O Salmo 106 nos diz o seguinte no verso 14 e 15:
“Entregaram-se à cobiça… e tentaram a Deus na solidão. Concedeu-lhes o que pediram, mas fez definhar-lhes a alma”.
 A primeira vez que me dei conta desse texto eu ainda era um menino de vinte anos em Manaus. 
Assustou-me a afirmação de que Deus pode fazer concessões à insistência e à obstinação. O “pedinte obstinado” pode até celebrar o “recebimento da benção” como resposta à sua oração. Todavia, sem o saber, ganhou o prêmio de sua própria cobiça, e o resultado será o definhar de seu ser!
 Aqui habitam alguns perigos:
O primeiro é o da espiritualidade baseada em resultados objetivos! 
Muita gente julga que Deus está do seu lado ou contra, conforme o critério de realização de seus desejos. Faz-se um plano de ação e se o persegue com a “mente positiva” da oração e do trabalho. Consegue-se o que queria. E a interpretação é: “O Senhor confirmou”. 
 O que parece que as pessoas esquecem é que ateus e perversos também são muito bem sucedidos e não recorrem a Deus para tal! 
 Mente obstinada e coração obsessivo têm grande poder em si mesmos. Daí os livros de auto-ajuda ajudarem tanto. E nada há de errado em fazer planos e buscar alcança-los. Objetivo e disciplina sempre deram certo nas vidas da maioria dos seres humanos.
O segundo perigo é confundir meu êxodo da vontade de Deus com meu êxito na vida! 
Quando o critério da avaliação é o que dá certo, perde-se o discernimento do que é certo.
 Nem tudo o que dá certo é certo! 
 E nem tudo o que é certo, dá certo! 
 Num mundo caído como o nosso—e para isto basta ler o Eclesiastes—há mais contradição que sincronicidade! 
 Portanto, não dá para afirmar de modo absoluto que tudo o que dá certo esteja sempre certo. Há coisas que justamente porque dão certo, acabam matando o ser, que confunde as conquistas exteriores com afirmações de saúde interior.
O terceiro perigo é imaginar que a alma se satisfaça com as conquistas exteriores! 
A alma lucra tanto com tais conquistas quanto um liqüidificador com a benção de uma reunião de oração. São dinâmicas e dimensões diferentes. Os vasos não se comunicam aí!
 Nesse mundo caído um dos nossos maiores problemas é de des-sincronia entre as várias dimensões do ser!
O quarto perigo é o de pensarmos que tudo o que nos acontece conforme aquilo que nós chamamos de “bom”, de fato nos faça “bem”!
 Minha experiência com Deus e com a vida me ensinaram até aqui que muito do que se chama de bom, faz mal para o ser em certas circunstâncias. E muito do chamamos de mal, em determinadas circunstâncias é a salvação da alma!
Por isso, o salmo adverte que é possível que alguém esteja celebrando um êxito que de fato está gerando um êxodo da alma em relação ao seu verdadeiro bem! 
 O critério é o da alma! 
Nenhuma conquista que não melhore a alma é conquista aos olhos de Deus!
Afinal, o que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma?
E quando aqui falo de “perder a alma” não estou falando em ir para o inferno, mas em perda da humanidade, da sensibilidade, da capacidade de valorizar o que é essencial, de superficialização do espírito e, sobretudo, de dormência e anestesiamento em relação ao que é valor que carrega significado na construção do homem interior!
 Assim, que você prospere, e eu também, somente quando nossas prosperidades externas não faça definhar a nossa alma! 
 Do contrário, será uma tragédia!
Caio Fábio
 
								 
								