AFINAL, QUAL É A CRISE DA IGREJA EVANGÉLICA?
“Se algum dia conhecemos a Jesus segundo a carne, já, agora, todavia, não o conhecemos desse modo”—Apóstolo Paulo. “O Evangelho não foi provado e julgado falho. Ele foi julgado difícil e portanto permanece não provado até hoje”—Soren Kierkegaard Alguns dizem que “a crise da igreja evangélica é uma crise de conteúdo”, conforme li numa declaração de um “pensador evangélico” recentemente. Ora, se for “evangélico”, não é pensador; e se for pensador, não será mais “evangélico”. Ninguém que pensa, é “evangélico”. Não mais hoje em dia. Nem tampouco ninguém que sente com verdade é “evangélico”. Não mais hoje em dia! Portanto, saibam os “evangélicos”: se pensar, não é “pensador evangélico”; assim como se tiver alma, não será “psicólogo evangélico”. Daí, para mim, a frase “pensador evangélico” ou “psicólogo evangélico” ser uma impossibilidade da mente e da alma. No mesmo texto ao qual antes me referi decretou-se a morte do “movimento evangélico”. Engano! Isto não acontecerá! A “igreja evangélica” não morrerá. Ela já está morta. Todavia, o “movimento evangélico”, saibam todos, não morrerá. Sim, ficará aí… e será o que todas as outras religiões são, mesmo as mais “mortas”; apenas com uma diferença: os evangélicos são os menos sofisticados de todos, à exceção, talvez, dos islâmicos fanáticos. Quem dera a “crise evangélica” fosse tão simples! A questão é que quem não conhece os proponentes dessas coisas e nem sabe o que é “conteúdo” para eles, fica pensando que trata-se de algo denso e sólido. Mas não é. De fato é algo morto já faz tempo, e que tentou ser uma alegria para muitos, mas não foi, posto que não se ancorava na Graça, mas na Teologia. Quando falam em “conteúdo”, conforme o texto ao qual faço aqui referencia, eles evocam a idéia de uma teologia meiga, e que seja bonitinha, palatável, suavemente psicologizada, politicamente correta, socialmente solidária, discreta, pensativa, reflexiva, que evoque a ternura de Deus como Pai e que gere uma ética de etiquetas morais disfarçadas de integridade. Ou seja: os tais “conteúdos” são coisa ainda do jardim da infância da realidade, conforme o Evangelho, posto que na melhor das hipóteses fazem com que o indivíduo seja agradável e saiba se comportar socialmente, para fins de consumo relacional… isso quando tudo está em ordem… Porém, os mesmos “conteúdos”, fazem esses mesmos indivíduos serem completamente “judiciosos”, completamente “teóricos”, profundamente “apenas teo-lógicos”, imensamente “racionais”, ou, quando não são “racionais”, são, entretanto, ainda filhos de uma “mística sistêmica”; ou seja: aprendida, não necessariamente experimentada. Do ponto de vista da existencialidade tais conteúdos não realizam nada, a menos, como já disse, que esteja “tudo bem”. Não liberta da inveja, do orgulho, da vaidade de pensamentos, do espírito faccioso, do direito ao escândalo, da sensualidade adoecida, da espiritualidade livresca, das fobias de alma, da insegurança de ser, da necessidade de parecer ser, de pavonêscas sofisticações, do academicismo vazio, das muitas e muitas reuniões lindas e singelas, porém, cheias de nada… Ou seja: tais “conteúdos”—que se são confessados é porque por eles são “conhecidos”, do contrário, que certeza se teria acerca de sua validade?—não produziram nada nas vidas de seus proponentes senão apenas as coisas por mim acima mencionadas, e que eles sabem muito bem serem verdadeiras. Sim, eles terão que se arrepender de tais “conteúdos”! Esses “conteúdos” são uma bolha de teorias apenas úteis para que um grupo de meninos se encontre com outros meninos e mostrem uns aos outros os seus joguinhos virtuais, pois, de fato, em nada afetam a realidade; coisa essa que eles nem ainda sonham em saber o que é. Sim, tais “conteúdos” são ainda fruto da produção mental de uma tentativa protestante-iluminista, ou, às vezes, de uma busca de experimentar uma espécie de Renascença Cristã. Mas não são nada que se relacione à visceralidade radical do chamado do Evangelho. “Conteúdo” muitas gente tem entre os evangélicos. Mas e daí? Tais “conteúdos” não são vida, são ainda apenas letra; letra bela, bem escrita, às vezes até poética, porém Letra, nada mais que letra… A crise dos evangélicos é bem mais profunda, e, entre outras coisas, inclui também esses “conteúdos” que alguns dizem que é o que falta na