A RESSURREIÇÃO E A ÉTICA HUMANA
I Co 15—leia todo o capítulo.
Paulo disse que sem a ressurreição de Jesus é vã a nossa pregação e vã a nossa fé. Além disso, afirmou ele, pregando a ressurreição, estamos dando um testemunho mentiroso acerca do que Deus fez—se é o caso de Jesus nunca ter ressuscitado—; e conclui dizendo que sem essa esperança o existir cristão remeteria o ser para a mais infeliz de todas as vidas.
A fé na ressurreição quando desaparece produz a pior de todas as experiências de existência: a do ser que não tem mais nenhum engano de transcendência que o faça suportar o absurdo da vida!
Nesse caso, o segundo estado, também, torna-se pior do que o primeiro.
O que sobra se Cristo não ressuscitou?
Nada! mas para os esperançosos aqui vai o melhor cenário:
1. Uma crença num poder supremo.
Mas tal poder não merece ser objeto de nenhuma preocupação. Afinal, quem é Ele para demandar amor se jamais demonstrou Seu amor para conosco? Um Deus que não tenha se encarnado, morrido e ressuscitado pela consciência de culpa dos humanos e pela redenção da natureza, não tem o que dizer aos humanos—os humanos é que têm o que dizer a ele.
2. Uma total falta de referencia ética para atribuir valor a qualquer que seja o ato.
Se Cristo não ressuscitou, então não há nada além da história e nem há nenhuma esperança de redenção para a natureza. O melhor que os humanos podem fazer é diminuir o risco de extinção mediante a pratica de leis e o uso de tecnologias menos danosas ao meio ambiente.
No mais, não há razões além das pragmáticas para se fazer qualquer coisa pela Terra.
Qualquer ato de utilitarismo natural—atos predatórios—não pode ser julgado.
Não há referencias que sejam diferentes das de mergulhadores que estando definitivamente condenados à morte em três horas, dentro de uma bolha, a mais de quatro mil metros de profundidade, começam a matar quem usa mais oxigênio que os demais.
Trata-se da aplicação do tempo de sobrevida como único critério ético.
O que vale na Terra hoje é menos que isto.
Um exemplo disso só pode ser entendido pela seguinte caricatura: o criminalização do usuário de drogas.
Há propagandas sendo veiculadas na televisão que tratam o assunto das drogas transferindo a responsabilidade pela violência para o consumidor.
Bonita propaganda.
Belo conceito.
Mas nada além de belo.
Não suportaria dois argumentos: o primeiro é que o dependente é dependente. O segundo é que a se seguir essa lógica não se pode mais ligar o carro, pois tal ato desencadeia guerra, queima da camada de ozônio, aquece a terra e apressa o fim.
Aplicando-se a mesma lógica, a culpa pela guerra no Iraque e pelo desgelo polar é sua.
Não use mais carro, avião ou qualquer outro meio de transporte.
Não acenda mais a luz.
Não tenha mais geladeira, nem micro-ondas e nem beba coca-cola.
Não assista mais televisão e não respire muito—pode acabar o ar antes da hora!
Sem que Cristo tenha ressuscitado dentre os mortos não há qualquer referencia ética para qualquer cuidado amoroso para com nada na criação.
Comamos, bebamos, transemos à vontade, tomemos todas, possuamos tudo, cometamos o que desejarmos—afinal, tudo é a mesma coisa: é apenas uma questão de tempo e o ar vai acabar mesmo.
O usuário é sempre o culpado. Mas quem não é usuário da morte num mundo que jaz no maligno?
Se pegarmos qualquer que seja produto de consumo ou objeto—ou mesmo idéia—e a levarmos até as últimas conseqüências, nenhuma dessas coisas deixa de ter sua origem naquilo que chamamos de fruto do pecado.
Digo: não a coisa em si. Mas seu uso passa por todas as mãos e a chegada do produto limpo e acabado em nossas mãos, não poupou inúmeras outras mãos que se sujaram para que a sua continue supostamente limpa.
A cadeia da contravenção costuma punir apenas a parte mais frágil e óbvia na escala de diluição de responsabilidades.
Isto se Cristo não ressuscitou!
Para muita gente Cristo não ressuscitou mesmo!
Então, vivamos com as conseqüências, macha e bravamente. Sem resmungos e sem “ais”.
Afinal, se Cristo não ressuscitou, não há o que perder, não há o que esperar, e não há porque viver—no máximo pode-se auto-impor a ilusão do existir.
Sem ressurreição o que sobra é a lei da entropia: tudo vai passar e não haverá Palavra de Deus que permaneça para sempre.
Concluir assim é também mais que lógico.
Afinal, qualquer um que fosse esse tipo de Deus nesse mundo–a tal força superior–, não saberia que era Deus—portanto, não existindo para si mesmo, não existe para mais ninguém.
A Boa Nova, porém, assim diz:
Aquele que crê em mim, ainda que morra viverá; e todo aquele que vive e crê em mim, não morrerá eternamente—disse o Senhor da Ressurreição.
Quem não crer, se vire.
Quem crê tem a vida eterna.
E na Terra só dá para viver se se tem a vida eterna. Do contrário, temos que admitir que seria insuportável. Pelo menos para quem já não tem ilusões.
É só o que tenho a dizer.
Caio Fábio
Escrito em 2003