SOU A MULHER QUE FICOU GRAVIDA DO PASTOR
—–Original Message—–
From: SOU A MULHER QUE FICOU GRAVIDA DO PASTOR
Sent: quinta-feira, 23 de outubro de 2003 08:00
To: [email protected]
Subject: GRAVIDES E GRAVIDADE
Mensagem:
Rev. Caio Fábio,
O homem que eu amo contou-me hoje, no que creio ter sido nossa última conversa, que o procurou. Fiquei feliz. Eu sou a pessoa a quem ele se referiu.
Não vou incomodá-lo com minhas inquietudes, mas gostaria de dizer-lhe o quanto lhe sou grata neste momento, sem mesmo conhecê-lo.
O senhor deve imaginar o turbilhão no qual estamos vivendo. Para mim tudo mudou em 24 horas. Ele e eu, na verdade, acreditamos que ficaríamos juntos. Isso porque ele deduziu que a esposa o tiraria de casa; e isso não aconteceu.
Ao contrário, ela pediu que ele ficasse.
Diante disso, ele fez a opção que tem feito nos últimos anos – ficar onde está, onde esteve esse tempo todo.
Em muitos momentos concordo com ele, e também me pergunto se sabemos o que é o amor.
Ontem ouvi de um amigo que agora, sendo mãe, eu vou conhecer o amor verdadeiro e incondicional.
Ainda assim, eu acredito no nosso amor.
Sempre acreditei e creio que este filho é fruto de um amor verdadeiro e intenso, onde o mal não existiu, por nenhum instante.
De qualquer forma, independente do amor, há um sentimento que é maior – o do medo.
Ele tem muito medo de que sua vida mude – tudo que construiu, todos os valores nos quais acredita, toda a segurança de uma história de anos, as opiniões dos amigos, muitas coisas.
Tem medo de começar de novo com alguém que conhece há apenas há meses, medo de não dar certo, medo de abrir mão dos amigos e da comunidade eclesiástica na qual vive, da casa, da esposa; por conta de algo que, por mais forte que seja, é uma incógnita, porque pouco nos conhecemos.
Talvez tenha razão.
Eu sou uma pessoa comum. Não sou líder de nada e ainda estou buscando a minha igreja, e espero um dia encontrar…
Não tenho os valores que ele tem, nem a estrutura espiritual.
Estou muito aquém dele, e talvez do que ele espera encontrar em uma companheira.
Tenho fraquezas, defeitos, problemas.
Não sou uma pessoa que, para o meio em que ele vive, seja considerada adequada.
Mas eu o amei de verdade. E amo. Como nunca amei homem nenhum. E não quero me convencer de que este filho é nada diferente que o fruto deste amor, pois seria horrível acreditar que ele foi um erro, que foi ele que destruiu a carreira, o casamento e a reputação de um homem bom e sério.
Acho triste que as coisas sejam vistas assim.
Estou muito triste. Tudo para mim aconteceu muito rapidamente.
Eu entendo. Sei o turbilhão no qual ele está inserido, porque é neste mesmo turbilhão que eu estou. Apenas fiquei perdida – tudo muito rápido, com muita pressa. Está difícil para todos nós.
Nunca quis o mal da mulher dele ou da família dele. Nunca julguei os nossos atos, pois sempre vi neles a busca de nós dois por uma felicidade que, até então, não tínhamos visto em nossas vidas.
Por várias vezes tentamos nos afastar e não conseguimos. Não o culpo por buscar afeto e carinho que não vinha tendo. Não estamos nesta vida para sermos felizes?
Bem, mas não é para me lamentar nem tomar seu tempo que estou aqui. Estou aqui para agradecer-lhe pelo fato de o senhor o estar ajudando. Ele tem sido a minha maior preocupação. Não tenho conseguido dormir há várias noites pensando no sofrimento dele. Está fragilizado, em estado de abandono. Está confuso, machucado, chora sem parar. E eu não sei como ajudá-lo neste momento. Fico pensando nessa idéia dele de abandonar tudo—as coisas que ele ama e pelas quais se dedicou durante décadas, e que carregam todos os valores nos quais ele crê.
Tenho estado muito angustiada por tudo isso e por como tudo isso está se refletindo em uma pessoa tão especial. Ele me disse que vai parar porque é uma pessoa pública e que influencia outras. E acha que, agora, negativamente.
Eu não penso que o amor, independente dos árduos caminhos que por vezes nos faz percorrer, seja uma influência negativa. Temo por ele. Temo pelo futuro dele. Temo que o medo e a vergonha sejam maiores que o amor e a autoconfiança—sentimentos dos quais ele, aliás, já abriu mão muitas vezes. Temo não dar conta de tudo isso sozinha. Por isso venho lhe agradecer.
