QUESTÕES SÉRIAS DE UM JOVEM: G12, Dízimo, Melquisedeque
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From: QUESTÕES SÉRIAS DE UM JOVEM HONESTO: G12, dízimo, formas, Melquisedeque
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Sent: Tuesday, June 21, 2005 7:47 PM
Subject: E agora?
Querido Caio,
Tenho acessado o seu site e ele tem revolucionado minha vida, meu modo de ver a igreja e o evangelho.
Fui criado num lar evangélico, de origem assembleiana. Aos 17 anos saí da igreja por achar muito cheia de normas e costumes que não tem qualquer base bíblica, e fui para uma igreja de origem “renovada”. Hoje faço, ainda, parte de uma igreja independente, que começou com grupos familiares e depois adotou o G12. Depois de várias decepções, frustrações e mágoas, saí da liderança dos doze.
Tenho lido o seu site, e tem me feito muito bem. Estou sendo curado de tanta prisão em que me meti. Pouco a pouco esses grilhões estão caindo. Estou um pouco sem rumo. Estou cansado. Não acreditando nas pessoas, principalmente na liderança. Em função disso estou sem ambiente na igreja. Tenho lido as cartas e matérias sobre o G12. O que me prende lá são as amizades que tenho.
Penso que forma, modelo ou estrutura são desejáveis e inevitáveis em qualquer grupo, na medida em que não tirem nossa individualidade. Cada coisa deveria ter o seu lugar, só que isto, na maioria das vezes, NÃO ACONTECE. A estrutura toma conta e sufoca nossa individualidade. A liderança só pensa em números, relatórios, programas, eventos, congressos e encontros.
Aonde vamos chegar com tanta coisa? Será que precisa de tudo isso para atrair as pessoas? Será que as pessoas não ficam mais atraídas pela palavra simples que fala de Jesus? Temos que ter os shows, as danças, as bandas, as luzes, as fumaças?
Hoje está muito complicado falar do Evangelho. Faz muito tempo que não convido ninguém para visitar a igreja.
Neste domingo a equipe de louvor começou com músicas lentas e depois os ministros entraram em um louvor espontâneo, de uma hora… Os músicos sentaram no chão, por que estavam “cheios do Espírito”; uma menina começou a gemer no microfone durante uns 30 minutos, parecia que estava tendo um orgasmo. Depois o ministro de louvor, pediu permissão ao Apóstolo para falar, estimulando a igreja a entrar neste nível de adoração, que não deixasse o fogo apagar e a paixão por Cristo. O quadro é muito chocante para mim, imagina para um visitante. Neste domingo o apóstolo não pregou, só justificou o que aconteceu no culto.
Na minha cidade não conheço nenhuma igreja com a qual você tem descrito neste site. Só vejo “igrejas”. Se você conhece alguma, por favor me recomende.
Tenho lido suas respostas sobre o dízimo. Gostaria que você me explicasse a atitude de Abraão ao dar o dízimo a Melquizedeque. Este fato é antes da lei. Como fica este dízimo segundo a ordem de Melquizedeque? Jacó também deu o dízimo. O dízimo está presente em outras religiões. Como você explica a palavra de Jesus aos fariseus, dizendo: “…mas ai de vós, fariseus, que dizimais a hortelã, e a arruda, e toda a hortaliça, e desprezais o juízo e o amor de Deus. Importava fazer estas coisas, e não deixar as outras.”
Aguardo sua resposta.
Um abraço carinhoso.
Obs: qualquer dia, venha tomar um açaí com pirarucu!
Resposta:
Meu amado amigo: Graça e Paz!
É claro que num mundo físico não é possível existir qualquer coisa que não tenha forma. A forma é inevitável; a fôrma, porém, é evitável.
Nunca tive problemas com a forma, mas sim com a fôrma. Ora, já nasci com forma; desde pequeno que tenho uma forma, uma face, um modo, um jeito de ser, uma maneira de caminhar, de falar, etc… Hoje tenho 50 anos. A forma de meu corpo mudou, de minha face, de meu modo de andar, de meu jeito de falar, de rir, de me expressar, etc… Ora, alguns que não me vêm desde a infância não me reconhecem; outros, entretanto, o fazem. Os que não me acham mais parecido com minha forma na infância, todavia, nunca negam que eu sou eu; apenas dizem que mudei; uns dizem que engordei; outros dizem que fiquei melhor; outros lembram de como eu era mais bonito; ou mais feio; ou mais intenso; ou mais despojado; etc… Porém, nunca encontrei ninguém para quem eu tenha deixado de ser eu, apenas porque cresci.
