Um Sonho Sobre Minha

Em Janeiro de 1999 eu já estava separado conjugalmente da mãe de meus filhos há 10 meses.
O mundo político também já havia desabado sobre mim—todo desabamento posterior foi aftershock.
Naquela ocasião ouvi o seguinte sonho a meu respeito e que me foi contado por alguém que à época estava passionalmente magoada comigo. Por isto, o sonho ganhou ainda mais significado para mim.
Ela contou:
“Era uma praça européia, com cara de coisa antiga.
Eu e duas amigas nossas estávamos lá.
Havia uma feira e muitas frutas.
De súbito um alarido.
A multidão correu.
Uma grade alta impedia a passagem do povo para o pátio.
Ao fundo um paredão de fuzilamento.
Então entra você.
Cinco de você.
Você como eu te conheci aos 18 anos.
Você aos 30 anos, alto, imenso, um gigante, só que nesse teu rosto havia um espelho, quem olhava para você enxergava a si mesmo.
Você era o rosto de todos e todos viam seus rostos em você. Depois veio você como você hoje—janeiro de 1999.
E depois de você com cara de hoje, veio você mais baixo, mais magro e muito mais sólido—apesar de sofrido.
Por último veio você-seu-pai. Você velho, manso, sábio e pacificado.
Vocês cinco foram levados para serem fuzilados.
A praça se revoltava contra o ato.
Eles apontaram para atirar.
Mas você-de-hoje levantou a mão ao céu, exaltou o nome de Deus em palavras que ninguém entendeu, e trouxe a mão ao peito em solenidade.
O que você não viu é que seu braço direito havia se tornado em espada e que atravessou seu coração.
Uma criança ao meu lado chorava o choro de muitas gerações. E perguntava: Quem vai nos falar de esperança agora?
Foi quando eu vi que você-hoje morreu para que você antes e você depois pudessem viver.
Você vai ficar um velho sábio e pacificado”—ela concluiu.
Psicológica, histórica e existencialmente esse sonho tem sido profético para mim.
E, à época, vindo de quem veio, pareceu-me tomado de total soberania.
Seja como for, quero ficar velho e sábio.

Caio Fábio