ÁGUIAS E ABUTRES: ETIQUETA-ÉTICA
A diferença entre as aves de rapina e as águias é que as primeiras devoram em bando e no lugar das matanças. Já as águias carregam a presa para comer em seu ninho, no alto da montanha.
Mas a etiqueta tem seu papel no mundo animal por nossa causa.
Para nós, o modo de matar e comer pode estabelecer a diferença moral entre a imagem do abutre e a da águia. Assim como fazemos entre operação militar cirúrgica de assassinato realizada pela CIA e uma ação terrorista praticada pelos carniceiros covardes.
A presa pensa a mesma coisa sobre ambos. Assim como os frangos não se comovem com a gentileza de uma morte realizada num campo de concentração granjeiro, nem tampouco com uma primitiva torcida em seu pescoço no fundo do quintal daquele que o comerá — julgando a primeira mais frangalmente humana.
O frango does not care!
Nós é que atribuímos barbarismo à obviedade chocante da execução da galinha de pescoço retorcido e emprestamos fineza civilizada à execução no corredor da morte da assepticamente bem cuidada granja.
Para Calvino, seria mais humano que levassem seu derrotado contendor à guilhotina —não sendo possível a ele ser perdoado, pois essas haviam sido as regras do combate intelectual— do que permitir que o condenado fosse colocado amarrado à estaca da fogueira quase-pós-medieval.
Para o herege, seria apenas uma outra maneira de ser morto.
Assim, o “golpe de misericórdia” sempre mata alguém!
A misericórdia entra nas histórias para poupar os matadores de realizarem uma execução que os faça sentirem-se bárbaros, carcarás ou abutres.
Uma questão de etiqueta-ética!
Caio
(Escrito em 18/06/03)