A forma na qual eu vim a este mundo continua a mesma, apenas se adaptou aos tempos, às estações, à vida, à idade, etc… E só pôde ser assim porque havia forma, não fôrma. A forma cresce com o conteúdo e muda com o tempo; como acontecem com todas as formas que dão invólucro a corpos vivos. Se a forma é a roupa física de um ser vivo, e se ela se esticar para acompanhar aquilo a quê ela apenas ‘cobre e veste’, então, ela jamais será um problema; posto que nunca será fôrma além de forma.
Somente o que não é vivo tem formas imutáveis e fixas. Porém, o que é vivo, tem na forma apenas a ‘casa’ do corpo ou do ser; mas jamais a sua fôrma.
Formas precisam estar a serviço da vida e não existir como limitadoras dela. Quando a forma vira fôrma, então, a vida começa a morrer de sufocação; posto que todo Corpo Vivo precisa mudar pela própria condição de ser e estar vivo. Toda vida cresce e se transforma. E o que vale para os corpos naturais, serve também como ilustração válida para o Corpo de Cristo, que é a igreja.
A forma serve a vida, não a vida a forma; assim como o Templo serve o altar, e não o altar ao Templo; e assim como Sábado é para o homem, e não o homem para o Sábado.
Ora, digo isto porque sei que é impossível na Terra haver algo sem forma, por mais livre que seja. Todavia, também sei que se tal forma é invólucro da vida, então, ela apenas tem que servir a vida; ao invés de lhe servir de impedimento à sua própria adaptação aos tempos e às circunstancias.
Toda forma que existe para dar corpo visível a algo vivo, precisa ser feita de pele institucional; posto que a pele é a cobertura viva de toda forma. Assim, uma instituição que pretende apenas dar forma a vida que experimenta como tal, tem que construir para si uma forma que seja resistente, crescente, mutável, e leve como uma pele.
Aliás, Jesus foi supercondescendente quando comparou a forma a uma pele de ovelha ou cabra (odres), e ao pano (vestes). Mesmo assim, pode ser que o odre e o vinho fiquem tão condicionados um ao outro, que o vinho e a pele (odres) acabem por se tornar uma coisa só; e, assim, perdem o valor. Para Jesus era importante que odres e vinhos se ajudassem, mas não se tornassem a mesma coisa. No entanto, Ele reconhece que cada novo tempo precisa de sua própria forma; assim como o vinho novo precisa de odres feitos de pele nova e não usada.
O problema, portanto, não é a forma, mas a fôrma. A questão é que no meio cristão o Evangelho virou religião; e religião é o culto à fôrma como forma; e vice versa. Assim, o que era para ser vivo e mutante (posto que é vida; e vida é crescente e mutante), acabou por se tornar uma edificação de pedras e tijolos doutrinários, dogmáticos, sistemáticos, esquemáticos (isso do ponto de vista do engessamento dos conteúdos; o vinho); e também uma construção de modos eclesiásticos; de ‘modelos’ de governo feitos “oráculos divinos”; de ‘métodos’ “mais inspirados que a Palavra”; e de gestão quantificável; visto que tudo o que passa a ser de natureza apenas visível — a forma e a fôrma — só pode ser entendido com base nas ciências contábeis e físicas.
O G12 é perverso porque ele é uma máquina de controle de gente, e de utilização de pessoas como soldadinhos de um exército de forma e fôrma piramidal; e que existe para fazer a “igreja” crescer em número de gente envolvida no sistema. Ora, o sistema é defendido como sendo facilitador do crescimento numérico da “igreja”; porém, é uma máquina de produzir neuróticos em série; gente que vai perdendo a individualidade; e que só serve enquanto aceitar fazer parte do esforço insaciável que tal processo implica. Além de tudo, o modo, a forma gedoziana, existe a partir do pressuposto de que todos são líderes a serviço de um Líder ou Apóstolo, fazendo com que se inicie um processo de ‘clonagem’ humana, o qual, depois de uns dois ou três anos, passa a ser insuportável para a alma. Então entram em campo os times das maldições, das ameaças, das acusações de rebeldia — isso tão logo o sujeito diga que está cansado ou que não quer mais…
Os que ainda não cansaram (eles preferem jovens, que demoram a entender e cansar), animam-se muito mais pelas amizades jovens do que pela coisa em si. Porém, há aqueles, como você, que cansaram, mas que não largam porque amam a muita gente boa que ainda serve nesse exército com mentalidade de seita, servindo aos propósitos de algum fanático, narcisista e megalomaníaco.
Quanto à suas perguntas, vamos lá:
1o. Sim, eles apelam para o método porque não têm Palavra. O Evangelho não precisa da Amway para crescer. E o G12 é uma Amway de “igreja”; uma espécie de Herbalife eclesiástica; um exército de obcecados e fanáticos.
2o. O povo quer o Evangelho. Nunca foi tão fácil pregar o Evangelho na Terra. A Palavra pura e simples atrai a todos. O que atrapalha o Evangelho é a referência que a “igreja” oferece acerca dele; quando se chama a si mesma de Evangelho.
