UMA CONFISSÃO

Um dos maiores exercícios ao qual eu me imponho agora é não me deixar desumanizar pela visão errada de como as pessoas passam a me “ver” ante minha reação às coisas. Ainda não faz um mês que sepultei um de meus amados filhos, o Luk, e há pessoas que pensam que doeu menos apenas porque não nos desesperamos. De fato não há desespero; apenas saudade e celebração na esperança do glória de Deus; glória que a todos nós já está assegurada em Cristo. Isto é fato, mas não torna aquele que crê um ser imune a dor. Estou dizendo isto porque há pouco recebi um telefonema, em casa, às 23 horas, de um moço que perguntou se estava “incomodando”. Eu disse, honestamente, considerando que àquela hora não esperava que fosse ninguém mais além de meus filhos, que estava “incomodando só um pouquinho”. “Mas em que é que eu posso ajudar você? Aliás, quem é você?”—indaguei. O moço me falou o nome e acrescentou: “Acabei de perder uma namorada. O que eu faço?” “Acabei de perder um filho. O que eu faço?”—devolvi como quem se sentia desrespeitado por uma questão tão menor ter o poder de entrar em minha casa, num feriado, e às onze da noite. “É eu sei…”—disse o moço. Então, meu coração se encheu de ternura por ele. Perguntei a idade dele. “Vinte e quatro”, disse ele. “O que você faz? Não sei. Você vai ter que descobrir. Uma coisa eu sei; essa é uma boa hora pra crescer. É o que estou tentando fazer: crescer. Por que você não aproveita essa perda e se pergunta a respeito do que vale e não vale? Sobretudo, aprenda nessa perda o significado de valor, propriedade no relacionamento, e aprenda a se posicionar. Cresça para encontrar sentido de propriedade. Entendeu?” Depois eu disse que talvez aquela fosse a palavra que eu tivesse para dizer a ele. Talvez ele tivesse me ligado para falar da namorada, mas, sem saber, eu estivesse dizendo a ele o “por quê” do namoro ter acabado; ou seja: pela falta de propriedade. Comecei irritado e terminei in-ternurado. Afinal, eu também cresci com o telefonema dele, e aprendi mais uma vez que a dor acontece em total subjetividade; e que cada um imagina que a sua é a pior do mundo. Caio