AMIGO na ALMA

 

 

 

 

 

 

—– Original Message —–

From: AMIGO na ALMA

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Sent: Sunday, March 18, 2007 4:19 PM

Subject: Leia meu irmão.

 

 

 

 

AMIGO na ALMA

 

 

No mundo relacional, no vivido, sentimo-nos acima de tudo como seres inacabados; estamos sempre a nascer. Sempre nossa hora é chegada. Essa marca que instaura nossa constituição, isto é, nosso momento de nascer, se perpetua como um prolongamento, um longo fio de ariadne, que se desenvolve em nossa humanidade, ao longo de nossa trajetória, de nossa existência.  Sempre procuramos algo; algo em que o nosso ser se consolide; se integre. Mas o caminho para a integração nem sempre é congênito, às vezes é unigênito da experiência. Da experiência de quem viu o mundo partido e restaurado, da vivência de alguém cujo ego sensual foi domesticado pela presença do Senhor irresistível!

 

Essa equação transparece acima de tudo um Vau de Jaboque . Jacó e o Anjo lutaram, e de sua imprecação, nasceu um fruto santo. Uma nova identidade. Um novo ser, que renasceu, como a borboleta que se desprendeu da crisálida.  Essa consolidação permanece centrada no nosso selo, na nossa meta.  Nosso ser aspira por certa contingência; por uma fronteira, um limite. Por algo que nos satisfaça, e onde podemos gozar o Ser. O sentimento de completude, longe de se reduzir em nós mesmos, se consuma no outro. No outro, nos reencontramos, e fazemos novamente a imagem de nosso Pai.  Essa irmandade; prolonga-se ao longo dos éons como um elixir da vida, uma fonte de comunicação e comunhão com o outro.

 

Em outras palavras, na imanência do outro, gozamos a presença do Pai.

 

A união de ambos os vértices: do horizontal e do vertical, demanda o impulso para frente em todos nós. Nascemos sempre de novo, no outro; e sem perder a atração do Senhor, o outro nos restitui ao mesmo Senhor.

 

O processo de imanência do humano não pode negar essa lei inexorável.  A divisão de identidades entre Jacó e o Anjo, exprime um acontecimento antes de tudo interno ao homem. É Jacó, que sai marcado pelo transcendente, justamente porque ele mesmo tenta deter e dialogar longamente com o transcendente. Esses momentos constituem nossa travessia; nossa migração para outros mundos e para outras existências e aspirações que exprimem essencialmente um diálogo. Uma conversa interna, onde o seu Outro silencia todos os demais.

 

É a conversa que nos satisfaz.

 

Após lutarmos com o Anjo, ou atravessarmos o Vau de Jaboque, estamos livres. Livres, porque nosso pensamento não reincide em nosso desejo, mas em nossa fraqueza; naquilo que em nós é puramente humano.  

 

O desejo é uma escolha, é um campo aberto; a fraqueza é uma contingência, uma delimitação.

 

No Senhor essa fraqueza é transfigurada por um senso de beatitude, de santificação, de integração, individuação. Mas individuação que permanece aberta ao outro; ao lado daquele ou daquela em que experimentamos o mesmo senso de existência, e quanto mais nos individuamos, mais nos tornamos aptos ao outro. E conseguimos ser menos a gente e mais eles.

 

É desse modo, amigo Caio, que o figuro no meio daqueles com quem compartilhei os meus significativos momentos de existência; ou melhor, de contemplação.

 

Em certas pessoas encontramos um espírito que volta ao tempo, que parece carregar todo o mundo dos nossos ancestrais e ao mesmo tempo pedir por partilha, por relação nesse mundo.  Esse é você; ou melhor, essa é sua casa; sua habitação, seu território.

 

Quando nos outros você se reencontra em você, você é mais conosco!

 

Que teu caminho seja compartilhado conosco e amadurecido conosco meu amigo, por que na alma, o nosso diálogo se renova no Senhor e para sempre!          

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Resposta:

 

 

Amigo na alma e da alma, Vitor: Graça, Paz e Eucaristia fraterna sejam sobre nós todos!

 

 

 

O Vau de Jaboque é o lugar de Jacó se tornar Israel, que é o surgimento prevalente desse eu – profundo, e que surge nas sombras da noite a fim de encarar Jacó; o eu enganador, suplantador.

