Escrito em 17/09/03
Comendo Juízo Para Si
I Co 11: 17-34
Há muitos livros a se escrever sobre a passagem em epígrafe. Mas este é apenas um lugar-momento-devocional!
Minha ênfase aqui é mais que simples. Quero considerar apenas três aspectos implícitos entre os versos 28 e 30.
Paulo havia dito que a reunião cristã poderia fazer mal para o ser (17). Esse mal já se manifestava como dormência e arrogância. E essas doenças apareciam nas buscas de primazia que geravam divisões (18); na ufania do poder que validava quem era quem (19—os aprovados); pela insensibilidade para com a necessidade do próximo; e através da busca piedosamente hedônica da demonstração de superioridade espiritual pela via das demonstrações de posse (21-22).
Por isto ele diz que aquela reunião poderia até ser feita em nome de Deus, mas fazia mal para a alma: não era a Ceia do Senhor que comiam (20).
Paulo então evolui a fim de mostrar que a ceia original era uma celebração de graça, amor, misericórdia e solidariedade de Deus para com os homens (23-26).
Somos salvos pela absoluta solidariedade de Jesus por nós na Cruz!
Não entender isto é comer e beber indignamente a ceia do amor (27). Portanto, a recomendação é no sentido de que haja auto-avaliação. A palavra “examine-se” era utilizada para se verificar a qualidade do material de uma moeda. A moeda era jogada ao chão ou no mármore a fim de se ouvir o sonido que produziria: se era latão ou material nobre!
É o amor solidário que dá qualidade aos materiais da vida, do contrário, é bronze que soa ou apenas címbalo que retine!
Então o apóstolo chega à recomendação para se discernir o corpo a fim de que não se coma e beba o que faz mal (29). Comer sem saber o que se está comendo pode nos envenenar!
A questão, portanto, é: o que significa discernir o corpo à luz do contexto?
1. Discernindo Cristo como o Corpo: se há o Corpo de Cristo é apenas porque Jesus se fez Corpo em nosso lugar. Nesse sentido, quando discirno o corpo chego logo a pelo menos duas conclusões: a) somos todos iguais em Cristo; b) cada um de nós é um indivíduo em Cristo. Por isso, não sou superior à ninguém e muito menos juiz de meu próximo. Não julgueis—o próximo—para que não sejais julgados! Afinal, se cai ou levanta, para o seu Senhor o faz!
2. Discernindo o Corpo como de Cristo: aqui é que a eucaristia, a ceia do Senhor, começa a nos remeter para aquele lugar de auto-exame e de libertação em relação ao exame do meu próximo, ao mesmo tempo em que me faz compartilhar vida com ele, ainda que eu tenha que esperar por ele—seja no ato de comer ou de caminhar na vida (33). O Corpo sou eu, mas não apenas eu. E o “nós” do Corpo não pertence a ninguém, mas só a Cristo!
3. Discernindo o Corpo no meu Ser: neste ponto é que a falta de discernimento começa a matar quem não o exerce. Se nos julgamos, não somos julgados. Se nos examinamos, não corremos o risco de engolir veneno. O envenenamento do ser não vem de fora, mas do tipo de comida que a alma serve a si mesma. Na ceia o veneno nunca vem de fora, sempre é servido pelo mordomo das minhas arrogâncias e juízos ao meu ego que sofre da presunção da superioridade, ou do arbítrio, ou do descaso para com o próximo. Assim, come-se e bebe-se juízo para si!
A conclusão é que isto faz mal mesmo. Faz mal ao Corpo, faz mal ao ser e faz mal até ao corpo físico. Essa reunião “não é para melhor e sim para pior”. Desse modo, não discernindo a solidariedade de Jesus para com todos, fazemos divisões, julgamos os irmãos, pomo-nos na condição de aprovadores ou desaprovadores do próximo, dessenbilizamo-nos para a carência em volta de nós, e ficamos cegos para a nossa própria condição. Essa doença mata a outros, os que sofrem a opressão dessa falsa espiritualidade; e, sobretudo, mata aqueles que a praticam. Mata o espírito, seca a alma e somatiza-se até no corpo físico (30).
Assim, examine-se. Não é seu irmão quem ter que ser examinado!
Assim, julgue-se. O Senhor não quer julgar você!
Assim, creia na Graça e, então, coma do pão e beba do cálice!
Faça isto sem medo!
Afinal, está Consumado!
Caio Fábio