Enxergo como um privilégio que ele possa tê-lo ao lado dele neste momento, como amigo, uma pessoa como o senhor. Agradeço-lhe do fundo do meu coração por seu apoio, carinho e amizade. Tenho certeza que suas palavras e sua presença servirão de alento ao coração dele.
Tenho certeza que isto para o senhor também é um gesto querido, e peço a Deus que o ilumine.
Desculpe-me por perturbá-lo com essa história. Talvez não devesse ter-me desabafado, mas apenas lhe dito muito obrigada…
Mas o coração às vezes quer falar…
Obrigada por me ouvir.
Que Deus o abençoe.
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Minha querida: Paz sobre você!
Fique firme e estável como você está, apesar dos turbilhões.
Não force nada.
A gente nunca ganha quando força.
Deixe que ele faça o caminho dele.
É solitário mesmo.
Nem todos estão aptos a certas decisões na vida.
Temo que o fato dele ter contado para a esposa dele vá gerar duas coisas:
1. Deixá-lo refém dessa história para sempre, ou por muito tempo. Assim, fosse qual fosse a decisão ou a “de-cisão”, melhor seria se ela tivesse sido poupada. Dói muito, ajuda pouco, e conturba totalmente.
2. Deixá-lo refém de “alguns amigos” que não sabem o que “é padecer”. Portanto, são “amigos com condições pré-estabelecidas”. Amizades de verdade só acontecem “abaixo-da-linha-da-moral”. Ou seja: quando o amigo, mesmo não concordando com algumas decisões, não abre nunca mão do amigo por não concordar com algo que diz respeito apenas à vida dele. E, no meio cristão, tais amizades são muito raras.
O que eu disse a ele, digo a você também.
Aqui segue a carta dele para mim e a minha resposta para ele:
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Mensagem:
Caro Pastor Caio:
Escrevo para compartilhar o momento mais difícil de minha vida.
Casei-me aos 29. Nestes 20 anos juntos vivemos tempos turbulentos, com altos e baixos, frutos de nossos traumas individuais, ora potencializando nossas dificuldades, ora minimizando nossas diferenças.
A maior dificuldade do meu lado foi na área afetiva, que desembocava na questão sexual. Sentia-me desvalorizado, desinteressante.
Além disso, fui desenvolvendo um mecanismo de compensações que me permitiam deixar-me ser controlado e, às vezes, até manipulado; ao mesmo tempo em que continuava a vida, tocando projetos, elaborando planos, viabilizando realizações.
Fui um tolo ao me calar!
Há alguns meses conheci uma jovem e iniciamos um relacionamento.
Com o passar do tempo fui tentando sair dele, justificando-me sob a idéia de que ele não fazia sentido, que toda uma vida em comum me aguardava, um nome, uma reputação. Conversamos sobre isso várias vezes, chegamos até a estipular um prazo para que essa nossa história tivesse um fim…não deu tempo: há uma semana soube que vou ser pai de um filho com a moça.
Não tenho filhos.
Agora me encontro diante de uma enorme encruzilhada, além é claro, de todas as possibilidades de passar pela humilhação de ser rotulado de adúltero e de haver gerado uma outra vida fora do casamento, e de não saber qual é o caminho: se o da volta, da tentativa de um resgate; ou se de um novo recomeço, longe do mundo em que me encontro há tanto tempo.
Agradeço o espaço pra compartilhar algo tão sério.
Peço suas orações e compreensão.
Um forte abraço
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Resposta:
Querido amigo: meu abraço e aconchego!
Acho muito difícil a borboleta voltar a ser lagarta. Ela já voou…não dá mais para voltar ao casulo; só se for amor…mas pelo que você contou isso não pintou antes.
No seu caso, a questão não é nem essa: a lagarta ficou tempo demais no casulo, entrou em sofrimento contínuo, e voou em desespero…
A questão é só uma, não duas: você ama essa moça com que você está agora?
Se a ama de verdade, vale a pena.
Se não ama, assuma o filho, seja um bom pai e prepare-se para o “tranco”.
A essa altura o tranco virá. Ninguém tem um filho no anonimato, especialmente no meio evangélico.
Mas ainda é melhor assumir o filho e não se casar, do que casar apenas porque agora você terá um filho.
Seria concertar um erro com dois, talvez três.
Quanto à sua esposa, pode ser uma alternativa tentar. Mas confesso que não creio que dê certo. Quem já teve décadas para amar e não amou, pode no máximo assumir uma relação eunuca e resignada com a companheira de jugo: a esposa sofrida e infeliz!
