LIBERAÇÃO DAS DROGAS: SIM? NÃO? TALVEZ?
—–Original Message—–
From: Pastor Marcello Cunha
Sent: quarta-feira, 2 de junho de 2004 00:54
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Subject: LIBERAÇÃO DAS DROGAS: SIM? NÃO? TALVEZ?
Olá Pastor Amado!
O que o senhor acha da idéia de liberação do uso das drogas?
Algumas vezes, penso que seria bom tirar a placa de “Banho proibido”, e colocar no lugar uma “Cuidado! Mar perigoso!”.
Creio que a verdade pode libertar. E a verdade é que o mar é perigoso, e não que o mar é proibido! Essa é a mais pura verdade, pra mim.
Por outro lado, lembro que o Velho Testamento contém várias afirmações que parecem muito com proibições, tais como: comer carne de porco, certas questões higiênicas…
Digo “parece”, porque acho que pode haver uma diferença sutil entre “Não farás”, e “Está proibido”.
Entre:
“Não comerás carne de porco”.
e:
“É proibido comer carne de porco”.
Ora, é certo que, por falta de desenvolvimento de “saúde pública”, medicina ou algo do gênero, Deus precisava poupar seu povo de algumas coisas nocivas, que eles ainda não tinham como enfrentar, pelo menos com alguma segurança. Se não, como explicar que antes era proibido e hoje não é?
Penso que a Graça veio acender a luz!
E sendo assim, não é mais necessário alguns terrores da lei. A luz não funciona como uma “seta de neôn” que aponta para o buraco! A luz expõe o buraco. A pessoa chega perto…Olha a profundidade… Alguns, antipatizados, passam longe. Outros sentem-se movidos por algum tipo de curiosidade “indiana-jonesiana” de se lançar buraco a dentro, pois carrega uma sede, pra qual ainda não descobriu água.
Sem falar que o diabo ainda vende hoje a “idéia do poder”.
Não falo poder “energia” só, mas poder do verbo “poder”:
“Você “pode” se jogar desse precipício. Por que não?”
E ainda promove visões virtualísticas:
“Virão anjos pra te segurar! Vai ser o maior barato!”
Como o Estado pode lidar melhor com esse mal?
Qual é o menos pior para as pessoas? Cair no buraco no meio da noite, mergulhar suicidamente de cabeça, explorá-lo “anarquicamente” com equipamentos de última geração?
Particularmente, não vejo qual lugar pode ser mais buracalmente profundo que o mundo que nascemos…E não descobri qual lugar posso estar distante de Deus!
Se faço a minha cama no buraco marinho, lá está Ele!
Deus é a casa do Universo! Deus é minha casa! Eu encontrei os Seus altares!
Mas nem todos são libertos pela verdade, e podem viver uma vida que é marcada pela ausência de lei, pois é fruto da Graça.
Assim vive uma boa parte da sociedade humana.
Qual a melhor forma do Estado tratá-los?
Proibir, esclarecer, proibir-esclarecendo?
O Tráfico de Drogas ou a venda legal de drogas, pra mim, sinceramente tem a mesma essência.
Afinal, quantas drogas-porcarias legais são injetadas na vida “simples-rica” dos homens – por indivíduos capitalistas, cultivando um consumismo dependente? Pensando bem, isso não é muito “legal”, não é?
O senhor concorda?
Nele em Quem fui TRAGADO por sua vida, BASEADO em sua Rocha,
INALADO como bom perfume,
e INJETADO na Graça, para sempre.
Um beijo,
Marcello Cunha
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Resposta:
Meu amado amigo: Paz e Bem!
Os criminosos precisam de lei, diz Paulo. Do contrário, quem protegerá o inocente?
Todavia, essa “lei” que os homens necessitam é apenas a lei que regulamenta as relações humanas. Assim, precisamos da lei a fim de definir os limites de uns em relação aos demais membros da sociedade. Essa lei precisa existir.
No entanto, quando se trata de drogas e coisas semelhantes, a “lei proibitiva” é algo que passa os seus próprios limites, visto que se põe num papel de regulamentadora das pulsões humanas em relação ao próprio indivíduo.
É por isto que a Lei diz “não matarás”, mas não diz “não cometas suicídio”.
