LUTANDO E ACALMANDO O ANJO



“… e o anjo tocou no nervo de Jacó…” Desde menino que Deus me toca. Não tenho lembrança de nenhum tempo da vida sem o toque de Deus, mesmo quando me esmagava. Tais toques podiam ser comoções ante a miséria, ou pena de um amigo pobre, ou desejo de poder ajudar pessoas necessitadas, ou alegrias intrínsecas, ou pelo bem estar de viver, ou pela certeza de ver orações respondidas; e, mesmo menino, algumas vezes, pelas impressões que a leitura ou citação de algum verso da Bíblia provocava em mim. Depois Ele falou comigo de muitos modos e maneiras, e nos lugares e através das pessoas ou meios os menos prováveis. Então, em 1973 Ele me deixou ouvir a voz do diabo; e me fez ver o quão frágil minha consciência era, quanto a poder resistir até mesmo uma possessão demoníaca. Logo depois “me converti”. Foi então que os toques de Deus mudaram, se tornaram vozes no interior, gritos e sussurros vindos da leitura da Escritura, uivos de demônios que deixavam suas vítimas confessando que Jesus era o Cristo, sonhos nos quais eu era capaz de recitar o Novo Testamento todo, por vezes acordando proclamando, por exemplo, a carta aos Efésios em voz alta, e por inteira. Então fui sentindo que a Palavra foi me possuindo como verdade tanto mais quanto eu a lia em oração, com meditação, e em jejum. Durante sete anos assim foi, e com toda intensidade. No entanto, de 73 a 86, minha disciplina nessas áreas era diária e os jejuns eram ainda muito freqüentes, embora já não durassem dias seguidos, como nos primeiros sete anos. De 73 a 83, no entanto, minha espiritualidade, embora intima, ainda tinha Deus sentido como “Espírito Santo” habitando o coração; e, para consumo de oração, imaginação, referencia psicológica, e metáfora física —, Deus estava “do lado de fora”. Ou seja: eu sentia e cria em Deus em mim, porém, psicologicamente, para mim, na maioria das vezes, Ele se referenciava, nas projeções do “lado de fora”. Foi de 84 em diante que minha intimidade com Jesus foi se tornando uma amizade mais chegada, uma certeza de ter me feito Seu discípulo como se com Ele tivesse andando no chão do mundo; e, nesse mesmo tempo, cresceu em mim cada vez mais a convicção de que minha fé em Jesus tinha se tornado a “consciência de um borogodó” entre Ele e eu. Assim foi até 1990. De 90 até 95 eu me senti como um agente Dele na Terra, entre os homens, mas havia uma certa “oficialidade” na suposta representação; ao mesmo tempo em que tal sentimento parecia ter o poder de assassinar a minha alma e a minha vocação existencial. Nesse tempo eu o experimentava como Pai entristecido. De 95 a 98 eu vivi tendo-O como referencia em mim apenas como grito de misericórdia. Minha relação com Ele, naquele tempo, foi feita de culpa, angustia e muito clamor por libertação de todas teias que me prendiam. Eu queria viver apenas como homem. De 98 até 2000 eu briguei com Ele. Não podia negá-Lo. A gente se conhecia. Mas não estava querendo assunto. Não podia entender o que havia acontecido. E fiquei com raiva Dele ter me posto onde eu não pedi para estar, e nem soube que estaria, se, Ele sabia que eu poderia trazer tristeza aos que eu amava. Coisa de menino. Assim, vivi dois anos de imbecilização amargurada. Mas Ele falava comigo em sonhos; sonhos e sonhos; e me perseguia. Eu fugia Dele porque morria de paixão, e achava que não mais poderia falar de meu amor por Ele na Terra, para todos os homens. Parecia que Ele me havia feito para ser, e, para me deixar ver o meu “deixar de ser”; para, no fim, me fazer assistir o meu próprio funeral. Ele sabe que era assim que me sentia. E nossa relação era passional. De 2000 até 2003 nós lutamos em nossa paixão. Ele e eu brigávamos todos os dias, mas fazíamos amor todas as noites. Então, rasgando a minha a alma, a Palavra