PERDÃO POR NÃO ESTAR AÍ–Lineu Vargas

—–Original Message—–
From: Lineu Vargas
Sent: sexta-feira, 9 de abril de 2004 19:43
To: [email protected]
Subject: De Chicago

Pr. Caio,



Eu sei que já faz um tempão que não nos falamos. Eu não gostaria que o
senhor pensasse que a razão pelo qual deixei tanto tempo passar sem fazer forca para entrar em contato de novo, pra bater um papo, ver como vocês estão, tivesse algum outro motivo que simplesmente ter deixado problemas cotidianos, e falta de tempo tomar conta da vida.


Perdoe-me também por ainda não ter ligado para o senhor (acabei de tentar agora, mas o sr. não estava em casa).

O que aconteceu com o Lukas, as
memórias do meu tempo com vocês, o carinho, e o respeito que o senhor sabe nunca foram ausentes do meu coração por vocês, e especialmente pelo senhor.

O tempo que passei sem entrar em contato, neste ultimo ano, que embora extremamente conturbado, foi igualmente importante para minha vida (acabei me casando,
tomei licença do doutorado, tenho me envolvido mais e mais com a Igreja, minha mãe teve câncer, e passou por quimioterapia entre outras coisas).

Essas coisas vieram como uma avalanche, desabando sobre minha cabeça e minhas emoções.

Saudades, misturados com culpa, com impotência (fiquei sabendo tarde), foram sentimentos que estiveram, e estão em meu coração; e esses são sentimentos paralizantes: parece que sempre precisamos de um momento a mais, de um minuto a mais para digerir, para tomar coragem e pedir perdão.

Eu gostaria de pedir perdão ao senhor por essa ausência, que eu não tinha o direito de “cometer”.

A vida é maravilhosa e frágil demais para não ser celebrada.

A perda do Lukas me trouxe à memória e ao coração a perda de meu pai.

Tanto em um caso como em outro, meus sentimentos não são de remorsos, ou de medo, ou de raiva; mas de perda do que o futuro guardava; perda de seres
humanos cuja riqueza apenas vislumbrei, e que foram cortados muito cedo.

Perda de relacionamentos que realmente gostaria de ter visto frutificar em maturidade; ou de historias que gostaria de ter visto desenrolarem-se; de afeto e sentimento que gostaria de ver expressos mais vezes, outras vezes; e também de conversas das quais
gostaria de ter participado; risadas que só nosso Senhor pode ouvir agora.


Teu Filho,


Lineu Vargas
_____________________________
Resposta:


Meu amado filho Lineu: Paz e Prosperidade sobre sua alma!

VOCÊ, mesmo que quizesse, jamais deixaria de estar aqui, pelo simples fato que você “é” em todos ós.

O Ciro tem me mantido informado de todos—ou quase todos—os seus caminhos, e sempre me alegro.

Uma das primeiras pessoas que perguntei se “estava sabendo”, foi você; logo bem cedinho no sábado da “páscoa do Lukinhas”…na qual ele atravessou mar com os pés secos…e entrou na Terra da Promessa…onde há Descanso.

A dor é indescritivelmente forte, e estranhamente, doce.

As característica da dor seriam as do Banzo—aquela dor-ença que matava os escravos exilados. Mas, como a volta é certa e o reencontro está garantido, o Banzo vira Saudade grata, consolada, afofada pela Graça; portanto, não nos mata, pois a morte que matava, já morreu em Cristo.

Quando Ciro me apresentou a você num dos Congressos da Vinde—talvez há uns doze anos—, eu jamais poderia imaginar que nossas vidas se tornariam, de certa forma, uma só.

Quando, pela primeira vez, dentro da piscina lá de casa, no Green Park, em Itaipu, você me contou do seqüestro e execução de seu paizinho bem diante de seus olhos, nunca mais consegui olhar você sem o carinho da paternidade. E acho que demonstrei isto a você de diversas e veementes maneiras.

Seu silêncio dos últimos meses nada diz além do que o meu próprio silêncio diz: que amigos se sabem, se entendem, e se explicam sem nada terem que dizer. Pois o que é, é! E você, meu amado filho, é!


Sentimos muito pelas lutas de enfermidade pelas quais sua mãe passou. Sabemos que ficará tudo bem.

Quanto ao seu casamento, não poderia ser diferente. Você é o “nosso Lineu”, e, em sendo você, casar sem avisar é natural. Quando a gente conhece e ama, tudo é natural…pois a verdadeira amizade não tem melindres; especialmente ante a felicidade do amigo.

O Luk você conheceu muito bem. Ele era quem ele era. E me sinto feliz que tenha lutado com todas as suas forças para ser ele mesmo; e venceu, pois, de fato, se “encontrou Nele”; única possibilidade da gente ser quem é!

Fico feliz com seu envolvimento na igreja, e pelo término do Mestrado em Londres, e, agora, em algum tempo, do Doutorado. E não esqueça: O Brasil ainda vai precisar de um Ministro da Economia como você!

Estamos doidamente consolados e confortados!

Buscar outra solução interior é um caminho que desconheço!

Receba meu beijo e os de todos os meninos.

De seu pai, no Senhor,



Caio