É um direito divino dado ao homem a decisão de seu próprio modo de viver e morrer, desde que por tal decisão ninguém mais seja levado junto, e desde que a escolha de um indivíduo não mate o outro como ato deliberado.
Esta é a Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal.
Ora, não havia um guarda na frente da Árvore a fim de proibir que se comesse de seu fruto. Todavia, existia um apelo à consciência, e que vinha de uma advertência: “No dia em que dela comeres, morrendo, morrerás”.
Por isto, repito, a sociedade precisa de leis justas que regulamentem as relações humanas. Mas quando tais leis desejam ser “norma existencial”, sempre acontece o que Paulo disse: A Lei toma ocasião da fragilidade da carne, e se avulta como culpa que só faz aumentar a transgressão.
Esta, para mim, é a raiz da questão. Leis sociais são úteis. Leis existenciais são pura desgraça, pois realizam exatamente o que pretendem coibir.
Bem, isto é fato no plano da psicologia e das dinâmicas do ser em relação às leis que pretendem regular pulsões, fazendo apenas com elas se transformem em compulsões, e estas em transgressões cada vez maiores.
Além disso, como não sou um “teórico” do assunto, mas alguém que viveu entre e com pessoas que se drogavam—sem falar que eu mesmo tive minha “dose” grande de uso de variadas drogas na juventude—, fica para mim óbvio que qualquer lei anti-drogas apenas aumenta o desejo de consumi-las, e cria uma rede de corrupção horrorosa…em nome do “combate às drogas”.
Ora, o que temos hoje de mal como resultado de se tentar combater com leis e repressão o uso de drogas é um mal infinitamente maior do que o mal que se pretende combater.
Daí, toda essa violência, e que tem nos agentes de repressão seus mais terríveis promotores.
Não é do interesse do Estado a legalização das drogas; seja consciente ou inconscientemente; sejam os legisladores—que em geral legislam pensando na moralidade, e não na realidade; sejam os agentes de repressão. Sim, a ninguém no “poder” isto interessa.
E os que já entenderam que esta é uma guerra perdida e autofágica, não têm coragem de dizer o que pensam, pois temem ser julgados pela hipocrisia das opiniões nunca pensadas como realidade, mas apenas como conveniência de imagem moral.
Nossos magistrados são homens cujas consciências estão vendidas aos interesses econômicos, ao moralismo, à mídia, e à mediocridade.
Já no que se refere ao aparato de repressão, a indesejabilidade da legalização vem das perdas financeiras de milhares de policiais que ganham muito…muito mais…com a manutenção da ilegalidade do que com a execução de suas tarefas precípuas, a saber: a manutenção da ordem nas relações humanas e a proteção da população.
O que me choca é que quase todo mundo que pensa e que já andou pelos bastidores e pelos intestinos dessa porcaria, sabe que é assim, no entanto, diante de uma câmera de televisão, dizem outra coisa.
É angustiante você conversar em particular com senadores, deputados federais, estaduais, vereadores, juízes, intelectuais, e governantes, e ouvir deles exatamente o que estou dizendo aqui; e, logo depois, ouvi-los dizerem outra coisa quando a luz da câmera acende e alguém diz: “Gravando!”
Ora, tudo o que eu disse até aqui tem a ver com a Terra, não com a Nova Jerusalém.
Nossas leis e desejos legais só seriam praticáveis num mundo onde ninguém fosse caído. Porém, aqui na Terra, neste mundo caído, se está lidando não com ideal, mas sempre com o real, e com a tentativa de se impedir males maiores com males menores, pelo menos.
A “igreja” e a “sociedade” parecem não querer enxergar que este mundo é caído, e que nele faz-se a gestão do melhor dos possíveis, não do melhor dos impossíveis.
O ideal era…não é mais…pois somos seres caídos. Assim, cada um busque para si o que puder ser o melhor, e não imponha aos outros aquilo que se sabe não pode ser realizado de modo absoluto. Ora, toda lei se institui como algo absoluto.
Sendo assim, devo me ater ao que é essencial no que tange a proteger os homens uns dos outros, não de si mesmos.
TODA LEI QUE TENTA PROTEGER O HOMEM DE SI MESMO JÁ É INSTITUÍDA PARA SER TRANSGREDIDA!
