—– Original Message —–
From: AJUDE-ME A ACERTAR: eu só tinha ido dar uma voltinha…
To: [email protected]
Sent: Sunday, August 27, 2006 9:00 PM
Subject: ajude-me a acertar!
Amado irmão Caio Fabio!
Graça e Paz vos sejam concedida pelo Espírito Santo de Deus!
Leio suas cartas e muitos dos seus artigos, e tem me edificado de modo
paz-ma-dor ou paz-na-dor.
Estou lendo o seu livro “sem barganhas com Deus” e tem sido muito bom pra mim, fora as crises de riso que me provocam quanto às suas críticas aos Lei-tores; e que eles não se en-fezem…!
Mas estou aqui a pedir uma ajuda, pois, como disse, tenho lido as suas respostas às cartas e de alguma forma tem me ajudado, mas também me confundido bastante!
Não sou casado, mas pretendo me casar. Tenho 24 anos e namoro uma garota de 26 anos. Na verdade somos quase casados; só não moramos juntos; o resto fazemos bem juntinhos… rs!
E a questão é que nunca senti por ela essas paixões do tipo dos filmes românticos. Fiquei com ela porque para mim era uma pessoa de caráter e muito extrovertida, evangélica… Enfim uma pessoa que estava sempre sorrindo, cativando e cultivando uma amizade muito legal, uma menina que conquista qualquer um!
No entanto, certa vez senti por uma garota que conheci o tal tipo de “amor romântico”. E a minha vontade foi chutar o balde e ficar com ela. Apaixonei-me de verdade, apesar de ela não ter tanto caráter assim. Mas fazer o quê? E isso depois de cerca de um ano de namoro prolongado… Até os dias de hoje: quatro anos depois.
Mas como na carta “Ele quase me traiu”, fiquei só no quase; quase a beijei, quase ficamos juntos, quase namoramos, quase… No mais… ficava só nas carícias de quem quer e não tem coragem de ir além.
Até que comecei entrar em crise já com uns quatro anos de namoro e resolvi dar um tempo… Até que “terminei”; pois, de vez em quando a gente se encontrava. Aproveitei esse tempo para fazer o que tanto queria fazer, e fiz. Conversei com a menina. Nada mais. Foi mais um desabafo esperançosamente desesperado. Só isso. Foi aí que minha “ex-namorada” ficou sabendo da história, e sem pensar duas vezes, trocou beijinhos na boca com o meu primo… E isso um dia depois que ela ficou sabendo.
Mas antes de saber do acontecido, pedi a ela para voltar, porque senti uma imensa falta dela… Foi aí que soube da história.
Nem sei pra onde foi o “caráter” que achei que ela tinha! Eu pelo menos tinha me apaixonado e não fiz nada que maculasse o
nosso namoro… E segurei a onda por alguns anos. E agora digo a você que amo a minha “ex” de verdade, mas quando me lembro daquele sentimento que tive pela outra menina… não sei se o que sinto por ela é um sentimento para se construir um casamento!
Fui a uma psicóloga e ela me disse que meu erro foi ter namorado minha melhor amiga!
Por favor, responda essa minha carta. Não tenho a quem recorrer mais.
Nele que diz para fazer o bem principalmente aos da fé! E sem barganhas! rs!
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Amado amigo: Graça e Paz!
Você ainda é um menino e não deveria estar sob o peso de ter que casar.
Casamento tem que ser inevitável!
Tem que nascer na gente como lava que se derrama de dentro de um vulcão.
Tem que ser irresistível como um tsunami tailandês.
Tem que ser demente como uma pororoca do Oceano contra o Amazonas.
Tem que ser como uma ressaca na costa do Rio.
Tem que ser como uma aurora boreal no norte do Canadá.
Tem que ser como uma doença incurável.
Tem que ser como forte como a morte.
Duas coisas apenas tenho a lhe dizer:
1. Você provou de seu próprio remédio e não gostou. Quem trai não deve temer traição; pois, se faz ao outro, deve ser por não se machucar caso o outro lhe faça algo semelhante ao que se faz a ele. E, se se faz ‘como’ e ‘o que’ você faz, e, ao mesmo tempo, se fica assim como você está (fazendo perguntas sobre o caráter da sua “namorada”) — é porque se está tomado de um pensamento mágico e egoísta, que é esse de pensar que as suas coisas são mais importantes que a dos outros; e, portanto, seriam mais justificáveis; pois você, como um Peter Pan, tem licença para brincar sem culpa e sem maldade; enquanto, o mesmo comportamento, no outro, é traição contra você; e isto apenas porque o reizinho disse que queria “voltar”… E mais: você também se esconde de suas responsabilidades, à semelhança de um menino, dizendo pra você mesmo que quando você ficou com a menina, era sua dignidade e honestidade que estavam em curso…; e quando ela ficou com seu primo (nuns beijinhos inocentes se comparado ao que você desejou fazer e não teve coragem), era mau caráter dela — Então, de súbito, sem se enxergar, você a julga, como se o julgamento não fosse também um veredicto contra você mesmo. Assim, seja condenado por seu próprio veredicto. Ou, então, pare de criancice e viva com as conseqüências, como um homem, e não como uma criança mimada. Portanto, essa história toda dela ter ficado com seu primo, e seu juízo sobre ela, saiba: é egoísmo infantil, e é juízo também de você contra você mesmo. Desse modo, como homem, aprenda que o pau que dá no Chico, dá no Francisco também.