3o. Prova do que eu disse é que até a sua cabeça ainda está confusa a esse respeito; e me baseio na sua seguinte afirmação: “Hoje está muito complicado falar do Evangelho. Faz muito tempo que não convido ninguém para visitar a igreja.” Ora, em sua cabeça o Evangelho depende da “igreja”; e mais: o lugar para onde se tem que levar alguém para ouvir o evangelho, segundo seu sentir, ainda é a igreja. No entanto, meu amigo, o lugar de pregar a Palavra, sobretudo, é na vida, nas esquinas, nas ruas, no trabalho, no caminho… Para o ajuntamento da fé nós deveríamos levar aqueles que já receberam o evangelho com a gente, como amigos. No entanto, a perversão é tão grande, que todo esforço da igreja quanto a se tornar um lugar de atração é tão grande, ao mesmo tempo em que é tão divorciado do Evangelho em si, que, por essa razão, eles precisam das coisas que você mencionou; ou seja: “Aonde vamos chegar com tanta coisa? Será que precisa de tudo isso para atrair as pessoas? Será que as pessoas não ficam mais atraídas pela palavra simples que fala de Jesus? Temos que ter os shows, as danças, as bandas, as luzes, as fumaças?”
Minha pergunta é simples: Qual era a banda que acompanhava Jesus? Qual era o show? Quem eram os cantores? E luzes? Que luzes? E mais: a única vez que os evangelhos dizem que eles cantaram um hino foi a caminho do Getsêmani. Quanto à fumaça, a única que apareceu, foi feita por Deus, e era uma nuvem, na Transfiguração.
O que quero dizer é que nada disso tem qualquer valor; no entanto, ganha todo valor quando não há Palavra, poder, graça em operação, milagre, unção, constrangimento do Espírito, e libertação simples, operada pela compreensão e pelo entendimento do Evangelho que se faz acompanhar pela fé.
Além disso, com muita propriedade você colocou o seguinte:
“Tenho lido suas respostas sobre o dízimo. Gostaria que você me explicasse a atitude de Abraão ao dar o dízimo a Melquizedeque. Este fato é antes da lei. Como fica este dízimo segundo a ordem de Melquizedeque? Jacó também deu o dízimo. O dízimo está presente em outras religiões. Como você explica a palavra de Jesus aos fariseus, dizendo: “…mas ai de vós, fariseus, que dizimais a hortelã, e a arruda, e toda a hortaliça, e desprezais o juízo e o amor de Deus. Importava fazer estas coisas, e não deixar as outras.”
Ora, o dizimo é parte de todo culto racional e grato. Sua base, todavia, não é a Lei, mas sim a Lei da Graça, da gratidão, da alegria, do reconhecimento do amor e da providência, do desejo de contribuir para ajudar outros, e, sobretudo, como manifestação de culto a Deus, no qual a alegria grata oferece como culto aquilo que é um “deus” na terra: o dinheiro!
Para mim, dar o dízimo, além de ser tudo o que há pouco lhe disse, é também um ato de vindicação da soberania de Deus sobre nossa existência. O dinheiro é uma Potestade espiritual. Foi a única realidade que Jesus usou para apresentar como um “deus” competindo pelo amor dos homens. Por isso Jesus chamou o dinheiro (Mamon) de “senhor”; e disse que ninguém poderia servir a Deus e as riquezas. Desse modo, quando alguém dá pelo menos 10% do que ganha, tal pessoa está confessando sua gratidão, sua confiança na Provisão, e, também, sua libertação em relação ao poder que os bens tendem a exercer sobre toda alma humana, reclamando um papel divino e de obediência e serviço, como faz todo senhor espiritual.
O interessante é que Jesus não atribuiu esse poder ao diabo, mas o atribuiu ao dinheiro. Na Ordem de Melquisedeque, o dizimo é assim: filho da Lei da Graça, pois, é fruto da gratidão alegre; e não é uma obrigação legal. Todavia, mesmo não sendo uma obrigação legal, é, entretanto, um princípio espiritual, o qual carrega em si as bênçãos que correspondem ao significado de um ser um humano ofertar suas posses a Deus, através de bens e serviços aos homens; e fazendo isto com alegria, conforme a Lei da Graça acerca desse assunto, a qual pode ser lida em II Coríntios 8-9.
Receba meu carinho e minha lamentação por não poder indicar a você, hoje, nenhuma igreja em sua cidade na qual eu saiba que você estará ouvindo apenas e tão somente o Evangelho de Jesus.
Vamos continuar nos correspondendo. Quem sabe acontece algo por aí?
Nele, em Quem tudo tem que ser fruto do amor, pois, Nele, tudo é vida,
Caio