à reconciliação entre os pólos. E isto só é passível de acontecer na Graça de Deus, quando reconciliados com Deus já não tememos quem somos, pois já sabemos pela fé como Deus nos vê para o nosso bem, visto que nos enxerga em Cristo; portanto, reconciliados e incluídos.

 

Afinal, no meio cristão, os pólos representam extremos, estando de um lado a imagem externa de crente, e todas as suas morais; e de outro lado a aflição criada pela hipocrisia, e que sabe que os mundos exterior e interior estão esquizofrenizados, separados por um abismo imenso—daí o movimento de um pólo ao outro ser patrocinado pela paranóia, e pela neurose culposa.

 

Tudo isto é muito triste. Afinal, Jesus veio ao mundo para que tudo isto desse lugar à paz.

 

Todavia, enquanto formos patrocinados pelos senhores da imagem e da fachada, nossas almas continuarão nesse estado de angustia pendular; e a paz nos será apenas uma brisa quase imperceptível, e “sentida” de modo fugaz, quando na viagem para o outro pólo, passa-se de passagem por esse ponto do meio, onde, de fato, é o nosso lar.

 

Um grande beijo, e perdão pela demora na resposta.

 

 

Caio

 

Escrita em 5/6/2004