Ezequiel 4
Um dia, sem maiores explicações, como costuma fazer, Deus disse ao Seu servo Ezequiel para cozinhar e comer sua comida sobre fezes humanas.
Aliás, a alma de Ezequiel lidava bem com a arte da interpretação… mas não com as artes culinárias.
E Deus se serviu desse dom que Ele mesmo dera a Ezequiel a fim de fazê-lo comunicar a Palavra.
De vez em quando Deus faz assim. Cria uma cena… e a mensagem é entendida!
Mas naquele dia Ezequiel achou que Deus estava extrapolando. Apesar de que ele não estava inaugurando uma era e nem seria o último naquele tipo de papel.
Isaías andou nu.
Jeremias também teve seu quinhão de “mico a pagar” a fim de fazer a mensagem de Deus ser entendida.
Se alguém quer ser de fato mensageiro de Deus, fique também preparado para a possibilidade de a vida ter que se tornar a parabolização ou a caricatura da própria mensagem — tudo isso para chamar a atenção da consciência dos estúpidos.
Deus ama os estúpidos… Oséias que o diga. Teve que casar com a mulher sexualmente compulsiva apenas para que na promiscuidade dela se pudesse ver a prostituição espiritual de Israel, e no amor gracioso de Oséias se pudesse discernir a loucura, o absurdo irreferível do amor de Deus pelo Seu povo.
O próprio Ezequiel já havia “desempenhado alguns papéis” conforme o roteiro divino. Recentemente ele havia simulado o cerco de Jerusalém tendo que ficar andando em volta de uma “maquete” da desgraça…
Talvez assim os estúpidos pudessem enxergar… Mas quem creria?
Bem, o assunto é fezes, e “isto” é sempre é um assunto freud para a sensível consciência religiosa, embora não o seja para o paladar religioso.
Assim falou Deus a Ezequiel:
“Ezequiel, tu comerás a tua comida como bolinhos de cevada, e à vista de todos assarás os bolinhos sobre excremento humano”.
Ezequiel achou que não havia entendido bem.
Mas Deus prosseguiu:
“Em bolinhos… é que comerão os filhos de Israel o seu pão imundo, entre as nações para onde eu os lançarei…”
Ezequiel entendeu que era exatamente aquilo mesmo que ele havia entendido.
Seu estômago revirou.
Sua mente imaginou o ridículo.
Sua alma repugnou tanto a coisa em si como também o sentir psicológico que aquilo seria para ele: vergonha e mais um atestado de insanidade mental.
E seu espírito recusou aquilo que, para um homem como ele, era não apenas nojento, mas espiritualmente abominável.
Assim falou Ezequiel:
“Ah! Senhor Deus! minha alma nunca foi contaminada com nada disso. Desde menino até agora jamais comi nem animal que morre de causas naturais ou que tenha sido dilacerado por feras, e nenhum tipo de carne cerimonialmente abominável nunca passou pela minha boca”.
O Coração de Ezequiel batia acelerado. O que Deus lhe iria responder?
Assim falou Deus:
“Vê, Ezequiel: ao invés de excremento humano, eu te dou esterco de bois. Mas é sobre excremento que prepararás o teu pão”.
Que alivio?!
Que nada!
Não era de homem, mas era … de qualquer jeito!
E prosseguiu Deus:
“Filho do homem, eis que ‘quebrarei’ todas as padarias de Jerusalém. Assim, seus habitantes comerão o pão com ansiedade; e beberão a água ‘medida’ e com muito espanto. E será assim até que lhes falte o pão e a água, e se espantem uns com os outros, e definhem na sua maldade”.
Então o poeta William Blake imagina a cena, há quatro séculos passados, e pergunta:
“Ezequiel, o que você faz aí… deitado nessa… coisa? E por que você está comendo ‘isso’? Que gosto é esse?”
Ezequiel responde:
“Como teria você sabido de minha mensagem se eu não tivesse comido fezes?”
