OS TEÓLOGOS ESTÃO SEM RUMO… E SEM ESPERANÇA!
—– Original Message —– From: “Carlos E. Calvani” To: [email protected] Sent: Friday, August 05, 2005 2:30 AM Subject: OS TEÓLOGOS ESTÃO SEM RUMO… E SEM ESPERANÇA! Olá Caio, Há tempos não lhe envio nenhum e-mail, mas agradeço por ter publicado dois textos meus em seu site. Estive dando uma olhada hoje no site e está muito bom; parabéns. Você tem um impressionante tato pastoral e -o que é mais importante – sem moralismos. Hoje te admiro muito e aprendi a admirar principalmente o Caio de hoje, o “novo Caio”, ou como costumam dizer os teólogos, o “segundo” Caio. Ando cansado da falta de rumos da teologia protestante brasileira. Estive no FITEC em Mendes, mas, para mim, deixou muito a desejar. Excessiva babação em torno do Rubem Alves e, cá entre nós, por mais que a leitura dos textos dele tenha me ajudado 20 anos atrás, hoje acho que ele parou no tempo. Muito repetitivo… Além disso, parece haver uma crise em muitos colegas mais “liberais” em relação ao termo “teologia”… Preferem dizer que não são teólogos, mas que fazem “ciências da religião”; e aí a confusão aumenta, porque não fazem direito nem uma coisa, nem outra. Abraços Rev. Carlos Eduardo B. Calvani ____________________________________________________________ Resposta: Querido Carlos: Graça e Paz! Já nasci na fé com problemas com a “teologia”. Talvez fruto das percepções de meu pai, que, logo após a sua conversão extraordinária, sozinho, lendo o Novo Testamento, passou a dizer que não via significado na teologia; primeiro em razão da “pretensão” do termo (teo-logia ou teo-lógico); depois em coerência com aquilo que ele via nas produções teológicas; ora áridas, ora céticas, ora herméticas, ora com a pretensão de “fechar Deus” nas sistematizações, ora gerando dogmas que violam o Dogma do amor, ora desenvolvendo morais teológicas contra a ética do Evangelho, ora apenas vestindo as filosofias dos tempos e épocas com as roupagens e terminologias “teológicas”—porém, sempre pensando que a “teologia” tem qualquer coisa a ver com a saúde da Igreja ou com o Evangelho e a Vida. Logo vi por mim mesmo que meu pai estava certo, especialmente quando comecei a participar dos encontros teológicos do Brasil, da América Latina, e no resto do planeta. A sensação que me dava, a mim que vivia com o povo e para alimentar a fé com a Palavra do Evangelho, era que os teólogos pensavam que a produção de um texto, ou livro, ou compêndio academicamente bem armado, com listas intermináveis de citações e repetições, com muito pouca originalidade em quase tudo, com um total descaso pela necessidade do coração humano, e sobretudo, sem praticamente nenhuma relação com a realidade—tinha alguma relevância imanente, como se a produção daquilo, magicamente, tornasse as coisas diferentes. Desse modo, a mim sempre foi profundamente irritante, por exemplo, quando eu via um texto produzido por um monte de teólogos num Encontro, passar a ser considerado como “avanços fundamentais” para a igreja e a fé, sendo que a Igreja-Povo quase nunca nem mesmo ficou sabendo dos conteúdos e propostas geradas em tais “documentos”. Até hoje me irrita quando vejo um acadêmico qualquer reunir todos os textos produzidos em Concílios e encontros teológicos, amontoá-los, e armar uma tese acerca de como a “igreja” era melhor antes, e pior depois; e tudo aparentemente ligado à produção daqueles textos, os quais, nem a maioria esmagadora dos pastores ficou sabendo que existiram, e a igreja-povo menos ainda. O sentimento que sempre me deu é que a relação dos teólogos é com os livros, as letras, os textos, as palavras, etc…—e que, para eles, uma vez que algo se faz livro ou texto, aquela idéia automaticamente virou, por puro “encanto”, fato e realidade; sendo que ninguém ficou sabendo. A própria produção teológica, para