—– Original Message —–
From: O LEPROSO SOU EU
Sent: Monday, July 09, 2007 12:46 PM
Subject: Pregação de ontem.
Caio,
Extremamente amorosa e indutora de profundas reflexões sua pregação de ontem…
Você prega como quem canta (o ritmo ontem foi “fado” [sentimento à flor da pele {-Evangelho à mouraria!}]).
Nossos leprosos… são “todos” os nossos próximos que repudiamos!
Como é difícil ouvir isso (e assimilar no coração), sabendo e sentindo que o pecado se avoluma em nós (porque falta amor).
Quantos e quantos mantemos à distância…de um tiro de pedra (que nos possibilite, a um só tempo, não só não ter que conviver, como, querendo, acertá-los vez ou outra [para descarregar nossas frustrações]).
Abração.
Habib.
(*)-Escrevi um pouco sobre o que você, de modo denso (como sempre, risos…) e extenso, pregou .
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Debaixo do sol escaldante, Jesus, sentado à sombra de uma tamareira, descansava (sandália posta ao lado [pés ao vento]).
Contemplando os montes, avistou, ao longe, duas silhuetas (de estranha forma [e figura]) que dele se aproximavam lentamente. Deles até Jesus a distância era de 01 estádio; entre tais seres, todavia, a distância era de um tiro de pedra.
Ao longe, semi-cerrados os olhos de Jesus, apenas era possível a ele divisar que eram dois os caminhantes, ambos com roupas largas das quais pendiam panos (ou algo semelhante) pelos braços e ombros.
Um deles, alto e confiante, olhava para cima, com ar empinado (sempre cumprimentado pelos transeuntes); o menor, de passos mais lentos e frágeis, recusa-se sequer a olhar para frente (olhar vidrado no chão quente e árido [molhado apenas por suas lágrimas de desespero e solidão]).
Mais próximos, Jesus, pôde, enfim, vê-los melhor (e distintamente): o primeiro, bem calçado, trajava um longo manto finamente adornado, do qual pendiam filactérios e franjas; o segundo, sola nas pedras, vestia-se de ataduras (puídas), da qual pendiam restos de carne e sangue (de modo que não mais via nem ouvia com exatidão).
Ambos vinham ao encontro de Jesus, mas o primeiro, ao ver (e muito bem via) que o segundo ultrapassara a distância segura entre ambos (até porque Jesus, tão-logo vislumbrara com exatidão os corações dos dois, fora em direção ao outro), recuou meticulosamente (contando os passos).
O homem que a Jesus se achegara, clamou, aos prantos (em súplica): -Senhor, “sei” que és tu, meu desespero chegou ao limite da minha suportabilidade (a quem mais irei?); se queres, limpa-me! Jesus, olhos nos olhos, mãos nas chagas e nas dores, movido de íntima compaixão, diz: “-Quero, sê limpo!”.
Ante a manifesta gratidão, Jesus, por fim, o convida para, abraçados, tomarem vinho com alguns amigos publicanos e entoar louvores a Deus.
O segundo caminhante, então, que não enxergou a cura (ataduras no coração), gritou…de longe (e em um tom de ordem):
-Rabi, se és filho de Deus, mostra-me um sinal!!
Jesus sussurra: “-Nunca mais nasça fruto de ti (que és cego, surdo e mudo para a bondade de Deus)!”.
Por derradeiro, enquanto Jesus e o antigo leproso caminhavam, permanecia estática a figueira seca à beira da estrada (sobre ela as velhas ataduras do leproso [sinistra estátua morta de natal]), ponto fixo para que os cachorros nela urinassem (afastando, pelo odor fétido, qualquer um que tencionasse dela se aproximar [para procurar seus frutos…inexistentes]).
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Resposta:
Amigo amado: Graça, Paz e abundante Sabedoria de Amor sobre você!
Você nunca foi religioso, muito menos “evangélico”; e conheceu o Evangelho.
