COPACABANA E EU
Vi o Atlântico a primeira vez na vida aos dez anos de idade.
Mar para mim era o Rio Amazonas e o Rio Negro era o resto de tudo o que
fosse o mar.
Havíamos sido abatidos em pleno vôo…
Éramos uma família maravilhosa e vivíamos uma vida gostosa e feliz.
De repente papai se apaixona.
Mamãe quase morre de sofrer.
Anos de silêncio entre eles…
Mamãe fica grávida por acaso e acidente.
Suely quebra o braço e em Manaus não tinha jeito.
A Revolução Militar aconteceu…
Papai tinha negócios com o então governador.
E uma das maiores bancas de advocacia da cidade.
Fazia parte de outros empreendimentos, um deles uma minerarão de ouro em
Parauari, da qual ele era sócio de um barbadiano chamado Adriano—já
falecido.
A Revolução o pegou pela política—ele era sócio do governador em outro
negócio—, e também o levou pela via da traição: oito pessoas a ele ligadas e
amigas, a fim de se livrarem de problemas potenciais com a ditadura, o
entregaram como sendo culpado de tudo o que haviam feito, por uma única
razão: o nome dele dava audiência e ele não era político.
Foi traído de todos os lados.
Enquanto isso…tudo aquilo o mais estava acontecendo…a família, o
casamento, o braço quebrado, a amante, a paixão, a dor, a vergonha, o ódio,
um inquérito militar, a vontade de sumir…Copacabana…
Assim, em 1964 eu estava olhando o mar pela primeira vez de uma
perspectiva do Posto seis, em Copacabana.
Uma bola Pelé em baixo do braço, um suor frio no rosto, as narinas invadidas
pela maresia, uma saudade maior do Amazonas que o Atlântico consegue
separar o Brasil da África.
Copacabana foi luta, solidão, o Pavão-Pavãozinho desabando com a chuva, a
Suely sofrendo com o braço, o Luiz engordando, a mamãe gemendo de dor
na alma e tendo que cuidar de Aninha, recém nascida. E papai…bem…papai
era um capítulo à parte.
Separou-se da paixão, abraçou a solidão, botou a disposição de matar no
coração e ficou sem saber se virava assassino ou suicida.
Os olhos de morte diziam tudo…
Copacabana…
O pai de um amigo meu pulou da janela…uma turca maluca furava as minhas
bolas quando caíam para dentro do quintal dela…os meninos implicavam com
o meu sotaque e eu metia a mão neles…descobri que meu pai usava muletas,
os amigos cariocas me disseram…vi papai quase dar uma surra no pai de meu
melhor amigo porque o cara era o major do exercito que o humilhara em
Manaus…ninguém sabia que a vida os reencontraria pela minha amizade com
o filho dele…as calçadas eram estreitas…muitas fezes no chão…tristeza…muita
saudade do Amazonas…vontade de morrer…comecei a pedir a Deus para me
fazer voar…quase pulei pela janela num ataque de sonambulismo—imaginei
que estava competindo na piscina do Botafogo…mas era o décimo andar de
um edifício.
Copacabana…Niterói…Manaus.
Cinco anos depois lá estava eu de volta a Copacabana.
Amigos, meninas, mulheres, casos, muito juijtsu, briga de rua, loucura,
amizades, inimizades, reconciliações, um pedido de casamento—de uma moça
bem mais velha do que eu, queria casar com aquela criança: eu…era a criança.
Loucuras pelas ruas de Copacabana.
Fuga de Copacabana…amigos em dificuldades…volta súbita para Manaus.
Manaus…Niterói…o país todo…o mundo…os Estados Unidos…Niterói…o
mundo acabou…Estados Unidos…o mundo acabou de
novo…Niterói…Copacabana.
Aqui estou eu…aos 48 anos…em Copacabana!
Estou sendo reeducado nas afeições, nas emoções, nas lembranças, nas
esperanças, nas saudades, nas certezas, no mal e no bom, na paz e na
nostalgia, no barulho de fora e no silencio de dentro…na Graça.
E pensar que durante os anos que morei aqui em Rio-Niterói eu evitava até
passar por Copacabana…
Agora estou aqui…sabendo que todas as Copacabanas cooperam para o bem
daqueles que amam a Deus.
Minha família sabe disso…
Copacabana é uma estação da vida que se repete num espiral horizontal
chamado de história, mas que também trás revelação.
Copacabana faz parte…
Será que volto para a Floresta?
Quem sabe!?
Ou para onde irei?
Será com Jesus!
Caio Fábio