me lacerou de dentro para fora, e me arreganhou um ferimento sem cura, do qual brotou uma Estranha Confiança, uma certeza de amizade, uma garantia de presença, uma sincronia sem temor, um amor certo, e uma imensa certeza de fidelidade da parte Dele para comigo. Mas desde 2000 que vinha crescendo em mim um outro toque Dele, era como se eu pudesse me sentir tão Nele, que, o que eu via, via sem medo, mesmo quando brigávamos feio. De fato, sutilezas de crescente percepção aumentavam em mim durante todo esse tempo! Em 2004 eu conheci o Seu amor como consolação, enquanto minha alma gemia sobre a saudade da alma amada de meu filho Lukas. Minha vida Nele, só cresce em simbiose espiritual. Ele está em tudo e em toda parte, não como confissão de fé, mas como experiência existencial. No meio de tudo isto o amor sempre foi o vinculo, mesmo quando achei que havia brigado com Ele. O interessante, também, é que em cada fase anterior Ele e eu nos conhecíamos com amor íntimo. Mas a relação cresceu. Mesmo no dia mais escuro havia Presença. Em todos os vales. Em todos os abismos. Em todas as distancias mais distantes. Em todas as viagens mais elevadas ou depressivas. Sim, eu sempre pude dizer: “Porque tu estás comigo!” Nosso chamado é para conhecer a Deus. Tem gente que vai pro seminário para conhecer mais a Deus, assim como tem gente que faz psicologia a fim de ter uma analise diária e por um preço bem mais em conta. Tem gente que lê a Bíblia para conhecer a Deus. Tem gente que vai a igreja. Tem gente que vai a reunião de oração. Tem gente que faz qualquer coisa para conhecer a Deus. Para elas Deus está fora, e elas estão fora de Deus. Sendo que, para elas, a única maneira de conhecer a Deus é mediante a prova de uma obediência moral, do lado de fora; sempre pela via de um comportamento educado. Tem gente que tenta falar em línguas estranhas para melhor conhecer a Deus. Tem gente que ser usada em milagres. Tem gente deseja sistematizar Deus até onde seja logicamente possível. E assim vai… O conhecimento de Deus não tem nada a ver com isto, podendo apenas se complementar por algumas dessas coisas, eventualmente; porém, sem que nelas tenha qualquer valor de natureza essencial. Para se conhecer a Deus algumas coisas que não estão ao nosso alcance precisam acontecer. Primeiro você tem que ganhar a consciência de que Deus é Deus. Mesmo! Depois você precisa discernir que há algo em você que é de acordo com Deus, ao mesmo tempo em que reconhece que há uma luta contra tal vocação em você também. Então, surge um desejo de conhecer Deus que é do tamanho da certeza de que você mesmo não pode conhecê-Lo. Assim, o chão da alma vira bendito desespero. A alma se sente impotente. Confessa-se perdida. Garante que ela própria sabe que não merece nada melhor. Mas continua. Insiste. Luta com o anjo. Confessa que está matando o próprio filho, mas que no Monte do Senhor se proverá. E não sabe explicar o por quê, mas sabe, lá no fundo do ser, que conhece e é conhecida; e que o amor de Deus é infinitamente maior do que qualquer outro atributo divino; pois todos os demais atributos são apenas filhos da fonte do amor; sendo essa a razão porque a misericórdia triunfa sobre o juízo. Assim, a pessoa fica seduzida pelo amor de Deus, e a Ele se entrega, e com Ele se reconcilia, e no Seu perdão se deleita; e, depois de tempos, descobre que a “tal briga com Deus”, a tal luta interior, nada mais era do que a “justiça-própria”, que é o maior escudo que a alma tem para se defender da Graça de Deus, insistindo em não aceitar o amor gratuito, apenas para não se apaixonar, se converter, e se deixar levar pelo amor de Deus, ao qual a pessoa obedecerá sem questões, posto que já deu toda razão a Deus, pois sabe que Deus é amor. Desse lugar, tudo é visto em Deus! Nele, Caio