CAIO, POR QUE VOCÊ NÃO FALA EM SANTIDADE?



—–Original Message—– From: CAIO, O QUE É SANTIDADE? Sent: sexta-feira, 14 de maio de 2004 12:02 To: [email protected] Subject: CAIO, POR QUE VOCÊ NÃO FALA EM SANTIDADE? Querido Caio, Acompanho-te há tempos e com muito carinho. Ocorre que hoje me deu um estalo: “Ué, o Caio não fala de santidade!” E aí? O papo da santidade ficou na Lei? O Cirillo, David Quinlan, Davi Silva etc, estão viajando na maionese? Aguardo teu precioso retorno. Abraço forte, Ricardo, um paulista de 34 anos, formado em filosofia, que há nove meses está tentando seguir a Deus em “verdade verdadeira”, sem comprar pacotes pré-fabricados ou loucuras ditas pentecostais. ____________________________________________________________________________ Resposta: Meu amado amigo no Senhor: Mas vós sois dele, em Cristo Jesus, o qual para nós foi feito por Deus sabedoria, e justiça, e santificação, e redenção; para que, como está escrito: Aquele que se gloria, glorie-se no Senhor. Inicialmente desejo dizer que não sei o que esses amados irmãos estão ensinando. Portanto, aqui, não respondo a eles, mas a você; e não quero que você ou ninguém leia isto como uma palavra minha a eles. Isto dito, quero responder apenas a você, e a quem quer que se interesse pela minha opinião sobre a questão. Tenho mais de 113 livros publicados. Em dezenas deles trato do assunto no espírito do que aqui lhe direi, de modo mais que resumido. Afinal, é só uma carta, não um tratado. Pegue sua concordância bíblia e procure pela palavra “santos”, no Novo Testamento, e você verá que ela não ocorre como um esforço humano, mas como um novo estado no qual se foi posto na Graça; e que acontece em duas perspectivas: a primeira se relaciona ao que já está feito; ou seja: em Cristo eu sou santo, tanto quanto sou justificado e salvo. A segunda perspectiva é aquela que faz a santidade ser o próprio crescimento do ser na Graça. Assim, santidade é saúde e é pacificação na Graça, conforme o entendimento que se obtém pela fé de que o que sou em Cristo, é o que vale; isto para que eu posso ir sendo…à medida em que cresço. Portanto, santificação é o apelido do crescimento da consciência humana na Graça. Jesus não desenvolveu o tema como tema; já prestou atenção? E por que será? Não seria Ele alguém preocupado com a santificação? É claro que tudo o que Jesus fez e ensinou é o caminho do santo. Mas Jesus não usou a palavra “santificação” em relação aos discípulos. Por que será? A mim me parece apenas uma coisa: Jesus não via a santificação como nós a vemos, religiosamente falando. Para Ele santificação era o caminho do amor e da misericórdia; e não uma lista de coisas a se fazer ou deixar de fazer. Santo, para Jesus, é aquele que não julga o próximo; que anda mais de uma milha com o inimigo; que dá a capa para cobrir o frio do adversário; que não passa ao largo quando vê um homem caído na estrada; que dá água com amor aos irmãos… como se fossem profetas ou o próprio Jesus quem bebesse; que trata o diferente, o estranho, como se fosse Jesus; que veste o nu, abriga o órfão, acolhe o desamparado, abre a alma ao faminto, e não se esconde seu semelhante. Para Jesus, o santo não fala de santidade, mas de vida. Sim, para ele, o santo é quem crê; é quem busca a verdade, a justiça e a humildade. Santidade, para Jesus, é simplicidade; é se satisfazer com “uma só coisa”; é gratidão e contentamento. E, conforme Jesus, o santo é alguém livre para ir onde quer, para amar a quem ninguém ama, para transgredir a Lei a fim de tirar…mesmo que seja um boi… do buraco no qual caiu, ainda que o dia seja sábado. Nossa visão de santificação é pagã, é farisaica, e cheia de justiça própria. Sim, o que chamamos de santificação é exatamente aquilo que os fariseus ensinavam: ser zeloso da lei. No texto de Paulo que citei no início está claro que “fomos feitos” sábios, justos e santos “em Cristo”. E por que? Ora, Paulo diz: “Para aquele que se glorie, glorie-se no Senhor”. Santificação que não se enxergue como algo realizado na Cruz leva o suposto santo ao caminho da arrogância e da neurose. Portanto, não falo a palavra “santificação” pelas mesmas razões que o Evangelho não a menciona: a audiência entende errado! Santificação é maturidade; é não se escandalizar com mais nada nesta vida; é liberdade para viver todas as coisas lícitas tendo o discernimento de saber o que convém e o que edifica. Santificação é ter os olhos limpos, e, assim, considerar pura todas as coisas. O santo não costuma falar em santificação, mas em Graça e Misericórdia. Quem fala muito em santificação como uma conquista do indivíduo, em geral, está falando de suas próprias angustias e lutas. Quem fala na Graça, fala em santificação; pois é somente na Graça que somos santos e santificados. Mas como a letra mata, no meio evangélico a “santificação” é o nome de nossa piedosa presunção; e, psicologicamente, é o nome de nosso surto neurótico de justiça própria—filha de um coração que não repousou na Graça—; e também é paranóia, que é o resultado de uma alma que teme, e que não abraçou para si o perfeito amor que lança fora o medo. Então, meu amado, quando você me ler, saiba, quando falo da Graça de Deus conforme o Evangelho, estou falando de tudo. Para mim não existe uma coisa sem a outra. Não existe a “Divisão dos Santificados”. O Reino de Deus não é uma burocracia estatal, e a Graça de Deus não conhece fronteiras em nós. Só para terminar, eu diria o seguinte: O santo viverá pela fé. Ou seja: em confiança não em si, mas na Graça. E toda conquista interior que lhe aconteça, não é mérito, mas Graça de Deus sobre ele; e sobre tais conquista ele não fala, visto que se são verdadeiras, elas serão percebidas pelo fruto da vida, em amor e misericórdia. Enquanto a santificação for uma doutrina moral, ela será a maior fabrica de neuróticos da religião, como esses dois mil anos de história cristã já nos mostraram. Sobre as loucuras pentecostais quero dizer algo. Realmente o ambiente pentecostal é extremante favorecedor de muitas doenças de alma, pois é um ambiente sem parâmetros, e onde o que qualquer maluco sente, se falado em nome do Espírito, passa como coisa de Deus; visto que quase ninguém olha para os conteúdos, mas apenas para os clichês. Além disso, o dês-compromisso da liderança com a Palavra, sempre ávida por novidades, abre o caminho para que as loucuras de circo-manicômio de instale como devoção. Todavia, o mundo das igrejas históricas e reformadas nem sempre anda muito melhor. Há muito legalismo judicioso no meio reformado. Tudo é mais “elegante”, mas a loucura das vaidades, do poder, das correções doutrinárias, e da pureza pessoal arrogante, estão lá presentes; e com resultados devastadores não para a mente—como é no meio pentecostal, de onde são egressos a maior parte dos internados nos Pineis da vida—, mas para a alma-sentir; pois as doutrinas fazem muito mal à alma, só que num plano onde as aparências não são loucas, mas o sentir é frio, e, por vezes, até perverso. Espero ter me feito compreender. Receba meu carinho e estímulo para que prossiga o caminho da verdade. Nele, em quem somos santos, embora saibamos que é somente Nele, Caio 24/02/2005