UMA RÁPIDA VIAGEM DA MINHA CONSCIÊNCIA
Escrito em 13/07/04
Hoje a tarde, depois de passar uma água no rosto, olhei no espelho, e me perguntei: O que existe em mim, lá no fundo, na pedra angular de meu ser?
Uma voz gritou em mim: A Lei!
Então fiquei pensando… E aviso: esta não é nada além de uma viagem minha, e completamente psicológica. Ou seja: estou falando do desenvolvimento de minha consciência, conforme a percebo. Apenas isto.
Sim, fiquei pensando… É verdade! Olho no mais fundo de mim e encontro a Lei. Lá está ela, plantada em mim como consciência. Sólida. Impávida. Toda cheia de Sinai. Lá está ela, vestida de Árvore do Conhecimento do Bem e do Mal.
Afinal, assim como é Deus a Única Consciência que gera a Lei; é também a Lei que gera todo o processo da formação das demais consciências…
“De todas as árvores” se pode comer, menos de uma…foi o que ficou Estabelecido. E é essa uma Árvore— qualquer uma, pois, qualquer uma seria “a” Uma, se fosse Indicada—, aquela que faz o saber acontecer como consciência finita, visto que o saber (no finito) nasce do proibido.
O Saber só não é conhecido como proibido pelo Único que sabe, pois, É em Si-Mesmo…não havendo a Ele nenhuma “consciência” a acrescentar. Mas em todos os demais, a consciência-de-si, conforme a Imagem de Deus, não se estabelece sem a finitude; e a finitude da consciência é a Lei.
A Lei condiz com nossa condição finita. A Lei é pertinente ao finito.
É, porém, o encontro com esse limite, em mim, justamente aquilo que me abre as portas para o espírito, e para a infinitude, e que primeiro se instala em mim como culpa de uma falta que não sei do que é. Pelo menos foi assim que tal consciência começou a me acometer desde o tempo em que eu quase-morava no Jardim do Éden, na infância.
Ora, esse encontro com meu limite, que é a Lei, é justamente aquilo que deflagra em mim a sede do infinito como tal… Ou seja: como consciência do que é puro Mistério…E, ao mesmo tempo, algo que desejo experimentar.
No entanto, a formação da consciência, entre os finitos, não acontece sem que se cruze a linha do limite. Antes de se transpor os “confins do limite” não há consciência, há inocência. Desse modo, em mim que sou finito, mas que também, paradoxalmente, carrego a eternidade no coração, tal conhecimento só acontece mediante a transgressão. Pois a primeira experiência do conhecimento, se instalou como conhecimento da transgressão para mim-mesmo. Isto porque o conhecimento no finito se dá no ambiente do limite da Lei, e toda viagem para além dela é transgressão. E esta é uma busca de Algo além de mim mesmo. Isto conforme o mesmo processo do Gênesis.
Transgredir, por isto, nos limites paradoxais da finitude que é habitada pelo infinito, é exercício de infinitude, ao mesmo tempo em que é morte. Desse modo, esse conhecimento é queda; e o é, justamente porque, paradoxalmente, é também salvação.
Ora, se esse conhecimento não fosse mergulho na finitude total, não haveria consciência da infinitude. Pois é mediante o conhecimento da morte—que experiência da finitude absoluta—, que se encontra a realidade da consciência da vida como consciência.
A consciência, no tempo e no espaço, é aquilo que é estabelecido por esse paradoxo; paradoxo no qual o infinito sofre as dores do finito, e o finito se lamenta de não ser nada. Essa síntese é a minha consciência.
Este é o paradoxo no qual a consciência faz hoje, para mim, a sua síntese: Eu só sei de mim em alguma “plenitude finita” quando conheço o meu ser como paradoxo: bem e mal!
A consciência, em mim, é a colisão de ambas as coisas, sendo que ambas foram instaladas pela Lei: “…pois no dia em que dela comeres, morrendo, morrerás”.
Assim, se pode dizer que o pecado é o reverso da salvação. Pois para os homens é possível pecar, sendo impossível não pecar. Porém, pecar, é impossível para Deus. Mas se é possível aos homens pecarem, e morrerem, sendo impossível não morrer depois de conhecerem o bem e o mal; todavia, do mesmo modo, é impossível para Deus não socorrer os impossíveis dos homens, e salvá-los. Posto que assim como o homem não sabe não saber sem pecar, assim também Deus não é Deus se não salvar. De tal modo que, paradoxalmente, queda e salvação só são experimentados por mim como paradoxo. Mas a segunda, a salvação, só se torna realidade para mim depois que eu admito a primeira, ou seja: a minha própria condição de caído.
É a morte que dá conhecimento da Vida! É a admissão da Queda o que dá conhecimento da Graça!