 

Jacó não teve amigos, pois, nenhum enganador ou suplantador os possui, posto que lhes é impossível entregarem-se. O espírito de “Jacó” esmaga o espírito de encontro e verdade que “Israel” demanda de nós.

 

O Anjo do Senhor que com ele luta é, como você disse, também a manifestação do “eu – Israel” de Jacó; e que faz com que, Jacó, não tenha mais o poder de seguir para nenhuma jornada sem aquela admissão por parte do “eu-persona”, do Jacó de Rebeca, da mãe; contra Esaú, o irmão, filho do pai. Somente “Israel” poderia voltar para casa.

 

No caminho histórico Jacó está indo ao encontro de Esaú, que era o preferido de Isaque, o pai. Mas “Jacó” não tem como se encontrar com seu irmão Esaú. Ele não confia e não é confiável, pois, ele é instintualmente desconfiança e espírito de competição.

 

Ou seja: espírito de ilusão e suplantação, e que é sempre em relação ao próximo; sendo, também, inconscientemente, algo que acontece contra o próprio eu – uno. Esse espírito tem que dar lugar à pacificação que somente acontece quando o “eu-ilusivo” (Jacó) se expande para a integração unigênita que existe em “Israel” .

 

O encontro com o irmão pressupõe o quebrantamento de Jacó e o surgimento de um espírito de irmandade, que é o espírito da confiança que impele Jacó, como Israel, na direção de seu irmão e de sua própria história. Aqui a tendência à fuga é estancada.

 

Assim, o Anjo trás a Jacó a mensagem de seu eu – profundo, cioso apenas pela verdade. 

 

O Anjo do Senhor é a manifestação de Deus explodindo do ser profundo de Jacó como limitação ao engano e ao espírito de suplantação, pois, sem tal quebrantamento ninguém se torna um para si mesmo, nem para o Pai e nem para o irmão, em quem ele se avistará com o Pai, e em quem ele também se verá.

 

Israel vence sobre Jacó embora o caminhar claudicante da fraqueza de Jacó o acompanhe no resto da jornada.

 

O renascido tem que carregar a marca histórico-existencial de sua conversão. E a marca da conversão é fraqueza, é um andar que carrega o “equilíbrio do mancar”. Sim! Porque somente o mancar pode dar equilíbrio a seres cujo suposto equilíbrio é, aos olhos do Senhor, um andar de desequilíbrio; pois, o Jacó que agora manca é o Israel que anda diante de Deus e dos irmãos em equilíbrio maior.

 

Extraordinário é esse paradoxo; ou mesmo, essa contradição. Pois é a “marca do manco” o que se torna o “fio de Ariadne” que segue de geração em geração, como um “elixir de vida”; e que na história da Luta de Jacó com o Anjo vem a aparecer como “o nervo da cocha de Jacó”, o qual, ferido, fere de bem a todas as demais gerações que dele venham a proceder.

 

O enganador de outros é enganador de si mesmo. Mas o suplantador de outros não é suplantador de si mesmo até que seja ferido!

 

Assim, Israel só pode aparecer em Jacó quando este deseja mais a Deus do que a continuidade de qualquer jornada.

 

“Não te deixarei se não me abençoares”.

 

Israel é o eu que nasce da desistência de Jacó de prosseguir a jornada sem verdade.

 

Entretanto, esse que vence o Anjo é o mesmo que é vencido pelo que de “um outro” nele havia: o Israel esmagado.

 

Jacó não sabe ter irmãos, pois, Jacó quer vencer os irmãos!

 

É em “Israel” que Jacó se fraternaliza!

 

O maravilho em tudo isto é que o caminho da Vida é o caminho do embate, da crise, da noite escura, do susto com o brotar de Deus como agonia de guerra em nós!

 

Desse modo, creio que minhas amizades de alma e espírito, solidificam-se no “Israel existencial” que a cada dia cresce em mim e em você. E eu não temo mais nenhuma luta comigo mesmo que venha a me fazer “mancar no equilíbrio” que me leva na direção dos irmãos, pois, neles, eu abraço o Pai.

 

E você tem sido pra mim forte abraço do Pai nos braços dos irmãos!

 

Um beijo pra você e pra Flávia. E mais: se Ele permitir dia 8 estaremos aí com todos os filhos que estarão aqui.

 

 

Nele, que é em nós e por nós,

 

 

 

Caio

 

20/03/07

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