PAIZINHO: ESSA SERIA SÓ PRA O SENHOR!
Ah! Meu paizinho. Ainda bem que o senhor não pode me ouvir!
Pois, de fato, paizinho, eu estou comendo no seu pratinho, com toda a alegria, a perfeição de sua vida e de sua partida [
Mas pai, enquanto o choro lava, dói; e enquanto alegro-me em sua vida, me arrebento; ao mesmo tempo em que me faz sentir o mais bem-aventurados dos filhos, me faz sentir também o mais saudoso de todos eles.
É tão maravilhoso ser seu filho que dói muito ter que esperar para rever senhor.
Mas aprendi com o senhor: o senhor vicissitude pode virar senhor necessidade; e que se tornará uma grande alegria [
Hoje, por Graça, não é vicissitude e nem necessidade: é vicissidade, papai.
Mas a bem-aventurança que chora é a mesma que faz andar em consolação!
O senhor, meu pai, era homem tão pra além de tudo, que assim como até aos 10 anos eu via sua muleta apenas como uma utilidade; apesar de tudo, somente agora eu vejo que seu corpo dormido era o senhor sem conversar comigo até o dia da Conversa Eterna.
E como faz falta não receber o seu telefonema sagrado, sempre me dizendo:
“Meu filho! Você sabia que você é um marotinho muito amado?”
Ou aquele simples:
“Caiô, meu Caiôzinho! Você sabia que este coração aqui está passado de saudades?”
Ou ainda:
“Conte-me como estão as coisas? E nossos queridos? O Cirinho, o Davizinho, o Lukinhas [até 27 de março de 2004] e a nossa Jujuzinha? E como está a minha norinha amada? E a Bruna? E os meninos? E me fale do Caminho da Graça? E nosso amado Rômulo?”
Etc.
Mas o que vai doer mais, meu paizinho, será chegar ao próximo 15 de março [nos meus 53 anos], e não ouvir o que tenho ouvido nos 52 anos anteriores [pois, o senhor disse a mesma coisa desde antes de eu entender]:
“Meu Caiôzinho amado! 53 anos. 53 anos de Graça, de muito amor de Deus e de muita misericórdia. E eu disse naquele 1º dia: Jorrou petróleo hoje
Mas prometo que vou ouvir até o meu último aniversario a sua confissão de esperança e certeza sobre mim, meu pai.
O senhor não tem eco
Dizem que tenho cada dia mais os seus jeitos. Que me acaricio como o senhor. Que fico absorto como o senhor. Que aliso meu peito como o senhor. E até percebi outro dia que só consigo virar na cama como o senhor: sentando e girando o corpo; e isto até dormindo. No entanto, o senhor fazia assim por causa de seu defeito físico. Eu faço por absorção do senhor, meu pai.
Alda sonhou em janeiro de 1999 [
Ah! Meu paizinho. É tudo o que quero. E o que me dá esperança é que já fui, quando menino, um sábio-menino; por isso, sei que mais sábio ainda eu serei em Jesus nesta idade na qual o homem ou fica sábio ou vira tolo de tanta amargura.
Voltar pra cá e não ver seu rostinho no aeroporto, mesmo que no meio da madrugada, será como chegar à praia e não achar o mar.
E o Monte Sião sem senhor?
Lindo! Mas e a magia de seu olhar de devoto da beleza de Deus na natureza? E sua alegria em mesmo não podendo entrar na floresta regozijar-se que minhas pernas e as da Adriana ainda podem entrar no seu paraíso de outrora?
Quem vai alegrar-se com os que se alegram e chorar com os que choram? Sim! Nesse mundo no qual a alegria de uma pessoa é a tristeza e a inveja de outra? E no qual a tristeza de alguém é a oportunidade de afirmação de outros?
E quem se assentará [não como um juiz] como um servo do amor, assim, descuida e disponivelmente, com a porta aberta, servindo a quem quer que apareça?
Ah! Paizinho! E quem construirá as torres novas, de Aquaricara, que pela Graça levantaremos em seu pedaço de terra lá no Rio Urubu?
E como será terminar e não ver sua alegria? Sim! Sua sempre grande, linda e pura alegria?
Paizinho, hoje, quando seu corpo ia…, muita gente da rua abraçava a si mesma e dava adeus, como quem abraçava o senhor… Simples gente da cidade… Quem vai abraçar os humanos até quando apenas passa morto?
Chocou-me ver do longe que muitos vieram… Do interior. Da mata.
Veio o meu amigo Senador Artur Virgílio Neto, o governador falou no programa de rádio a seu respeito [belas palavras]; o prefeito, seu amigo de longa data, o Serafim, não poupou esforços — mas o que me impressionou foi o “Brasília” do Novo Remanso, andando com dificuldade…; ou aqueles que vieram lá do Monte Sião… E foram beijar o senhor.
E quem vai ter mais o privilégio de partir aos 81 anos e ainda ter a professora que o alfabetizou sentadinha, emocionada como quem criou um mestre? Ah! Até sua primeira professora estava lá… Um milagre de longevidade…
“Fui eu quem ensinou ele a ler” — me disse ela. E como fiquei grato; pois, pela leitura, senhor foi mais distante do que ela jamais sonhou.
E quem vai apanhar meninos e meninas sem rumo e fazer deles comerciantes, empresários, médicos, mulheres felizes e homens fiéis?
Você foi uma FGV para centenas e centenas… Só que a sua era a Fundação Ganho de Vida. E centenas de seus formandos estavam hoje lá… Aos prantos.
Jesus é o Evangelho, e fez do senhor um evangelho vivo, escrito com tinta de amor, e com suor de agonias de bondade.
E quem não se poupará mais?…
E quem ainda terá a coragem de largar tudo para viver de tudo-nada?…
E quem considerará o refugo como refugo neste mundo onde o refugo é o diamante mais ambicionado?
Ah! Paizinho! Nosso Pai há de prover. Mas eu queria tanto que o senhor soubesse que o senhor foi uma raridade deste planeta.
Eu estou aqui… Grato de saudade. Mas, fique sabendo: não haverá um único dia de minha vida em que eu não venha a consultar sua memória viva em mim, na busca da sabedoria que senhor encarnou diante de mim e de milhares.
De fato, o que quero dizer mesmo é que o senhor foi um desses poucos homens dos quais o mundo não é digno. Pois, a maioria merece o mundo que tem.
Mas o senhor dignificou tudo o que não tinha dignidade!
Basta ao discípulo ser como seu mestre. Jesus é o Mestre. Mas ainda peço a Ele para encontrar o seu caminho, meu pai, nessa vereda raramente percorrida, que é feita apenas de verdade simples e de fé que não teme ser fé; e mais: que vira inamovível confiança.
É nessa direção que eu caminho!…
Na Graça, como na Graça o senhor chegou, por ela também eu chegarei lá.
Mas que saudades meu amorzinho!
Caio
16/09/07
Manaus
AM