O CAMINHO NÃO PODE VIRAR “ESTACIONAMENTO”?

—– Original Message —– From: O CAMINHO NÃO PODE VIRAR “ESTACIONAMENTO”? To: ‘[email protected]’ Sent: Thursday, September 29, 2005 4:26 PM Subject: PERDIDO E SEM CAMINHO Olá Caio, Estou em processo de desconstrução. É muito dolorido. Não sei o que será de mim. Não acredito mais nas instituições. Mas, sem elas, parece que estou sem chão, não sabendo como caminhar. Tenho duas filhas, uma de 7 anos, e outra de 11 anos. O que será delas? o que vou passar para elas? Minha esposa é minha “ouvidoria”. Escuta minhas frustrações. Tem medo que eu desande, fique indiferente a tudo e caia no mundão. Concorda comigo, mas argumenta que se formos para outra “igreja” será a mesma coisa. Um caminho… é tudo que preciso. Será possível seguir o caminho sem um caminho institucionalizado? Leio suas palavras sobre “igreja” x igreja e cada vez mais caminho para fora daquele caminho. Leio coisas sobre “O Caminho da graça” e percebo uma tentativa de ser igreja e não “igreja”. Mas fico pensando… começou como um caminho, algo sempre em movimento. Agora estamos na estação do caminho, não será paradoxal?. Explico, estação dá idéia de parada, algo que está sendo erguido, uma estrutura com todos os seus conflitos de poder, por mais simples que seja. Em tese pode-se até fazer diferença entre Estação x “igreja”, mas na prática será que isso é possível?. No caminho não se projeta, não se constrói, não se ergue, apenas armamos e desarmamos tendas. No caminho nos misturamos, damos, recebemos e seguimos. Será que é possível viver também assim? Mas fico pensando, somos seres grupais. Cria-se grupo de tudo, dos sem-terra, dos divorciados, dos homo, dos hétero, dos solteirões, da meia-idade, dos “igreja”, dos igreja, enfim, os semelhantes se atraem. Os discípulos do caminho vivem em grupos ou se misturam nos grupos? ou se excluem dos grupos e criam seus próprios grupos? Será possível servir a Deus sem ir a “igreja”? Um grande abraço. Muito sucesso para você e que Deus realize os desejos do seu coração. Jesaías ________________________________________________ Resposta: Meu querido amigo e irmão: Graça e Paz! Vejo que você está de fato em grande conflito, e que a desconstrução está sendo, na realidade, uma demolição ou implosão. Primeiro, saiba que não estamos criando uma denominação. Somos, em alguns poucos lugares, um ‘pouso’ para quem pede. E, quando digo “somos”, apenas digo que os que se designam “do Caminho”, são apenas discípulos de Jesus que não se encontram tranqüilos nas instituições as quais chamamos “igreja”. Ora, esses apenas se encontram em torno da mesma percepção do Evangelho. Ou seja: são apenas dois, ou três, ou mais, reunidos em Seu nome. Quanto a “Estações” do Caminho, também desejo que saiba que estação é uma paragem para os peregrinos. O Caminho não é ‘na’ Estação, é na estrada, é no mundo, é na vida, é na pluralidade da existência, é em meio a tudo e todos, é nas portas do inferno. A “Estação” é um pouso rápido, é um pernoite; ou, no mundo moderno, nem mesmo isso; posto que “estar na estação”, num metrô, por exemplo, é coisa tão rápida que a pessoa quase nem chega a “estar”. Não temos, todavia, a aflição das estações de metrô. Preferimos as Estações das estadas andantes, antigas ou primitivas, nas quais a Estação era apenas uma “ramagem” na beira da estrada. Ou apenas um lugar comum onde os peregrinos, os hebreus do caminho, se encontram. Quanto ao senso de “grupo”, no Caminho ele não existe como tentativa de separação do mundo. Existe apenas o senso de unidade