mim, é filha do patrocínio do Império Romano. Eis a razão porque dois mil anos depois ainda se pensa que o que um Concílio decide, muda a vida das pessoas; posto que no tempo da formação institucional e religiosa do “Cristianismo”, todas encíclicas e documentos doutrinários ou dogmáticos viravam mandamento para o povo, visto que o Imperador assim fazia acontecer. Hoje, nos Estados Unidos, (aliás, já faz tempo…), o que se vê é um avivamento do poder e do espírito do Império Romano sendo mediatizado pela Ideologia do Império Americano. Ora, foi justamente isto que aconteceu o tempo todo nos últimos quase dois mil anos; posto que as forças políticas sempre determinaram as produções teológicas. Ora, numa era chamada de “pós-cristã”, é natural que os teólogos não saibam mais quem são (se é que um dia souberam…), pois, de fato, o espírito deste tempo está mais para as “ciências da religião” do que para a produção de uma teologia que se chame cristã. Assim, mais uma vez, o Tempo, a Era, e o Momento Histórico, Político e Cultural, determinam o sentir existencial do teólogo, e isso não como um fenômeno de entendimento e contextualização dos conteúdos essenciais da fé, mas como uma ação tímida, acovardada, e sempre em busca de conformidade com a elegância dos tempos. Ou seja: a teologia quase sempre foi politicamente correta com os tempos, até mesmo no tempo da Teologia da Libertação, que não era associada ao Poder institucional, mas se amparava no poder ideológico e na força política do povo. Ora, se a Teologia da Libertação, por exemplo, fosse algo que carregasse fé, a Queda do Comunismo e a fragilização dos movimentos socialistas não teriam tido o poder de desmobilizá-la. Mas como era algo filho da estética social mais elegante do momento, ela se fez notar; porém, quando o Muro de Berlin caiu, ela ruiu junto. Por quê? Porque não era fé, mas apenas ideologia. Também já gostei muito de alguns livros do Rubem Alves, aí pelo fim da década de 70 e inicio dos anos 80. Mas logo, bem logo, senti que aquilo tudo ali não se ancorava na experiência da fé, mas sim numa amargura sem proposta, e que nada tinha de engajamento com a vida que acontecia para além do escritório do Rubem. De lá (do escritório) ele vê jasminzeiros, belas árvores, lindas memórias antigas, muita poesia de cozinha, muita leveza poética misturada com excessiva amargura. Nada além disso! Dia desses, meu filho, Ciro, o ouviu no Bennet, e voltou para casa dizendo que se ele fosse mais novo, gostaria muito de ter ouvido aquelas historinhas de criança, mas, não mais sendo, se sentiu ofendido pela poesia pueril e pífia do Rubem, a qual pretendia passar por um discurso de natureza teológico-poética, mas que nada dizia à necessidade do coração humano. Outro dia o vi no Jô e fiquei decepcionado com a infantilidade dele. Parecia um adolescente velho. A impressão que deu é que a eroticidade que ele não viveu no tempo certo, agora, ele quis fazer questão de declarar estar em fase de atualização. O Jô insistia em temas relevantes, mas o Rubem fugiu de tudo, até mesmo negou-se a se declarar como homem da fé, fazendo questão de tratar o “pastorado” como algo da infância dele; e, quando o Jô falou na Teologia da Libertação, ele fugiu de assumir a parte da sua “paternidade” em relação o fenômeno, quase como se tivesse vergonha. Depois, do nada, disse que “mora só”, e, então, enveredou pela história do Caqui: o caqui como sendo a fruta da sedução do paraíso, não a maçã… coisa de criança, especialmente no que concerne à “maçã”. Em seguida enfiou o dedo num caqui imaginário, e fez questão de manter, tola e infantilmente, o dedo erguido de modo fálico como algo sendo “enfiado penianamente” no caqui. Assim, o Rubem que me perdoe, mas poesia por poesia, fico com a de um dos grandes “teólogo da vida” (ou vidólogo), chamado