Semana retrasada, na rádio do site, falei sobre o texto que segue. Hoje pela manhã uma irmã querida, a Gláucia, do Recife, o enviou para mim. Assim, tocado por muitas coisas, desejei escrever suavemente sobre ele.
Eis como segue:
Então, Pedro, voltando-se, viu que também o ia seguindo o discípulo a quem Jesus amava, o qual na ceia se reclinara sobre o peito de Jesus e perguntara: Senhor, quem é o traidor?
Vendo-o, pois, Pedro perguntou a Jesus: E quanto a este?
Respondeu-lhe Jesus: Se eu quero que ele permaneça até que eu venha, que te importa? Quanto a ti, segue-me.
(João 21:20-22)
Pouca gente tem coragem de perguntar “quanto a mim”. A maioria apenas quer saber dos outros.
A questão pode parecer piedosa. “Quem é o traidor?” Ou pode soar suavemente ressentida. “E quanto a este?” — mas o que se quer, pela pergunta que não é “quanto a mim”, é usar o amor recebido a fim de granjear privilégios de informações que são apenas fruto da intimidade com um outro-mais-poderoso do que nós; ou então tem a ver com comparar o destino dos outros com o nosso.
No primeiro caso encontra-se com a mais sutil vaidade. No segundo com uma sutil forma de ressentimento que busca comparações.
Ora, João sabia por si mesmo que não era o traidor. E Pedro sabia que era amado, e que poderia cuidar das ovelhas de Jesus, apesar de o haver traído. Mas quem resiste querer saber sobre o destino alheio? Sim, especialmente quando se tem a liberdade de deitar sobre o peito de Jesus, à semelhança de João; ou mesmo quando se o ouviu dizer que nós, apesar de perdoados, ainda encontraremos a nós mesmos em fraqueza, sendo guiados para onde não se quer, sem controle sobre as circunstâncias? — como era o caso de Pedro em particular.
Assim é o coração humano em estado natural, por melhor que seja. Quer saber acima dos demais, esteja alegre ou triste.
Não basta que no coração se saiba quem se é; pois sempre se quer saber sobre o outro!
Sim, parece que o destino dos outros é o que referenda quem somos, e não quem de fato se é.
A cura que Jesus propõe é simples. Ele nos faz nos interessarmos por nosso próprio caminho; pois, somente assim teremos coração para cuidar de nós mesmos e dos outros — e não do destino alheio — sem o espírito que se envaidece quando o nosso caminho parece mais fofo; e nem com o coração que só se sente amado se o destino dos outros for pior que o nosso, do nosso ponto de vista.
Portanto, que ecoe para sempre em cada de nós a afirmação de Jesus: “Quanto a ti, segue-me”.
Aqui reside a saúde de nosso caminhar, seja o que for o que nos aguarde. Seja como a longevidade de João, com o mito de que ele não morreria; ou como o caminho de Pedro, com a certeza da fraqueza e da morte.
Sim, que te importa? Ou o que me importa?
O que importa é apenas o “quanto a ti” dito por Jesus a nosso respeito; e, consequentemente, nossa disposição de perseverar em nosso próprio caminho Nele — que é o Caminho de todos nós.
Caio
Ps: Dia 28 de setembro de 2006. Uma noite depois de nosso netinho Mateus ter chegado, também num dia 27 — marcando um aniversário ao contrário em nossa família; pois foi também num outro dia 27 (março de 2004) que o Lukinhas, meu filho amado seguiu seu caminho para o Pai.