Assim, a tentativa de proteger se transforma na própria morte do protegido, só que, na maioria das vezes, tal morte é homicídio, não suicídio.
A Lei pode dizer “não matarás”, mas não pode dizer “não te auto-enganarás”. Isso porque tal tarefa está para além dela, e a tentativa de o fazer apenas aumenta o mal, conforme Paulo nos ensinou.
Aliás, quando Paulo quis ilustrar seu próprio estado de consciência de perdição pessoal, ele se utilizou da única Lei que já é afirmada em total subjetividade nos Dez Mandamentos, que é “não cobiçaras”. Ora, eu posso não possuir, mas dificilmente deixarei de desejar. E se houver Lei, maior será o desejo.
Por isto, e por muitas outras razões acerca das quais já fiz exposição aqui no site—veja em Opinião, Artigos e Cartas—é que sou a favor do direito do indivíduo de se matar se ele assim desejar, visto que Aquele que é Onipotente, tendo todo o poder, não me impede de morrer quando desejo dar cabo de minha própria vida.
O que o Estado deveria fazer seria acabar com toda essa hipocrisia geradora de corrupção infindável, e se concentrar na proteção do indivíduo quando um outro indivíduo tenta ameaçá-lo; ao invés de tentar coibir no indivíduo, pela via legal, uma pulsão que não é pertinente ao Estado, mas sim ao próprio indivíduo…e somente a ele mesmo.
Desse modo, é permitido aos surfistas arriscarem a vida quando o mar está “cheio e irado”, mas lhes é proibido sair ilesos da morte e acender um baseado.
O ideal só pode ser buscado pelo próprio indivíduo, e nos ambientes de sua própria consciência.
Ora, o risco de morte no mar é muito maior que no consumo de drogas. Mas mesmo que fosse o contrário, ainda assim era um direito da pessoa decidir se quer viver ou morrer, e como deseja viver, mesmo que escolha uma existência que seja a morte. Aliás, nada de novo, visto que é isto que acontece todos os dias, em milhões de outras coisas que não foram criminalizadas, e que nem por causa disso deixam de matar quem as pratica.
Assim, mais uma vez, em nome do Sábado se põe o homem no buraco sob o pretexto de que se o está protegendo. Ora, é direito do homem pular no buraco. É direito do homem ficar no buraco, se o desejar. É direito do homem morrer, se quiser. É direito do homem se drogar, se isto for apenas um problema dele, e se não tentar fazer de seu próprio buraco uma cama para todos.
À semelhança de outras leis, essa não seria uma Lei propositiva, mas apenas de concessão, como é o Divórcio, por exemplo.
O “modus operandi” de tal legalização não deveria ser diferente do modus operandi que regulamenta qualquer outra droga em uso na sociedade; e que existem em abundancia nas prateleiras das farmácias.
O que eu vejo é que por trás de tudo há três coisas:
1. Ignorância da sociedade e hipocrisia do Estado.
2. Medo dos pais e de entidades da sociedade, como a “igreja”, e que pensam que a legalização significa aumento do consumo; e que, portanto, tem-se que ser “contra” a fim de proteger os filhos. Ledo engano!
3. Grandes interesses econômicos, e que tanto existem nos que precisam que tudo fique ilegal—os traficantes e os policiais corruptos—, como também nos que praticam uma política de natureza universal, como os Estados Unidos, e que mantêm tais vetos até que lhes interesse política e economicamente praticar outra lei. Nesse dia, droga virará “carne de porco”; não é aconselhável, mas não é proibida. É como a Lei Seca. Se secar, transborda!
Em resumo:
Num mundo caído tem-se sempre que lutar por um mal menor, visto que o mal maior já é parte das regras do jogo. Assim, prefiro visitar um ser humano num hospital que ter que visitá-lo em Bangu I ou em qualquer outra prisão. Quem já esteve lá sabe do que estou falando. E mais: prefiro lidar com um dependente químico que busca tratamento do que com a mesma pessoa escondendo sua própria dependência, carência e necessidade.
A proibição varre tudo para debaixo do tapete, para a escuridão. E na escuridão quem cresce é sempre o diabo. Afinal, por pior que seja, Paulo diz: “Tudo o que se manifesta é luz”.
Nele, em Quem sabemos que a verdade liberta,
Caio