Não fique abrindo o coração com ninguém.
Jesus já foi a Cruz por você.
Não deixe que eles o usem como “exemplo”.
É pura mentira.
Acontece a qualquer um.
Você não é um desnaturado, é apenas mais um pastor que casou no clube dos sapatinhos de japonesa e que agora está experimentando a vida como realidade.
Se for preciso, venha para cá. Hoje sou pobre, mas o coração é grande. E nessa minha fraqueza, tenho protegido a mais gente que você imagina.
De fato creio que estou reunindo uns homens na Gruta de Adulão. E eles serão um “exercito de habilidosos guerreiros”.
E nunca esqueça: espere tudo de sua esposa. Até as melhores, nessa hora, assumem a lagarta e ferroam com picadas de fogo.
Se possível seja discreto. Não ponha essa questão para a sua esposa. Ela, no estado atual, pode fazer a sua vida ficar miserável.
No início elas ficam “compreensivas”. Mas depois inventam um diabo e o colam em você, e, muitas vezes, pela culpa neuróttica, a gente veste o papel, se desvaloriza, e deixa brotar o que há de pior em nós.
A culpa só tem o poder de trazer para fora o pior de nós!
É sempre assim: quando a gente está mal a tendência é a gente tirar o pior de nós. Sei disso por experiência própria.
E conte comigo para tudo. Não me ofereço para ajudar a sua esposa, pois, dadas as circunstâncias, seria impossível.
O melhor que você pode fazer—não havendo a chance da genuína reconciliação conjugal; não falo de uma reconciliação “fraterna” apenas—, é Divorciar-se logo; e, assim, diminuir os riscos de pedradas dos legalistas de João 8.
Nos conhecemos há tanto tempo não é por acaso.
E tem mais: acho que Deus me permitiu passar por tudo a fim de poder ajudar a amigos como você e a milhares de outros.
Esse mesmo sofrimento e dor se cumprem em uma grande irmandade espalhada pela terra.
E como eu já fiquei “casca grossa”—com testa de pederneira, como Ezequiel—, não temo a “casa rebelde”. E eles sabem disso. Daí não me encherem mais a paciência.
Por isso, não dê corda.
À semelhança do diabo eles “adoram uma culpa”. Babam. Sentem um mórbido prazer no papo e na disciplina.
Você já está disciplinado em seu próprio coração.
Tudo o de que você não precisa agora é de mais acusação, e nem de dar um milhão de “explicações”.
Eles têm mais é que ser muito compreensivos e misericordiosos.
De mim isto não procede como ameaça, mas apenas como declaração de consciência, e de quem sabe o que “rola” em toda parte.
Calma, muita calma.
Vá bem devagar porque você está com pressa.
E não entre na neurose culposa.
Agora chegou a hora de você conhecer a Cruz como bem para você.
Receba meu amor e solidariedade na certeza de que a gente cai apenas se está andando.
Conheço você. Isto foi um acidente provocado pelo equivoco do casamento. O que está acontecendo é o efeito. A causa foi o casamento infeliz. Sempre explode, de um jeito ou de outro.
Um beijo.
Caio
Perdão pelos erros. Vim beber água às 4 da matina, vi seu e-mail, e não deu pra esperar até amanhã. Me ligue. Enviei o número no “privado”.
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Agora, continuando com você—uma vez que você já sabe exatamente o que eu disse a ele levando em consideração as informações recebidas—, tenho a dizer mais o seguinte:
Amor verdadeiro é algo que não acontece quando a gente manda, não sai quando a gente ordena e não escolhe as melhores circunstancias para se apresentar; pode gerar muita dor, e ninguém tem o poder de convencê-lo de nada.
A gente pode até se separar, tentar viver outra vida, seguir adiante. Mas ele segue com a gente.
Portanto, a recomendação bíblica em Cantares de Salomão é para que não “se acorde o amor” até que este o queira. Pois, quando ele aparece, ele também já vem preparado para viver com as circunstâncias.
Se eu fosse você apenas Confiaria no Amor de Deus.
É como dar um salto no escuro, no vácuo.
É desistir de controlar qualquer coisa.
É abdicar da posição de “Deus” para nós mesmos.
É dizer em total impotência: No Monte do Senhor se proverá—como disse Abraão quando caminhava para Moriá a fim de imolar a quem mais amava.
Então, Deus faz como aprouver a Ele!
Nós apenas caminhamos em silêncio.
As vozes de muitos se farão ouvir.
Não ouça a voz de ninguém, só a de Deus e de sua consciência.
Fique bem quietinha.
Haverá todas as vozes.
Há as que dizem: Não desista!
Há as que dizem: Esqueça isso!
