Dedico o novo ano à minha mulher, Adriana, aos meus e nossos filhos; aos meus e nossos netos, aos filhos dela que são meus, aos meus filhos que são dela; e aos nossos netos, que, sendo meus, não são mais meus do que dela!
Meus anos… 1955-2006!
Anos eternos, imensos, infindáveis, nos quais cabia o mundo todo, e maior ainda: todas as vontades de uma vida! — eu tinha até sete anos!
Anos grandes, demorados, inacabáveis, arrastados, nos quais tudo o que cabia, não valia, nem as vontades sem razão! — eu tinha entre sete e dez anos!
Anos aflitos, entrevados, medrosos, neuróticos, semi-órfãos, feitos de oração de pânico! — eu tinha entre dez e treze anos!
Anos alegres, felizes, malandros, redondos de bola, cheios de sucos de paquera, intensos como uma cachoeira! — eu tinha entre treze e quinze anos!
Anos sombrios, angustiados, desejosos, exploradores, aventureiros, sem medo de nada, com vontades estranhas de bater, de agredir, de beijar e deixar! — eu tinha entre quinze e dezessete anos!
Anos de contorções de dor, de cinismos mortais, de desinteresse focado, de suicídio apaixonado, de amores jamais amados, de sonhos desconhecidos, desconhecidos como o “Novo Mundo” era há quinhentos anos! — eu tinha dezoito anos!
Anos de paixão e medo; de alegria e angustia; de paz e de dever; de serviço e de assombro; de missão e de susto; de Deus e do diabo; de santos e demônios; de pregação e de blasfêmias de demônios; de curas e de velórios; de graça e de exposição à desgraça! — eu tinha entre dezoito e vinte e seis anos!
Anos de certeza, de convicção, de missão, de vontade de mudar a História, de obsessão santa, amor pela igreja como amor pela esposa, de ardência profética na alma! — eu tinha entre vinte e sete e trinta e três anos!
Anos de extrema atividade. Anos curtos como meses, rápidos como fevereiro, e que só seriam mais próprios de cada um deles fosse longo como um período bi-sexto! — eu tinha entre trinta e três e quarenta anos!
Anos que começaram terminados, que iniciavam no fim, que chegavam já tendo ido, que não ofereciam espaço e tempo para tanta coisa, que eram anos incapazes de conter os planos! — eu tinha entre quarenta e mais três anos…
Ano de morrer… Ano de virar fantasma… Ano de ver seu próprio funeral… Ano de ver a reação dos amigos ante uma herança sem testamento deixado… Ano de desconhecer a todos os que se conhecia… Ano de ira, de vingança do mal, de humilhação fatal, de alegria dos vampiros…! — eu tinha quarenta e cinco anos!
Anos de choro, de depressão, de pânico, de banzo, de raiva, de frustração, de arrependimento, de tristeza maior que o peito, de dor que já nem dói, de sustos para além do medo, de ar seco e cristalizado, de vento sufocante, de sol apenas quente, de lua sem nada além de um luar sem voz… — eu tinha quarenta e cinco e mais dois anos…
Anos de gemido, de desejo de desejar, de vontade de querer, de animo desanimado, de obrigação com a vida, de amor que se ergue sem emoção, de submissão da consciência ao instinto do animal acuado e agressivo… — anos de reinício mais difícil do que aquele no qual se decide mudar uma montanha de lugar! — eu tinha quarenta e seis e mais dois anos…!
Ano de luto, de vazio, de buraco do tamanho do Lukas, de sepultura anacrônica, de lágrimas sem poder de contar a dor, de choro, choro, choro; sem vela, sem fita amarela, sem samba — somente o Réquiem de meu filho canguru, bichinho de minha bolsa de marsupial — eu tinha 49 anos e doze dias de vida!
Anos 126 salmos. Anos de salmos 126. Anos de promessas. Anos de verdade feita vida. Anos de Jó feliz. Anos de gratidão. Anos de compensação. Anos de Adriana. Anos de paga com alegria pelos saques da dor. Anos do Fim que começa o mundo; o meu pelo menos. Anos de esperança em meio ao caos. Anos de muros erguidos na terra dos escombros. Anos de fé maior que qualquer outra em mim. Anos de confiança. Anos de gratidão. Anos nos quais as memórias das coisas antigas se foram… Anos bons!
Anos! 52! Não são muitos. Não são poucos. Porém, muito mais que muitos e poucos. São os anos de minha vida. Vida milenar na intensidade de crer, buscar, se dar, viver, sentir, doer, chorar, sofrer, amar, se entregar ao amor, não temer nenhuma dor, não fugir de nenhuma emoção, não temer nenhum trem, pois, o seu, você já sabe: não sai sem você! — ano Hoje!
Ano que vem! Ano que vem? Vem que ano? Vem o ano de Deus, vem o ano do amor, da dor, da alegria, das lágrimas, dos prazeres, dos deveres, dos azares, das benções que mudam tudo; das manhãs impossíveis e das noites longas; das manhãs mais que possíveis e das noites curtas; das conquistas que vêm com perdas, das perdas que vêm com as conquistas; das vitórias perdidas, das derrotas ganhadas, das ignorâncias sábias, das sabedorias inúteis, das veredas maiores que as certezas, das oportunidades que só são alegres se forem vividas pela fé — sem medo, sem planos fixos, sem neuroses do passado, sem ufanias infantis, sem alegrias pueris, sem cem, e cem vezes sem “sem algum”… Tudo é. Tudo tem. Tudo sem cem, pois limita; e sem “sem”, pois não realiza!
Ano de Deus! Ano de confiança no cuidado eterno! Ano no qual só cabe o que faz bem, pois, no ano de quem ama, mesmo o que dói, não sabe fazer mal — posto que essa é a Promessa da Palavra da Vida! Esse é da fé o Quintal!
Feliz 2007!
Este é o Novo Ano que o Senhor fez; alegremo-nos e regozijemo-nos nele!
Caio