SOU CASADA E ESTOU TENTADA OUTRA VEZ…
Caro Rev. Caio Fábio: Graças e Paz!
Fiquei feliz ao encontrar este espaço virtual, onde podemos conversar sobre coisas que nos incomodam, nos afligem, e ter do outro lado uma pessoa com a sua sabedoria e sensibilidade para nos ouvir e aconselhar.
Tenho lido as cartas de tantas pessoas que lhe escrevem e suas respostas têm me ajudado muito, porém há em mim um desejo e uma necessidade de falar-lhe sobre a minha situação pessoal. Estou lhe escrevendo, na esperança de que me responda e me ajude em algo que há muito me ocupa a mente.
Tenho 45 anos de idade, sou casada há 23 e tenho 03 filhos, rapazes, já saindo da adolescência.
Casei jovem, virgem, com um homem 09 anos mais velho que eu, e já com experiências sexuais anteriores.
Desde o início do meu casamento me senti sexualmente realizada, sem queixas nessa área. Porém sempre houve algo que não me parecia muito bem entre nós. Embora meu marido seja uma pessoa boa e dedicada à família, aos poucos comecei a enxergá-lo como emocionalmente frio e com dificuldades em relacionar-se mais profundamente ou intimamente.
Foram muitas as vezes que ainda recém-casada chorei por falta de calor e de proximidade emocional. Ele parecia satisfeito e sem entender o porquê das minhas queixas, não me levando a sério, e sem nenhuma preocupação em falar sobre o assunto. Assim fomos vivendo, sem grandes problemas, mas também sem grandes emoções.
Por volta dos meus 13 anos de casada, época em que eu vivia a fase mais vulnerável do meu casamento—estava muito carente e não me sentia valorizada nem desejada pelo meu marido—, conheci uma pessoa, amigo de uma amiga, também casado, crente (eu não era), que parecia viver também suas carências e desencontros conjugais.
Não deu outra. Relutei, vivi sérios conflitos interiores, mas já sabia onde aquilo iria parar.
Resultado, nos apaixonamos, e vivemos por 04 anos uma relação extraconjugal, que nos marcou profundamente (a mim e a ele), a qual conseguimos por um ponto final, por determinação de ambas as partes, pois queríamos ser obedientes a Deus.
Paradoxalmente, durante esse processo, comecei, desesperadamente, a buscar a Deus, e me converti!
Renunciamos ao romance e aquilo virou um segredo nosso.
Hoje, tantos anos depois de tudo ter terminado, este homem, minha grande paixão, ainda me vem freqüentemente à lembrança.
Às vezes desejo encontrá-lo. E isso não seria difícil para nós, visto que vivemos em cidades diferentes, mas muito próximas. Mas nós dois sabemos (pois já conversamos algumas vezes sobre isso) do risco que corremos se voltarmos a nos ver.
Há 01 ano não o vejo, nem tenho notícias, mas nem por isso deixei de pensar nele, ainda que seja a última lembrança que tenho no dia. Ele vem à minha mente com carinho e saudade. Já tratei essas coisas em terapia, em oração e em minhas conversas com Deus. Mas nunca o fiz com um pastor.
Recebi e aceitei o perdão de Deus, e vejo que foi em meio a tanta confusão e mentira, que Ele me alcançou.
Tenho sido uma boa esposa, tenho profundo respeito, amor e admiração pelo meu marido. Nosso casamento hoje amadureceu. Há alegria e cumplicidade entre nós. Tenho comunhão com Deus e com os irmãos na igreja. Mas tenho comigo essa marca, da qual não consigo me livrar. Não me atormenta, mas não me deixa.
Foi uma coisa boa que vivi, apesar de errada e enganosa. Sim, foi uma experiência que me alimentou de afeto, de carinho e de calor humano quando eu não sabia direito quem eu era e que importância eu tinha como mulher.
O que eu pergunto é:
Quem foi esse homem na minha vida?
Será que um dia tudo isso passará?
Ou será o meu “espinho na carne”?
Um abraço afetuoso.
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Resposta:
Minha amada amiga em Cristo: Graça e Paz!
“Não sabiam os pais de Sansão que aquele mau vinha da parte do Senhor”—Juizes.
Os caminhos de Deus realmente não são os nossos caminhos. Você tem uma relação extra-conjugal, e se converte!
Minha querida amiga, deixe eu lhe dizer algumas coisas:
De fato eu não creio que este homem tenha sido a paixão de sua vida, mas apenas o “escavador de sua dimensão feminina madura”.
Na realidade, o que acontece toda hora é o seguinte: uma mulher casa virgem, com um cara legal, porém frio afetivamente. Ela o ama, mas gostaria de receber um tratamento mais romântico e carinhoso. Os anos passam. Ela agora já é mais que mulher, mas o marido pensa que ela ainda é aquela virgem que se satisfaz com um pirulito. No entanto, a menina virou mulher, e conquanto nunca tenha provado nada além do pirulito, já sabe que existe potencial para ver o pirulito virar sorvete de cone e casquinha, e com sabores adultos e variados.