Há as que dizem: Cure esse amor com um outro!—geralmente são pessoas que nunca amaram.
Há as que dizem: Não sei como você ainda respeita esse cara!
Há muitas vozes…
Você, no entanto, já está grávida. Basta-lhe a gravidez da barriga. Não fique prenha pelo ouvido. Fará mal a você e ao bebê.
Também essa é a sua hora de conhecer a Deus para você mesma.
Somente no chão da mais total impotência a gente tem ocasião de pisar firme no chão da Graça de Deus.
O Espírito que sopra onde quer e haverá de levar a sua vida em Suas boas asas de Graça.
Confie na Vontade de Deus!
Não na sua!
Nele,
Caio
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Agora vem a última troca de correspondencia com ele, duas semanas depois.
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—–Original Message—–
From: ESTOU NA SOBREVIVÊNCIA
Sent: quinta-feira, 30 de outubro de 2003
To: [email protected]
Subject: NO LIMBO
Mensagem:
Querido Caio,
Escrevo para dar-lhe um “update” da situação desde a última vez em que nos correspondemos.
Compartilhei o ocorrido aos meus familiares e alguns amigos bem próximos.
Apesar do choque, tenho encontrado ombros amigos e abraços acolhedores.
A questão que persiste no momento ainda é o próximo passo.
Minha esposa, num primeiro momento acenou com perdão, pedindo que eu ficasse e que juntos reconstruíssemos nossa vida.
Pedi à “outra” um tempo, antes de tratarmos das questões de nossa criança, para me refazer desse “tranco” inicial (estou certo de que é bem inicial mesmo, uma vez que a história ainda não “vazou”, o que é uma questão de tempo); deixei claro a ela de que não ficaremos juntos por causa de nosso filho apenas, e que quero tentar refazer minha vida ao lado de minha esposa.
Ocorre, como você mesmo destacou, que o clima não será fácil em casa, por razões óbvias.
Sinceramente, não sei se terei forças pra lutar.
Ao mesmo tempo, creio que se realmente não amasse minha esposa, teria forças pra ir…quando olho pra ela tenho desejo de ficar, de fazer uma história diferente…
Já deu pra perceber a complexidade da situação, imagino.
Preciso de ajuda para ter coragem de ser.
Preciso de alento pra seguir viagem, não importa a direção.
Agradeço seu ouvido amoroso, suas palavras cheias de afeto.
E conto com a solidariedade, ainda que à distância.
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Resposta:
Meu querido amigo: um beijo pra você!
Certamente você saberá se deve ficar em casa já nos próximos meses.
Ninguém terá que instruí-lo nisto.
Se estiver sendo mais que sobrevivente, não tenho dúvida, você ficará; e poderá haver uma chance.
Todas as chances verdadeiras precisam ser buscadas.
A família é um bem inigualável, e um divórcio só deve ser uma “medicina” se o único caminho for a “amputação”; ou seja: para salvar a própria alma.
À semelhança de uma “amputação”, mesmo quando se trata de um caso de vida ou morte—, o amputado ainda fica sentindo a “presença” do membro amputado algum tempo.
Nada é fácil pra gente boa como todos vocês são! E graças a Deus por isto!
Seria muito estranho se fosse fácil—seja ficar, seja sair.
Quando a alma está nesse “limbo” onde você está agora, não há lógicas que ajudem.
O que você tem que fazer é Confiar.
Não trate essa questão de costas para Deus.
Trate-a de frente. Olhando nos olhos do seu Deus.
Nada poderá separar você, sua esposa ou a mãe de seu filho do amor de Deus que está em Cristo Jesus.
Essa é a ironia: os divorciados, quando estão em Cristo, não se divorciam de Cristo por terem se divorciado um do outro.
Não entender isto será mergulhar na neurose culposa, seja qual for o resultado—seja para ficar, seja para sair.
Nos próximos meses tanto você quanto sua esposa saberão se querem, se suportam, se agüentam o tranco ou não.
Além disso, se não se toma cuidado, nessa hora as pessoas mostram o que não sabíamos; ou criam personagens para elas mesmas e para nós também. Então, pode virar um desgraça.
O que você jamais poderá fazer é decidir ir por nenhuma razão neurótica, e nem ficar por nenhuma neurose culposa também.
Ir ou ficar assim, é o mesmo que ir sem sair, e sair sem ir a lugar nenhum.
O cara fica preso numa bolha, e passa a rodar em círculos, e a vida perde o rumo.
Você sabe que conta comigo.
Receba meu beijo e minhas orações por todos os implicados.
Oro para que Ele, que é Deus de todos vocês, realize o Bem que todos vocês carecem Hoje.
Nele,
Caio