na fé, em meio à pluralidade das muitas expressões humanas. Ou seja: o sal, para dar gosto e ser sentido, fazendo a diferença, tem que se ‘dissolver’ na terra, ou onde quer que seja posto. Portanto, o ensino do Evangelho é para que nos dissolvamos na sociedade humana, em toda ela, dando gosto de Graça a tudo. Além disso, não tenho compromisso com nada além do dia chamado Hoje. A Igreja é de Deus. Deus é Deus. Ele cuida dela. Assim, sirvo a Deus Hoje, e não vivo a neurose de como será amanhã. Não sofro dessa ansiedade. Hoje, todavia, há milhares de filhos de Deus que andam dispersos porque as portas da “igreja” lhes estão cerradas; ou porque mesmo que estejam escancaradas, estão, todavia, encarrancadas. Ou seja: não refletem a face de Cristo, em Graça e Misericórdia, mas sim a carranca dos fariseus e dos draculas da religião sem Deus. Quem está feliz onde está, deve ficar onde está. Apenas proponho que os que parecem não caber em lugar nenhum, ou os que amam a Jesus, mas, justamente por isto, não suportam a “igreja” — conforme ela se tornou—, que não se sintam “desviados”, que não se tornem solitários, que não vivam como se Deus tivesse qualquer coisa a ver com essas confrarias de homens. E, sabendo disto, que se ajuntem, que se reúnam, que se encontrem, que fortaleçam-se na fé, mutuamente; e, sobretudo, que ensinem o Evangelho uns aos outros; e que saiam para a vida, para toda ela, por todo mundo, qualquer mundo, até os confins de qualquer fim de terra; e que indo, pregam, testemunhem, e façam discípulos de Jesus; ensinando a eles que o lugar onde se serve a Deus é no mundo, e que o lugar chamado Igreja é qualquer lugar onde dois ou três se reúnam em Seu nome, até numa “Estação” do Caminho, qualquer estação, com ou sem nome, mas desde que seja um lugar de refrigério. Quanto aos seus filhos, eles têm vocês. Ou você deseja transferir a responsabilidade de ensinar a Palavra aos seus filhos a uma escola dominical? No Caminho os pais ensinam os filhos e são os pastores dos próprios filhos. Embora, nas Estações, haja também ensinos e atividades para todas as faixas etárias; ou seja: para quem quiser. Então, irmão, eu lhe digo: no Caminho, estação é só um lugar de descanso e espera. É só pra tomar de fôlego, para, então, se prosseguir na jornada. Mas há certas coisas que só são provadas se são provadas, e se se fazem provadas; ainda que para alguns pareçam improváveis. É bom, todavia, que se saiba que o Evangelho é apenas para gente que crê no impossível. Saiba só uma coisa mais: eu já tomei atitudes deliberadas que puseram abaixo algo que era considerado “muito importante” para milhões; e isto porque eu senti que estava traindo o chamado de minha existência como ‘homem’. Assim, eu pergunto a você: Por que você acha que eu tenho dificuldade em ver acabar qualquer coisa que eu tenha ajudado a construir? Não, meu irmão! Não tenho nenhum compromisso com perdas, padrões de um dia, ou com a manutenção do que um dia foi bom. O que é de Deus, sempre é Hoje! Eu creio que tudo aquilo que vira um fim em si mesmo, precisa ser destruído. Sim, qualquer coisa; pois até a vida individual-consciente não se valida por inteira por si só, mas pela sua possibilidade de se relacionar com o próximo; servindo a Deus e ao próximo na vida. Ou seja: no Caminho nada é erguido para ser um fim em si mesmo. Se assim for, bem-aventurado é todo aquele que o puser abaixo. Afinal, é assim, ou deveria ser assim, com todas as coisas debaixo do sol. Receba todo meu carinho! Nele, em Quem andamos em cada dia Chamado Hoje; hoje! Caio