2. Você está na iminência de fazer uma grande besteira. É raro ver um relacionamento que no namoro tenha tido as vacilações do seu, e que, no casamento, tenha melhorado e promovido harmonia. Estatisticamente seu projeto de casamento já é um fracasso. Ora, ficar “bem juntinho” no namoro é fácil. O duro é manter isso no casamento; que é onde tal coisa tem que existir mesmo (estar juntinho); pois, do contrário, não resiste aos embates das rotinas da existência. Mas, como dizem aqui no Brasil Central, se você “não dá conta” do recado da fidelidade agora (fidelidade de ações e de sentimentos), quando tudo são flores, como ficará você depois de um tempo de casado, quando as rotinas quiserem engolir sua alma infantil?
Na realidade pode ser que sua psicóloga esteja certa, e que você tenha namorado a melhor amiga e irmã. E como você não é corajoso, mas infantil em sua demonstração de vontades pessoais, prefere estar com ela (que é garantida), do que partir pra algo desconhecido. Ela é segurança pro menino.
Você é um menino na idade, mas, sobretudo, nas emoções!
Portanto, aproveito esta carta a fim de propor a você o encarmento de seu problema real, que não é a namorada e nem a outra, a musa fantasiosa. Seu problema é algo que pode ser popularmente chamado de Síndrome de Peter Pan.
Tudo o que você disse fala de um moço-moço que deseja que a vida o trate como num romance de Hollywood.
Ora, esta é a receita para a desgraça e para a infelicidade!
Amores tranqüilos não estimulam filmes e nem audiências. Hollywood vende a dor real, que existe, e por isto mesmo consola os infelizes (é a bilheteria da calamidade e da tragédia) —; assim como também vende os amores irreais, feitos de impossibilidades que são resolvidas num passe de mágica … e tudo fica bem pra sempre…!
Ora, esta segunda receita hollywoodiana é o diabo; pois, deixa gente iludível como você, pensando que a vida pode ser assim … (until the happy “The End”) —; e, não pode; pois, no mundo se tem aflições… E Hollywood não poder contra tal realidade!
Agora você não vai saber nunca, ou por muito tempo, se a amava ou se apenas precisa e precisava dela, da grande amiga, a quem, sem dúvida, você deve também amar, embora não saiba se tal amor banca um casamento…
A coragem e a honestidade mandariam você terminar … Sem acusações e explicações auto-justificatórias… Terminar e deixar o pão sobre as águas … Pois, quem sabe, depois de muitos dias você o reencontre.
Ficar com ela como se nada tivesse acontecido (e não falo de beijos e de quase sexo), é a receita para a não resolução interior, e, consequentemente, para um casamento culpado e desastroso.
Vocês precisariam separar-se… Sentir tal dor… Buscar até ter certeza… Conversar muito com ela… Avaliar se é assim… Para, então, pensarem em voltar. Se for o caso.
Certas coisas demandam “um tempo” mesmo; especialmente quando os implicados ainda são tão jovens.
Mas sei que na sua insegurança você teme deixa-la só. Teme que ela dê uns beijinhos de brincadeira. Porém, até pra pensar no futuro, agora, é bom que seja assim. Afinal, não creio que você deseje estar com alguém que só é fiel ao namorado se estiver namorando, e que não é fiel a si mesma e ao seu próprio amor por ele.
Só vale a pena casar com alguém que a gente ame e que nos ame também. Porém, a fidelidade de tal pessoa não deve ser de natureza moral, mas sim existencial. Isto porque a fidelidade moral impede acontecimentos e comportamentos de serem manifestos, mas não tem o poder de nos fazer nem mesmo não sentir e não desejar a coisa que não é nossa. Sim, não se faz nada concreto quando somos guiados pela fidelidade moral, mas, muitas vezes, se sente muita coisa. E mais: mesmo quando nada se faz, não se o faz em respeito ao outro, mas não em respeito a si mesmo, e ao amor que sente pela outra pessoa. Assim, fidelidade moral é filha da coerção e do medo da transgressão e suas conseqüências, mas não é filha do amor espontâneo e verdadeiro, o qual, estando presente, impossibilita a pessoa de se dar a alguém enquanto ama outra; posto que tal pessoa ama; e, em havendo amor, não existe tal possibilidade, mesmo que o objeto do amor não esteja presente. Um parceiro assim é a única pessoa com a qual vale a pena casar. Do contrário, saiba: é laço!
Portanto, pense no que lhe disse, pois, a meu ver, seu problema não é tópico, conforme a sua carta incita a crer, mas é de natureza arquitetônica; posto que tem a ver com a estrutura de sua alma; tem a ver com sua construção interior — o que é muito mais sério para o seu futuro. Pois, não sendo tratado agora, essa mesma coisa haverá de tratar de você mais tarde. E nunca é bom deixar que nossa sombra nos “trate”, pois, tal trato é sempre cheio de desconstrução e dor. O bom é poder discernir hoje, e, assim, tratar do próprio coração, pela via da verdade e do auto-encaramento, já. Sim, enquanto a verdade pode nos dar muitos dias de alegria e paz!
Receba meu beijo todo amigo!
E não fique impressionado com minhas palavras, posto que amei sua sinceridade, e o que eu deveria fazer era ser sincero em minha resposta. Do contrário, que ajuda tenho eu a dar a você, se não lhe digo a verdade?
Nele, em Quem todo filho é admoestado para o bem e para a vida,
Caio