Ora, este é um privilégio que no Ocidente poucos têm tido,pois quase todos já nascem vacinados com a vacina “cristã” contra o Evangelho.
Assim, você amou primeiro Àquele que Primeiro amou você. Depois você amou as demais coisas.
Desse modo, como já lhe disse antes (em outra carta), você me lembra meu pai, quando chegou… — assim: todo sede; todo amor; todo vontade de mais; todo possuído por cada impressão da Graça; e, sobretudo, todo tomado de amor e de vontade de fazer a vontade de Deus. E deu no que deu!…
Conforme disse ontem, o Evangelho subverte o significado do “leproso”. Para Jesus, leproso era quem gritava: “Leproso”, e tomava pedras para atirar e espantar o bicho ou então fugia…
Também falei sobre pecado; pecado e suas sutilezas em nosso ser. E disse que “pecado” todos nós sabemos o que é, mas fugimos (via auto-engano) de confessar o que sabemos.
Pecado eu sou. Daí eu não ter redenção a menos que o Salvador me redima e eu aceite e creia na redenção.
Entretanto, no dia a dia, pecado é falta de amor e falta de fé no amor.
Paulo diz que no amor não há lei, pois o amor não transgride. Assim, nossa pecaminosidade cresce na medida em que o amor murcha ou se torna outra coisa em razão de nossos auto-enganos.
Jesus fez ligação direta entre iniqüidade crescente e amor murchante!
“Por se multiplicar a iniqüidade o amor se esfriará de quase todos” — disse Ele.
O amor não transgride, pois quem ama não usa a prostituta, não tenta intervir na vida dos outros mediante o feitiço, não inveja o que é do outro; antes, se alegra e se encanta com o que ele tem, e, desse modo, assim é a “resposta” do amor a todas as demais coisas que Paulo chama de “obras da carne”. Estas só existem onde não há amor, visto que na presença do amor tais “árvores existenciais” não têm ambiente para dar seus “fruto-obra-da-carne”, pois tais entes se alimentam das sombras das cavernas de nosso ser em fuga da luz do amor.
Assim, se o amor não transgride, na ausência dele só existe transgressão, até quando faço justiça. Pois até a virtude que se torne prática, porém destituída de amor — por mais que beneficie quem precise da virtude como ajuda prática na vida — é, aos olhos de Deus, pecado, posto que é “obra” feita pela presunção de justiça-própria do homem, e, desse modo, é iniqüidade pela sua própria autonomia de pretender ser alguém ou algo sem-amor; pois Deus é amor.
Quanto mais vivo — aprendo, erro, arrependo-me e me disponho a dizer “sim” ao Evangelho —, mais vejo que aquela “uma só coisa” da qual Jesus falou a Marta na presença de Maria era apenas-sobretudo-amor.
Mas enquanto a gente não escolher o amor como piso e teto da nossa vida, por mais que nos esforcemos de nada nos aproveitará, pois, sem amor, tudo o que em nós cresce é iniqüidade — iniqüidade politicamente correta, cheia de justiça e direito; eivada de maneirismo e bons modos; cheia de vestes legais e jurídicas; entupida de religião e doutrina; porém, apenas (e, sobre-tudo) iniqüidade.
O que nos resta é crer que Jesus não hesita jamais quanto a dizer: “Quero! Fica limpo!”
Vejo você hoje à noite aqui em casa? Ou será que você só poderá vir amanhã, pra nossa “Conversa Viva Sobre o Evangelho”?
Seja como for, a rádio estará transmitindo sempre ambas as programações, ao vivo.
Receba meu beijo!
NEle, que mete a mão nas minhas chagas; que se suja em minhas feridas; que se lambuza do pus de minhas lepras, mas diz: “Caio! Sim! Eu quero! Fica limpo!”, é que me despeço com todo amor e gratidão,
Caio
09/07/07
Lago Norte
Brasília