O BOTECO DOS INCONFORMADOS E A CADELA NIKITA




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From: O BETECO DOS INCONFORMADOS E A CADELA NIKITA
To: [email protected]
Sent: Tuesday, March 22, 2005 10:01 PM
Subject: Fw: Submissão Pastoral – Pastores que destroem vidas…. Obrigado…você me ajudou a me libertar…


Oi Caio,

Trabalho na boca do lixo como voluntário em tempo integral. Esta semana falei da graça para o meu ex-pastor e ele riu de mim. Falou que um cara que é evangelista há dois ou três anos na Boca do Lixo em Sampa não pode ter nada pra ensinar pra ele. Falou que prefere mil vezes a visão de um tal de “James” ( não sei se é assim que se escreve )… Mas como não deixei barato, fui colocado pra fora do gabinete. Ele falou que sou “um nada”.

Eu fiz isso porque ele tem humilhado uma família simples e, a meu ver, sincera com Deus, e eu não posso deixar as pessoas matarem vidas em nome de Cristo.

Por sinal, ele é um militar que diz até que conhece você pessoalmente e tal, mas que eu não tenho experiência alguma para ensinar nada a ele e que eu não posso questioná-lo em nada. Falou que pro que eu penso ele não tá nem aí. E disse que como pedi a carta pra sair da igreja, não posso mais dar nenhum palpite na igreja. Falou que sou um cara confuso, medíocre e que não tenho rumo na vida. Tentou quebrar meus argumentos destruindo meu emocional…

Na época em que eu concordava com ele, há pouco tempo, eu era bem tratado; tinha meu lugar na igreja. Mas mesmo assim falei do evangelho da Graça. Ele riu. Prefere o tal de James… Por sinal não quer argumentar comigo e já tá falando mal da minha família, que ele nem conhece. E os meus amigos na igreja desapareceram. Acho que estão com medo dele, pois ele diz que sou um insubmisso, radical.

Você acredita que até a minha cadelinha, a Nikita, Deus usa pra caramba pra falar comigo? Acho isso incrível! Às vezes fico em crise por causa dela…

O que me dói é que a maioria dos mendigos, prostitutas e travestis da Boca já passaram por igrejas e foram massacrados pelos pastores absolutistas, que pregam a submissão pastoral, segundo a qual não se pode contrariar o pastor, pois ele é ‘um anjo do Senhor’. É triste ver que o povo da Boca (drogados, prostitutas…) sabe mais da letra da Bíblia do que eu. Muito mais, diga-se de passagem…

Ainda bem que conheci a Graça do Senhor e você, Caio (chamo de você por que estou tanto aqui que me sinto íntimo, como se este lugar fosse meu também). Você foi, talvez, o principal instrumento que Deus usou na minha vida para essa revelação.

Estou pensando em abrir um boteco: Boteco dos Inconformados da Graça, ou Boteco da Graça ou Boteco dos Inconformados ( tenho medo de usar o nome graça; não quero que caia no dia-a-dia como algo qualquer, se é que já não caiu). Dentro disso, tenho duas perguntas: A primeira: Posso usar o seu material para meditação caso o boteco venha a se realizar? Suas cartas, por exemplo? E ler e compartilhar com o pessoal lá? Segunda: Submissão pastoral — o que é isso à luz de Cristo no Novo Testamento? Tenho minha opinião, mas gostaria de aprender mais com a sua.

Um beijo Caio, meu amigo.

Marcelo D. Christovam – São Paulo – Boca…

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Meu querido amigo: Graça, Paz e Coragem!


Lamento de coração o ocorrido, e que você esteja tão só fazendo trabalho tão importante.

Também lamento o que aconteceu entre você e o pastor.

Nikita… sua cadela… Sim, é claro! Deus pode até me usar, quanto mais a Nikita!

Aquele que me usa tem menos trabalho com jumentos e cadelas.

Imagino que ela lhe dê umas olhadinhas de carinho ou repreensão, ou que, em sua faceirice, lhe faça bem ao coração em dias de solidão e tristeza.

Submissão pastoral: o que é isso? Sinceramente, até hoje não sei. Só sei de submissão à Palavra. Mas quanto a ter homens a quem se seja “submisso” no sentido de que sua palavra seja inquestionável, e quem quer que contra ela esteja estará em desobediência a Deus, nada sei a esse respeito.

