PERFUME DO ESPÍRITO: O CHEIRO DA GRAÇA
Minha avó materna era uma das pessoas mais olfativas que já conheci.
Foi com ela que aprendi, desde a infância, o valor e a delicia dos aromas.
Sempre fui profundamente impressionável pelos cheiros.
De fato, o sentido olfativo é o mais primitivo de todos entre os mamíferos.
E eu sou um mamífero!
Parte de tudo o que me encanta me penetra pelo cheiro. Sou mais seduzido pelo aroma que pela visão. E uma vez que um aroma se instala em mim, nunca mais de mim sairá.
Quando meu irmão Luís Fábio morreu, em novembro de 1976, encheram o caixão dele de cravos. O povo da igreja vinha e lá punha os cravos. Os cravos, que antes me eram agradáveis, passaram a ter para mim cheiro de morte.
Durante anos eu evitei os cravos. Eles me traziam o funeral de meu irmão para os ambientes de minha alma com a força daquele “dia”.
É como o cheiro de uma paixão. Enquanto está presente, é vida. Uma vez inviabilizada—seja pelas circunstancias, pelo tempo, pela distancia, pela ausência, ou pela morte—aquele aroma do amor passa a ser o cheiro da dor.
Paulo sabia o que dizia quando usou uma imagem olfativa para expressar o impacto do Evangelho sobre a alma humana.
“Graças, porém, a Deus que em Cristo sempre nos conduz em triunfo, e por meio de nós difunde em todo lugar o cheiro do seu conhecimento; porque para Deus somos um aroma de Cristo, nos que se salvam e nos que se perdem. Para uns, na verdade, cheiro de morte para morte; mas para outros cheiro de vida para vida.”
Os comentarista do texto de Paulo, em geral, aludem à possibilidade de que ele fizesse referencia ilustrativa às procissões das conquistas romanas.
Nesse caso, sempre que os exércitos romanos chegavam vitoriosos de suas conquistas, os incensos da procissão inundavam as ruas com o cheiro da vitória.
Ao mesmo tempo em que para os “cativos”, que vinham sendo trazidos como parte do “despojo” dos vitoriosos, o mesmo aroma era sentido como cheiro de morte.
Toda hora a gente ouve alguém dizer: “Isso não me cheira bem!” Na maior parte das vezes a frase fala de algo subjetivo, que tem a ver com algum suposto “discernimento” do interpretador dos ventos.
Assim é também com o Evangelho!
O mesmo conteúdo pode gerar interpretações olfativas diferentes. Pode ser cheiro de vida, para os que estão sendo salvos. Mas também pode ser cheiro de morte para os que interpretam aquilo contra eles mesmos.
Desse modo—se não feder para todos—, cada um tem que assumir que os cheiros são muito mais projeção nossa, que a verdade do aroma em si.
Quando o cheiro que exala é o do Evangelho, aí então que é a reposta negativa revela muito mais os traumas daquele que não gosta, que o desvalor do aroma que ele diz não ser bom.
Paulo, no entanto, sabia que não apenas o bom e verdadeiro perfume de Cristo pode não ser apreciado—dependendo do trauma funeral do ser olfativo—, como também cria que poderia haver falsificações do perfume.
É quando cheira parecido, mas não é!
Acerca disso Paulo comenta na seqüência:
“E para estas coisas quem é idôneo? Porque nós não somos falsificadores da palavra de Deus, como tantos outros; mas é com sinceridade, é da parte de Deus e na presença do próprio Deus que, em Cristo, falamos.”
Há pessoas que querem a Palavra. O problema é que elas estão traumatizadas pelos “odores” que imitam a fragrância, mas que diluem o conteúdo, usando um fixador que não fixa ninguém no amor e na graça de Deus.
É obvio que há muitos que não querem o bom perfume de Cristo mesmo!
Mas também deve ser óbvio para todos nós que a “rejeição” de muitos nem sempre tem a ver com o perfume genuíno, mas exclusivamente com o trauma que tiveram com as falsificações!
Assim, devemos caminhar levando o cheiro da Graça de Jesus onde quer que formos. Mas devemos saber que muita rejeição que encontramos por aí tem total procedência.
Afinal, em cada esquina há camelôs vendendo um “evangelho paraguaio”. Com Ponte da Fraternidade e tudo o mais. Mas quando você põe, e deixa, logo percebe que não fixa.
Afinal, foi feito apenas para impressionar na chegada, não para durar para o resto da vida.
Nenhum de nós é idôneo para garantir a qualidade. A qualidade vem de Deus.
Mas é nossa parte saber e fazer duas coisas.
A primeira é exalarmos o cheiro da Graça do conhecimento da Palavra com sinceridade, sem adulterar o conteúdo do Evangelho, para isso nunca vendendo um evangelho de conveniências.
A segunda coisa a fazer é saber que há muitos camelôs por aí; e, portanto, não comprar nunca pacotes que não sejam abertos, e jamais nos impressionarmos com qualquer coisa que não carregue a marca que valida todas as coisas: A Cruz de nosso Senhor Jesus Cristo!
Se assim fizermos e vivermos com sinceridade, que cada um entenda e interprete como goste, mas para nós será sempre cheiro de vida para vida, e nunca deixaremos de exalar os aromas dessa Graça onde quer que Deus nos leve. E será sempre em triunfo!
Caio
Escrito em outubro de 2003