Então, instala-se a curiosidade. O maridão continua apressado. Ele ama, mas se acostumou. A mulher, todavia, quer mais…e quer mais com ele…não com um outro. Ele, o marido, todavia, parece não perceber nada.
Ora, nesse ponto, tudo pode acontecer. A mulher pode ficar na dela, frustrada e magoada, com a auto-estima lá em baixo, ou, como você, pode acabar “tomando do fruto, e comendo”.
Bem, quando isto acontece, muitas podem ser as variáveis. Tanto a mulher pode se viciar, e ter vários outros amantes. “Trair e coçar é só começar”. Ou pode viver o que você viveu, e depois parar. E, também, pode se apaixonar, e acabar por não agüentar mais ficar casada, e partir para o tudo ou nada. Graças a Deus você se converteu, e conseguiu parar.
Sobre o que está acontecendo com você, também não é difícil entender.
Você conheceu um homem, o seu marido. Ele era experiente, mas, em geral, os maridos pensam que mulher quer apenas sexo, sem saber que mulher quer mais quer sexo, quer amor, carinho, e desejo. Mas o maridão pensa que se “comparecer” com alguma freqüência a esposa estará satisfeita. E não é bem assim.
Então, aparece um cara com fome e encontra uma mulher com vontade de comer!
Ora, o que acontece?
Eles vivem, de modo adulto, um encontro sexual novo e diferente. Ambos já sabem o que gostam, e ambos estão ávidos não apenas por se satisfazerem, mas, também satisfazer o outro.
Aliás, essa é uma das principais diferenças entre a relação de homens casados e homens amantes. Os homens casados querem se satisfazer, e dar um “engana garoto” para a esposa.
Já o amante tira seu maior prazer do prazer que ele mesmo gera na mulher. Assim, quanto mais a mulher sente prazer, mas o amante de satisfaz.
E por que? É que ambos querem ser afirmados como gostosos e desejosos, por isso, ambos se dão ao prazer do outro. Daí os casos sexuais extra-conjugais, quase sempre, serem infinitamente superiores nas expressões de carinho e prazer que as relações conjugais formais. No entanto, a virtude não está, necessariamente, no homem ou na mulher, mas na circunstância do encontro, nas necessidades da alma, e no tesão do proibido.
Geralmente é nessas horas que a mulher conhece, agora sem o peso do casamento ou da maternidade, a experiência da maturidade do prazer. E como isto aconteceu fora do casamento, ela fica pensando que aquele homem é a paixão da vida dela. Mas nem sempre é. De fato, pode até se dizer que foi a pessoa que destampou a chaleira, e mostrou como a angustia da pressão pode se transformar em prazer e êxtase.
Ora, quando acontece do relacionamento acabar por uma questão de consciência, e não porque tenha acabado, o que geralmente acontece é que fica aquele amor da renuncia, aquele carinho filho da resignação, e aquele tesão proibido, porém divino nas memórias que trás…
As piores relações são essas: saborosas, amigas, meigas, quentes, e que terminaram apenas porque a consciência venceu a natureza, o instinto e o desejo.
Você me pergunta: o que fazer?
Primeiro, entenda o fenômeno em si. Ou seja: saiba que você se sente assim porque esta é a única maneira normal da alma se sentir. Sua alma não é moral e nem segue catecismos. Ela apenas chama de carinho o que é carinho, de desejo o que é desejo, de saudade o que é saudade. Sua consciência, todavia, é moral, e é ela quem recrimina a alma, e a julga, fazendo com que a alma entre em conflito, e mergulhe ainda mais profundamente na afirmação de que o que ela sente é verdade.
E mais: tanto mais verdade será—e será verdade manifesta como angustia e conflito—, quanto mais a consciência tratar a alma com juízo e condenação. De fato, tais repressões apenas aumentam o fantasma no coração. É assim que funciona.
Portanto, transforme sua confissão a mim num acordo da verdade com a sua alma, e tudo se pacificará.
Segundo, saiba que você não ama esse cara, mas apenas sente saudade de algo que para a sua alma foi importante. E foi importante para você em seu auto-descobrimento como mulher, e até como ser humano. Afinal, como você disse, ironicamente, foi no contexto desse caso com o crente que você também se converteu. Sua moral cristã repudia essa história, e luta para fazê-la não ter sido nada, mas sua alma é amoral, e apenas reconhece as coisas como as coisas são ou foram para ela.
Assim, eu lhe digo: você ama o seu marido, embora sinta saudades de alguém que se você não tratasse com os critérios da moral, logo se tornaria, em sua alma, apenas um amigo.
Terceiro, sabendo disto, não brigue com a sua alma, que é para ela não dar um susto em você. E como seria esse susto? Ora, você pode reprimir as saudades e chamá-las de culpa e pecado. No entanto, quanto mais você trate tudo com repudio moral, tanto mais essa coisa crescerá na medida e na direção da indicação da reprimenda moral. Literalmente: quanto mais você chamar isso de pecado hoje, tanto mais isso se tornará desejo insuportável, e que acabará por fazer vocês dois se engatarem outra vez. Portanto, o que você tem que fazer é acolher a sua alma com respeito. Fique sabendo que se você ao invés de brigar com ela, simplesmente disser: “Obrigado, Deus, pois Teus caminhos são incompreensíveis. Obrigado porque Tu transformaste meu engano em bem. Abençoa a vida dele, e a minha também”—, então sua alma vai se aquietar, e tudo ficará na medida e no tamanho que cada coisa tem.