Quando alguém é verdadeiramente insubmisso, é sempre à Palavra, e nunca em razão da “autoridade” de um homem-em-si-mesmo. O que não pode haver é desrespeito pelas pessoas. Porém “submissão”, conforme ‘hoje’ se prega no meio evangélico, é apenas um artifício dos pastores a fim de manterem o “rebanho” submisso conforme os caprichos pastorais.

Ora, eu até entendendo que alguém diga: “Aqui é assim!” — e, nesse caso, fica quem quiser. O problema é que além disso, os caras querem também amaldiçoar quem não concorda, e sempre declaram que a ‘não-submissão’ a eles equivale a insubmissão a Deus. Isso é, de fato, um engano e uma mentira maligna e diabólica.

Cada um deve ter opinião bem definida em sua própria mente, pois o chamado do Evangelho é também para desenvolver consciências individuais, embora sem individualismo.

Pelo líder há um respeito que é sadio. Mas a tal “submissão” é falsa, e é usada como ‘argumento’ por aqueles que têm no pastorado uma ‘tara de controle humano’. Portanto, não esquente nunca a cabeça quando você andar conforme o espírito do Evangelho. Mas jamais seja mal-educado no trato com ninguém.

Todavia, chega de manipulação pastoral em nome dessa suposta submissão.

De modo rápido, é isso que tenho a lhe dizer.

Quanto ao Boteco, acho muito legal. Sim, o Boteco dos Inconformados pode ser um lugar legal pra reunir essa moçada da Boca. E quanto aos meus textos, por favor, sirva-se deles à vontade. Pode lê-los e usá-los conforme ache bom.

Aqui do lado da minha casa tem o Bar dos Inocentes. Não há um cristão dirigindo o lugar. Mas é um point de bêbados, de gente que perdeu tudo… Tenho algumas histórias ligadas ao lugar. Se você abrir o Boteco dos Inconformados, me avise, pois, decerto, estando em Sampa, o visitarei.

Sobre o Bar dos Inocentes, eis uma história:

2003. Estava colocando a minha netinha no carro para ela ir de volta para a casinha dela. De repente, gritos! Esperei o carro dela sair. Olhei para trás e vi um homem bem vestido, de uns 55 anos, com um revólver na mão. A cena era em frente ao Bar dos Inocentes. Tenho alguns amigos lá.

O bar estava lotado. Todos estavam gelados de medo. O homem, de fato, estava disposto a meter no mínimo uma bala em alguém. Foi instintivo… Gritei: “Paz seja neste lugar” — e caminhei na direção do homem.

Fez-se silêncio total.

“Olhe bem para mim e veja se minha cara é de guerra ou de paz!” — exclamei.

O homem me olhou como se eu fosse um alienígena. Em Copacabana, um cara de bermuda vermelha, camisa branca, barbado e de mãos para cima, dizendo o que eu estava dizendo…

De fato, olhando “de fora” parecia uma cena surreal.

Cheguei perto, abracei o homem e falei para ele guardar a arma. Guardou-a. Botei a mão no ombro dele e tirei-o dali. Conversamos sobre o ridículo de tudo aquilo. As razões? Bobagem, como sempre. Papo de quem “entornou” mais do que agüenta e então fica tudo como o diabo gosta.

Botei o homem do outro lado da rua e o mandei para casa.

“Quem é você?” — me perguntou.

“Sou amigo de Jesus” — foi o que eu respondi a ele. Dei-lhe um abraço e ele se foi.

Bem, essa foi uma história do Bar dos Inocentes. Diferentes, eu espero, sejam as historias do Boteco dos Inconformados.

Todavia, meu estimulo é sempre para que a verdadeira igreja entre mesmo nas portas do inferno. Tenha uma certeza: da Boca do Lixo Deus pode suscitar o perfeito louvor! Se culto evangélico pode suscitar louvor, qualquer outro culto pode!

No mais, não se amargure com nada. Ande limpo e doce. Não deixe ninguém amargurar você!

Um beijo!


NEle, que freqüentava todas as bocas,


Caio