Carlos Drummond de Andrade, conforme a que aqui transcrevo: Quando encontrares alguém e esse alguém fizer o teu coração parar de funcionar por alguns segundos, presta atenção: pode ser a pessoa mais importante da tua vida. Se os olhares se cruzarem e, neste momento, houver o mesmo brilho intenso entre eles, fica alerta: pode ser a pessoa que tu estás à espera desde o dia em que nasceste. Se o toque dos lábios for intenso, se o beijo for apaixonante, e os olhos se encherem de água nesse momento, percebe: existe algo mágico entre vocês. Se o 1º e o último pensamento do teu dia for essa pessoa, se a vontade de ficar juntos chegar a apertar o coração, agradece: Algo do céu te mandou um presente divino: O AMOR. Se um dia tiverem que pedir perdão um ao outro por algum motivo e, em troca, receberes um abraço, um sorriso, um afago nos cabelos e os gestos valerem mais que mil palavras, entrega-te: vocês foram feitos um para o outro. Se por algum motivo estiveres triste, se a vida te deu uma rasteira e a outra pessoa sofrer o teu sofrimento, chorar as tuas lágrimas e enxugá-las com ternura: poderás contar com ela em qualquer momento da tua vida. Se conseguires, em pensamento, sentir o cheiro da pessoa como se ela estivesse ali do teu lado… Se achares a pessoa maravilhosamente linda, mesmo ela estando de pijama velho, chinelos de dedo e cabelos emaranhados… Se não conseguires trabalhar direito o dia todo, ansioso pelo encontro que está marcado para a noite… Se não consegues imaginar, de maneira nenhuma, um futuro sem a pessoa ao teu lado… Se tiveres a certeza que irás ver a outra envelhecendo…e, mesmo assim, tiveres a convicção que vais continuar sendo louco por ela… Se preferires fechar os olhos, antes de ver a outra partindo: é o amor que chegou na tua vida. Muitas pessoas apaixonam-se muitas vezes na vida, mas poucas amam ou encontram um amor verdadeiro. Às vezes encontram e, por não prestarem atenção nesses Sinais, deixam o amor passar, sem deixá-lo acontecer verdadeiramente. É o livre-arbítrio. Por isso, presta atenção aos sinais! Carlos Drummond de Andrade Drummond crê em sinais. Mas minha impressão é que o Rubem é um homem sem fé. E, para mim, saiba: prefiro convidar para qualquer encontro “teológico” o ser mais puro da fé do que um intelectual que se imbecilizou pela via da descrença idiotada e amargurada. Isto porque eu, você, e quem quer que veja e pense, sabe que a “igreja” e o “cristianismo” são o que se tornaram; porém, tanto você quanto eu, sabemos que o Evangelho de Cristo nada tem a ver com isto. No entanto, quando a única experiência que a pessoa teve com a “fé” foi de natureza religiosa, ritual-mística, e fenomenológica, o que sobra no final de tudo é o Rubem Alves. Entre ouvir o Rubem e o Boff, ainda prefiro mil vezes o Boff, posto que este, pelo menos, é ainda um homem da fé. No fim, meu irmão, se o objetivo da teologia é alimentar a fé na ação pastoral e comunitária, o que se percebe é que tal quase nunca acontece, e os teólogos, por essa razão, são apenas os gerentes do masturbatório das idéias que não fazem nada ser parido de novo na vida. Teologia, Filosofia, Ciências da Religião, e outros afins, não valem, a meu ver, o esforço e o dinheiro que se gasta em tais coisas improdutivas. Sempre achei que quem quer que saiba ler e tenha um mínimo de capacidade reflexiva, não precisa fazer da teologia nada além de um diletantismo intelectual. Posto que, a meu ver, não vale dedicação exclusiva, em razão de que qualquer autodidata pode se encher de conhecimento dessa natureza em sua própria casa, com bons livros; podendo, assim, usar melhor o tempo para o aprendizado daquelas coisas que só podem ser aprendidas com assessoria direta de professores. E quanto ao estudo da Bíblia, também fico com urticária quando vejo os caras gastando tempos e tempos