igreja. Deus me livre! Se a igreja for visitada pelos “conteúdos” deles teremos apenas um monte de frouxos, profetas de si mesmos, reis da média, profundamente convenientes, educadamente traiçoeiros. Ora, de fato, os tais “conteúdos” são parte da crise que eles dizem existir (e com que atraso enxergam o óbvio, antigo e já fóssil!). Conquanto haja muitos para os quais a tal falta de “conteúdo” possa ainda ser algo relevante, há, todavia, um monte de gente com tais “conteúdos” entre os evangélicos, porém isso não faz diferença alguma, assim como nunca fez nenhuma diferença em qualquer outro tempo, visto que tais “conteúdos” são apenas o “álibi eterno” por eles usados para criticar sem se aventurarem a dizer: “Venham! Vamos juntos! Vamos aprender juntos! Vamos ser irmãos uns dos outros! Vamos confessar nossos pecados, invejas, doenças e maldades piedosas, e, juntos, vamos iniciar a jornada do Caminho da Vida, andando sem ter nada do que se gloriar senão na Cruz de Cristo!” Não! Eles jamais farão isto. Eles apenas assistirão. Opinarão. Farão analises. Masturbar-se-ão com suas próprias repetidas e copiadas idéias. E nada acontecerá. Posto que não têm coragem de nem mesmo se encarar, quanto mais a coragem de botar a cara para fora, para apanhar pela fé, e para viver a realidade do Conhecimento de Deus não como “psicologia de retiro espiritual”, mas como vida na esquina, nas ruelas, no meio das mais agudas angustias humanas, nas perdas e nos ganhos, nos lutos, nas alegrias, nos céus e no abismo. Somente quando se fica sabendo na experiência da Graça de Deus que “as trevas e a luz são a mesma coisa” é que se conhece de fato a Deus como mistério. Ora, o fruto de tal conhecimento é paz! Eles ainda não entenderam que parte da maldição é ainda essa “herança grega” do engano de pensarmos que “conteúdos” são coisas a serem aprendidas com a cabeça, ou com a periferia do coração. “Pensar os conteúdos” é outra frase feita que eles adoram! Ora, o conteúdo da Palavra não é a mesma coisa que eles chamam de “conteúdo”. A real crise evangélica—e aí se pode botar nesse saco tudo e todos que não são católicos—é a crise do total não conhecimento experiencial da Graça de Deus. Sim, fala-se em Graça. Mas apenas “fala-se”. E, quando se fala, fala-se de algo que a maioria nem sabe o que é, a não ser pela definição filológico-teológica da palavra. A Graça de Deus não é uma doutrina e nem é um discurso acerca de um “Deus melhorzinho”. A Graça é melhor que a vida. E a Graça só pode ser conhecida como experiência da vida como transcendência e imanência real em Deus pela fé, num salto de entrega total que a maioria não tem coragem de dar. Ou seja: o sujeito que crê, experimenta…! Conforme a linguagem chocante de Marcos 16… “certos sinais seguem…” Em outras palavras: não é blá, blá, blá… É vida de fé e coragem, é risco, é entrega, é confiança, e é alegria, contentamento e paz no Espírito Santo. Na Graça de Deus não se fica sabendo acerca de Deus, mas se conhece a Deus. Ora, é essa falta de experiência do conhecimento real de Deus em fé, na Graça, e conforme o espírito do Evangelho, aquilo que asfixiou a igreja evangélica, e matou a sua alma. De tal modo que ela existirá como zumbi… e só não morrerá porque já morreu. A fé em Jesus, todavia, segue firme e inabalável, posto que quando os odres velhos se derramam… e para nada mais aproveitam… nem por isso a fonte do vinho novo cessa de brotar, posto que a Videira Verdadeira não deixa jamais de produzir fruto mediante os ramos que permanecem nela, vivendo em total entrega e confiança, sabendo que sem que se esteja ligado a Jesus, nada se pode fazer. Muitos menos “produzir conteúdos”. A igreja evangélica já foi um problema para mim. Hoje, sinceramente, não é mais. Creio que muitos evangélicos ainda se converterão ao Evangelho da Graça de Deus, e creio que muitos ainda experimentarão a vida abundante e confiante que há em Jesus. Mas sei que isto só acontecerá quando eles desistirem de tudo, e quando abandonarem a pretensão de definir “conteúdos”, ou de darem uma açucarada em Deus para fins de melhor palatabilidade. Todavia, só saberão do que eu estou aqui falando no dia em que experimentarem o benefício da paz e da pacificação total do coração mediante a confiança que é fruto do conhecimento real de Deus, e não de sua projeção teológica. Quem entender, entenda! Caio