Ora, neste ponto da minha viagem, iniciada na espelho, tenho que admitir que minha consciência cresce na medida em que a Lei me provoca como impedimento. Todavia, mesmo assim—e paradoxalmente—, eu discirno a Lei como algo menor que a Vida. Isto porque a Lei só me fala de morte, embora seja divina. E é também por essa fala negativamente divina que sou cada vez mais atraído pela Vida. A morte nos remete para a vida, assim como a Lei me conduz ao conhecimento do pecado. Ora, desse mesmo modo, é também a Lei que me serve de “aio” até que eu encontre a superabundância da Graça.
Quando a minha consciência, carregada de Lei, chega à certeza da perdição, aí nasce a Vida. Afinal se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só; se, porém, morrer, produz muito fruto. Essa é a Lei da Vida.
Todavia, a consciência precisa florescer para a Liberdade, visto que sem Liberdade a consciência não se renova. No entanto, o Limite da Liberdade não é a Lei da Morte, pois se o fosse, não haveria Liberdade. A Lei do Amor, entretanto, é a Lei da Liberdade. E isto só acontece quando a consciência encontra a Justiça da Fé, momento no qual termina todo medo, e surge a adoração que vem do Amor.
Antes disso, a consciência é julgada pela Lei da Morte o tempo todo. E é por esta razão que também julga ao próximo todo o tempo. Esse é o inferno: a consciência se julgando com juízo na mesma Medida com a qual julga ao próximo. E quanto mais julga os outros, mas se julga, e mais aos outros julga. Os outros, por seu turno, julgam de volta, fazendo o mesmo ciclo, cada um com suas próprias pernas, e seus caminhos são o próprio inferno como consciência, e que é feito de culpa e juízo, ou choro e ranger de dentes. O inferno é uma construção do juízo, as suas medidas nós todos conhecemos quando julgamos o próximo. Portanto, todos temos conhecimento do inferno.
É, todavia, do encontro da Liberdade com a Justiça que vem da Graça, que a verdadeira Justiça começa a florescer em nós, como consciência. Visto que somente a consciência um dia culpada, e que foi expiada pela Graça do Perdão, é que pode discernir a Justiça como Amor. Por isto os anjos não podem ser portadores da Boa Nova com propriedade existencial.
Nesse dia inicia-se a Individuação…
Começa a surgir em nós uma consciência que não teme a Verdade, pois já se sabe justificada de antemão. Portanto, já não teme o Encontro, pois já está perdoada antes de saber de si, pela luz da Verdade. Então, uma vez que eu soube de mim de modo culpado, agora posso saber de mim sem medo, e saber mediante a fé que me justifica. Assim, toda a viagem da consciência é para ser apresentada à fé, à esperança e ao amor, visto que sem esses três, na Terra, não há um mínimo de consciência em nenhum humano. Mas ainda assim, aqui, se conhecerá sempre apenas “em parte”.
O que salva a consciência, em e para a Liberdade, é o fato de que ela só se alimenta da Verdade. E a Verdade só é conhecida no chão da Vida, lugar onde a Liberdade significa sabedoria e amor para com o próximo. Assim, aprende-se a obediência com as coisas que se sofre por uma questão de consciência, contra ou em favor, mas sempre conforme a consciência que se baliza pelo amor.
A consciência vai ficando psicológica e espiritualmente madura, quando ela ousa se insurgir contra o Super-Ego da Lei e começa a prevalecer. É a luta de Jacó com o Anjo. Aqui nossos nomes são mudados na experiência do existir.
E assim cresce a consciência… sem cessar. Até chegar a ser Paz-ciência e Amor. Mas isto está longe de ser o fim da viagem. Aliás, essa viagem não tem fim. Isto porque quando o finito for engolido pelo infinito, e o mortal for absorvido pela vida, então, virá o que é Perfeito, e nesse dia o conhecimento que se terá, será da mesma qualidade de conhecimento que Deus tem de nós, e de todas as coisas. E será dessa nossa nova síntese de finito-infinito, é que conheceremos como somos conhecidos, pois no amor tudo é.
É para lá que sei que estou caminhando Nele, carregando quem sou, e quem não sou; buscando ser, sendo; e buscando viver apenas vivendo. E faço isto entendendo que todas as coisas trabalham para o meu bem, pois apesar de amar a Deus ainda-quase-nada, sei que Ele me ama-Tudo. E essa é minha única justiça: crer que Ele me ama! E crer que Ele me amou antes que houvesse mundo!
Esta é minha Consciência. E está é a viagem dela até este dia. E esta viagem é Nele. Ele é o caminho de toda consciência. Ele é o Alfa e ômega de todas as coisas. E minha consciência faz parte disso, Nele. E como sou grato. Afinal, a consciência só é feliz na Gratidão, que é pura emulação da Graça.
Caio