em tolices que eles ensinam aos alunos tolos e despreparados para tudo na vida. Ora, eles próprios, os teólogos, quando também são “pastores”, nem mesmo podem ensinar em suas comunidades o que ensinam aos pobres alunos, visto que sabem que seus estudos são tão herméticos e sacais, que a comunidade ou perderia a fé ao ouvi-los ou, então, se protegeria do assalto à simplicidade da fé, mediante o recurso de uma boa soneca durante o sermão. O que sinto é que a teologia fez Deus ser alguém fora, nos livros, nas idéias acadêmicas, etc… mas nunca é Deus para a vida e para o coração. Não há ninguém nesta vida que me faça gastar tempo com a teologia como se ela fosse importante, quando sei que o que vale é apenas o Evangelho do Reino e o testemunho de Jesus como experiência na vida. O que você acha que Jesus diria aos teólogos do cristianismo? Na minha opinião Ele continua a dizer a mesma coisa que disse a Nicodemos: “Tu és mestre… e não compreendes estas coisas?” Jesus nunca disse que “a boa parte que não será tirada” (Sua fala a Marta e Maria) era a teologia, mas sim a experiência de Deus. Quando me convidaram a ir ao encontro de Mendes, lá na Catedral do Rio, eu disse que não iria porque não tinha esse tempo a perder; e que ir a Mendes me parecia um saudosismo hiponga e nada mais que isto. Sinceramente, prefiro ir a Mendes para ficar “numa boa” em suas cachoeiras… E mais: minhas idas lá no tempo dos hippies, eu sei, me foram mais úteis do que o tal encontro conseguiria ser. O que acho é que entre os “perdidos” deste tempo, poucos estão mais “perdidos” que os teólogos, visto que é deles, no meio cristão, que me vêm as maiores manifestações de mesmice e desesperança. A teologia deveria ser apenas uma dedicação de percepção do Teo-Logos. Portanto, não conheço nenhuma teologia que seja válida, se não for encontro com o Logos Vivo e presente entre nós. A teologia, porém, hoje, vive de saudades, como o próprio Rubem um dia disse: “Minha espiritualidade é a da saudade de Deus”. Fico com pena dele, de sua resignação, de seu Deus de ontem, de sua espiritualidade de álbum de família. Enquanto os teólogos não encontrarem com a Palavra e não com a letra, com a Graça e não com a doutrina da Graça, com o Evangelho e não com o estudo letrista dos evangelhos, como o Jesus Ressuscitado e não com o Jesus Histórico ou com o Cristo Transcendental, nada acontecerá de bom na teologia; e o destino dos teólogos será o divã dos psicanalistas, visto que grande já é e será a depressão. O Jesus Histórico é o ser menos histórico que existe, posto que se tornou objeto de estudo e pesquisa, e não de experiência existencial hoje. E o Cristo Transcendental, é tão transcendente, que não é possível conhecê-lo nem pela fé, tornando-se, assim, apenas um grande arquétipo Cósmico; nada além disso. Espero que você não me entenda mal, e nem como alguém que está amargurado. Ao contrário, meu irmão, nunca estive tão cheio de esperança no Evangelho. Quanto ao “segundo Caio” dos teólogos, deixo para eles designarem quem sou hoje, ou quem fui ontem. De fato, o que eles chamam de “segundo Caio” é para mim apenas um atestado de que eu andei… eles ficaram onde sempre estiveram. Por isto, minha continuidade existencial é vista por eles, que estão congelados, como sendo uma segunda versão de meu ser; quando, na verdade, nunca fui tão eu mesmo quanto agora; e isto não é fruto de nada senão da continuidade da vida, e das experiências com Deus na existência real. Publiquei um de seus textos, e publicarei os demais. Receba todo meu carinho e respeito; e minha grande reverência pela sua vida! Nele, em Quem estão ocultos todos os tesouros da sabedoria e do conhecimento, os quais não se manifestam pela via das mediações humanas de compreensão, mas exclusivamente pela via da iluminação e da revelação espiritual, Caio