ACERCA DOS DONS ESPIRITUAIS…

 

—–Original Message—–

From: Orlando

To: [email protected]

Sent: quarta-feira, 6 de agosto de 2003

Subject: Acerca dos dons espirituais…

 

 

 

Pastor Caio Fabio,


 

Biblicamente, como podemos entender o termo profecia, e qual a diferença dessa utilizada na igreja?

Por que o dom de Línguas é tão enfatizado entre os cristãos se na escala apresentada por Paulo esse dom não é o primeiro?

Aproveitando ainda de sua paciência, gostaria que o senhor explicasse se há algum sentido bíblico para algumas nomenclaturas usadas nas igrejas, como “liberação de perdão”, “quebra de maldições”, “culto de libertação”, etc.

Obrigado,

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Resposta:

 

 

 

Querido Orlando: Paz!


 

Vamos ao assunto, ou melhor, às questões:

1. A profecia no Velho Testamento era tudo o que fosse profético: poderia ser algo que se anunciasse como profecia (falando do futuro); poderia ser algo que se anunciasse como Palavra de Deus ao momento (como na maior parte das falas dos profetas); poderia ser algo que carregasse uma profecia, mas que só seria percebida como tal, bem depois (por exemplo, as profecias dos Salmos).

 

No Novo Testamento a profecia carregava essas três naturezas; porém, tanto se expressava com outra linguagem profética — muito mais intimista —, como também, com outras designações e aplicativos, mais íntimos também. As designações: consolação, exortação e edificação (sendo que a maior parte da linguagem e do aplicativo vinha carregada do espírito da profecia, que é o testemunho de Jesus). Os aplicativos quase sempre se relacionavam a uma igreja, a indivíduos e, em alguns casos, à nação, ao mundo ou à História.

 

O Apocalipse fornece a linguagem profética que prevalecia naqueles dias, num mundo dominado por Roma, onde a comunicação profética acontecia por meios enigmáticos e simbólicos.

2. O dom de línguas é um pirulito da Graça. Paulo não só o põe no plano das edificações absolutamente pessoais, como também proíbe seu exercício público, caso ele não se manifeste interpretável; senão, diz ele, vira confusão e estimulo total à não-razão.

 

O dom de línguas sempre teve a tendência de ser feito maior do que ele é. Razões:

 

a) ele carrega mistério – e que menino não gosta de um misteriozinho?

 

b) ele é para edificação pessoal — e quem não gosta, até na carne, de expressar a todos o quanto se está sendo edificado pessoalmente?

 

c) quando o movimento pentecostal estabeleceu que o falar em línguas era “o sinal” de que alguém havia sido “revestido de poder”, então, quem queria demonstrar que havia recebido a “bênção”, tinha que falar em línguas; então, muita gente, pra não ficar “de fora”, aprendeu a falar. Daí você até saber onde a pessoa “aprendeu a língua” apenas por ouvir a construção de língua que ela apresenta. Às vezes posso dizer até a “denominação”.


Quero dizer o quê, com isso? Que não creio? Não! Digo apenas que, conquanto eu creia na contemporaneidade dos dons espirituais, mais de 90% do que “ouço” e me ponho a discernir são línguas “aprendidas”, que não nasceram de dentro para fora, pelo genuíno derramar do Espírito.


3. Liberação de perdão, quebra de maldições e culto de libertação são, todos, modas recentes. O culto de libertação é mais antigo no Brasil. Tem uns 80 anos, mas começou muito discretamente, não era esse mercado de hoje. As demais nasceram quando eu já estava na estrada como pastor fazia tempo. No Brasil, posso até dizer quem, onde e quando essas “grifes” começaram.

 

Creio que libertação não pode ter hora marcada, pois não depende de ninguém pra acontecer. Se marcar hora, é apenas porque tá na hora de passar a sacolinha, e não há hora melhor, que num culto de cura e libertação — especialmente quando se “propõe” uma barganha que relacione ambas as coisas ao ato de reconhecer quem é Deus, dando uma grana para o “Deus” do lugar.

As outras duas modas têm históricos diferentes. A liberação do perdão é extra-ordinariamente  idiota. Supõe que tal poder esteja sob o arbítrio humano; é uma versão vaticana e católica dos perdões concedidos pelos homens em nome de Deus. E a quebra de maldições devolve ao diabo o poder que ele já não tem, que lhe foi arrancado na Cruz.


E mais: o diabo adora se sentir o responsável por tudo. Enquanto a gente o responsabiliza, a gente não se enxerga; e enquanto a gente não se enxerga, a gente não é curado… E assim segue a humanidade… Repetindo a mesma cultura, cultuando as doenças dos pais e sempre atribuindo àquilo que é mais psicocultural que espiritualmente diabólico, o valor de um carma imposto pelo diabo.

A maioria das maldições hereditárias são ou males genéticos — digo, constitutivos —, ou são males do sistema cultural-familiar; e só serão “quebrados” num processo de desmobilização dos agentes culturais do sistema, enxergando as coisas como elas são, dando-lhes nomes apropriados, retirando-os da engrenagem e quebrando o fluxo daquela prática em nossas próprias vidas, a fim de que ela não siga seu malévolo caminho – não somente nos destruindo, mas ainda atingindo os que geramos.

A liberação de perdão é filha da ignorância de quem não entendeu ainda Mateus 5 e 18 e, menos ainda, 2ª Coríntios 2. É preciso não entender mesmo os desígnios de Satanás, pra poder oferecer a ele um prato tão cheio.

 

Aqui no site, se você navegar, achará material sobre o assunto, nunca sob tais nomenclaturas, mas dentro de outras discussões.

Espero que tenha sido útil.

 

 

 

 

Nele,



Caio

 (Escrito em 2003)