Quarto, a única maneira disso não passar disso, e até mesmo disso ficar bem menor que isso que aí está, perturbando você, é mediante um convívio pacifico de você com sua própria alma. Ora, você mesma já confessou o que isto foi para você, e não há porque não admitir que as coisas foram como foram.
Veja o que você me escreveu: “Foi uma coisa boa que vivi, apesar de errada e enganosa. Sim, foi uma experiência que me alimentou de afeto, de carinho e de calor humano quando eu não sabia direito quem eu era e que importância eu tinha como mulher.”
Pois bem, o que aconteceu é só isto, e só se tornará mais do que isto se você negar que isto é isto. Entendeu?
Não há orações a fazer. Orar contra isto apenas aumentará os fantasmas dos desejos. Confessar para o pastor? O quê? Por que? Em que ajudará? Garanto-lhe que em nada!
Você está perdoada, e sua questão não é perdão, mas apenas verdade de você para com você mesma.
Ou seja: ao invés de você moralmente dizer “eu te repreendo”, diga: “Minha alma, eu e você sabemos o que houve, e somente eu, você e Deus podemos entender o que aconteceu.”
Ora, quando você reconhecer a sua alma, ela vai se aquietar. Mas se você lutar contra ela, ela vai se monstrificar, e exacerbará a saudade, que virará desejo, e o desejo se tornará insuportável, até que você ceda, e volte da experiência profundamente perturbada e confusa, e com o potencial de realizar muito mal a você, aos seus, e ao próprio cara.
Aquele monstro do labirinto do mito grego se chamava Asterion, ou seja: estrela.
Ora, aqui está o paradoxo!
Esse labirinto é a alma. O seu monstro é também uma estrela. Se você o socar para dentro, ele se monstrifica e assombra a você. Se você o chamar pelo nome, e deixar que ele encontre seu caminho para a luz, para o lado de fora, mediante o seu acolhimento da verdade, então, ele se metamorfoseia e se transforma na Estrela.
A alma é assim. Tratá-la de modo moral e evasivo é a receita para que façamos tudo o que não se quer fazer, posto que a alma revoltada é besta do labirinto. Tem corpo humano, mas tem a cabeça de um touro. Ou seja: nesse estado o que prevalece não é a razão, mas o instinto. E o instinto se torna tanto mais poderoso quanto mais se foge de encará-lo como simples instinto e desejo.
Dá pra sentir que você pode ter um casamento muito legal, posto que apesar do “caso”, eu sei que você ama o seu marido.
Veja o que você disse: “Tenho sido uma boa esposa, tenho profundo respeito, amor e admiração pelo meu marido. Nosso casamento hoje amadureceu. Há alegria e cumplicidade entre nós.”
Assim, eu lhe digo: não trate desse assunto nunca mais como quem luta contra o diabo. O que o diabo quer é que você trate a sua alma como algo diabólico. É assim que o diabo cresce em todas as paradas. Por isto, não fale mais nesse assunto como tema de culpa. Seus pecados estão perdoados! Portanto, desse assunto apenas trate com sua própria alma. E faça isto sem moralismo, mas apenas com simplicidade e verdade. Na luz da verdade o amante virará apenas um amigo. E nada mais que isto.
Enquanto isto, ajude seu marido a tratar a você como amante. Agora que você sabe como um homem e uma mulher adultos podem ser plenos em tudo, ajude seu marido a ficar livre da síndrome dos homens casados.
Ora, que síndrome é essa?
Homens casados, em geral, tratam a esposa como quem trata uma mulher garantida, uma propriedade, uma rotina. Paulo disse que “os casados devem ser como se não fossem”. Ora, conquanto no contexto de I Coríntios 7 isso signifique um chamado à prontidão para encarar a necessidade da separação forçada, em razão das “angustias do tempo presente”—conforme o apóstolo diz, e fazendo referencia à possíveis perseguições contra a igreja—, a mensagem, todavia, tem aplicativos variados.
Ora, um desses aplicativos do texto é de natureza psicológico-existencial. Ou seja: o casamento deve ser tratado, no molho do carinho, da sedução e no caldo da cama, assim como os que não são casados se tratam, posto que seu desejo é conquistar o outro para si.
Ora, todos os maridos deveriam tratar as suas mulheres como se fossem amantes, e o mesmo deveriam fazer as mulheres!
Ou seja: a melhor receita para a manutenção do desejo no casamento é a pratica de uma psicologia de amantes!
Medite no que lhe escrevi, e depois me diga se as coisas não ficaram imensamente melhores. E vai chegar a hora em isto vai cessar. Respeite a sua alma, e ela respeitará você.
Nele, em Quem todos os segredos de nosso coração não são impedimento para a Graça,
Caio