Li essa questão de Blake para Ezequiel no domingo passado. Não é nada mais longo do que aqui expus.
E fiquei pensando naquilo que com muita freqüência penso —aqui neste site há inclusive textos sobre o tema; um deles é “O Profeta Nu— e que tem a ver com o fato de Deus, não raramente, usar de um tipo de marketing que a “Igreja” jamais aceitaria.
Outro texto deste site que fala do assunto é o “Marketing da Ressurreição”, e nele mostro como até para escolher os testemunhais da Ressurreição, Deus só aprovou gente que o marketing da “igreja” jamais recomendaria.
O profeta chama atenção pelo que ele encarna — mesmo que isto o descarne!
A “Igreja” tenta fazer propaganda daquilo que ela não é — e com certeza não está disposta a ser!
O marketing do profeta é o anti-marketing para a “igreja”.
O profeta tem que comer excremento forçado. A “igreja” esconde que come excremento, e faz propaganda de cereja.
Irmãos, sei que é duro ouvir o que falei, mas quem pode dizer que não é verdade?
Hoje, quando vejo toda essa onda de marketing cristão, fico pensando para quê.
De fato, a Igreja não precisa de Propaganda se ela for um fato, uma realidade, e não uma projeção, um holograma!
Ela não está aqui para ser conhecida. Ela está aqui para fazer Jesus conhecido pelo amor com o qual os irmãos amam-se uns aos outros.
Quem faz o marketing da Igreja é o Espírito, quando cura, restaura, consola, estabelece a vitória da Graça sobre a culpa, e expele demônios ocupando Ele mesmo o coração antes mal-habitado.
Sinais seguem os que crêem… Ou não?
Há uma igreja no Brasil que quase ninguém conhece, e que tem mais de quatro milhões de membros e mais de vinte mil casas de oração.
Essa igreja chegou aí sem marketing. Aliás, lá entre eles isso é coisa do Demo.
Quero dizer que não se deve usar meios de comunicação para pregar o evangelho?
De forma nenhuma!
Estou dizendo é que a “igreja” não usa tais meios para divulgar a Palavra, mas para falar bem de si mesma: seu poder, seu sucesso, sua grandeza, sua capacidade de influenciar na política, sua força espiritual e sua grandeza terrena.
Quando a alma da “igreja” está tão cega assim —que não pode se enxergar—, Deus manda o profeta viver pelado, andar em círculos, usar cinto podre, esconder comida no chão, casar com uma prostituta e perdoá-la sempre, e até comer… fezes humanas, com a graciosa variável de que, quem sabe, dependendo do estômago do profeta, possa haver uma leve troca no cardápio: ao invés de ser …de gente, pode ser… de boi.
Então vem a “igreja” e pergunta a Ezequiel:
“Ei, seu doido! O que você faz aí comendo essa … de boi?”
Isso depois que a conversa em volta não é outra senão esta:
“Agora o cara tá tão doido que tá até comendo … de boi”.
“Entrou numa de andar nu…”
“Casou-se com uma maluca…”
“Você viu o cinto dele?”
“Ih! Que roupas são essas?”
“Tá inventando moda…”
E nem sabem que ali, no ridículo, é onde a Palavra de Deus está!
Moda era tudo que aquilo não era.
Aquilo era o modo como a mensagem estava chamando a atenção.
E para o profeta não era bom. Mas para a mensagem, era ótimo.
Afinal, a resposta de Ezequiel aos que queriam saber de sua loucura era uma só:
“Ando assim e como isto apenas porque vocês só enxergam a … que fazem e são quando vêem alguém comendo… Pois vejam: hoje vocês já estão nela… Amanhã nem mais ‘elazinha’ vocês terão.”
E sempre conclui:
“Hoje ainda é Dia de Salvação!”
Quem não gosta, que não coma.
Mas lembre-se: sem Deus, nesta vida, cada um come o que gosta, e, no fim, é tudo a mesma… coisa!
Os que foram para o cativeiro, que o digam!
Caio
2003